As 70 famílias da Via Campesina que ocupam a fazenda da multinacional Syngenta Seeds, em Santa Tereza do Oeste, próximo a Cascavel, iniciaram ontem a desocupação do local. A saída é pacífica, lenta e está sendo feita em etapas, uma vez que os sem terra solicitaram à Justiça local prazo de oito dias para retirar todos os barracos da área, justificando haver transporte insuficiente para deslocar os pertences. Os camponeses informaram que estão transferindo o acampamento para o assentamento Olga Benário, que faz divisa com a fazenda.
A decisão de deixar o local foi tomada ontem pela manhã em reunião entre os integrantes da Via Campesina, acompanhada por policiais militares. O governo do Estado tinha até o final do dia de ontem para ordenar a reintegração de posse da área, conforme prazo determinado pelo juiz da 1.ª Vara Cível de Cascavel, Fabrício Priotto Mussi. Ao entregar a ordem de desocupação aos sem terra, o oficial de Justiça levou com ele a solicitação da Via Campesina de deixar a área paulatinamente e um novo pedido de permissão judicial para colher as culturas que vinham plantando na fazenda. Um primeiro recurso nesse sentido havia sido negado pelo juiz Fabrício Mussi na segunda-feira.
Há expectativa de que, dessa vez, o juiz ceda às solicitações dos sem terra, mas nenhuma decisão oficial foi anunciada ontem. Depois de uma tarde inteira em audiência, o magistrado deixou o fórum no final do dia sem atender os telefonemas da reportagem. Já a Via Campesina garante que, apesar de ter deixado a fazenda, não vai desistir da luta de reconquistá-la. ?Só que faremos isso legalmente?, disse um dos chefes do grupo, Celso Barbosa. Ele justificou a decisão afirmando ser necessário cumprir a decisão da Justiça. ?Há um mandado de reintegração e achamos melhor sair pacificamente?, completou.
O líder do movimento espera por novas decisões judiciais de recursos que tramitam no Tribunal de Justiça (TJ) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). E diz também não estar decepcionado pelo fato de o governador Roberto Requião não ter conseguido reverter a situação de forma a evitar a saída. ?O governo fez a parte dele recorrendo ao Supremo (Tribunal Federal, o STF) depois de cassado o decreto dele na Justiça do Paraná?, disse, referindo-se ao Decreto Expropiatório 7487/0, assinado por Requião em novembro do ano passado, determinando a desapropriação da área.
Enquanto isso, a desocupação se dá a passos de tartaruga. Até o final da tarde de ontem, não mais do que quatro barracos haviam sido removidos da área da fazenda para o assentamento próximo. A Syngenta não emitiu posicionamento oficial ontem sobre o assunto, mas há expectativa de que um comunicado seja divulgado hoje pela assessoria de imprensa da empresa.
Requião ainda não está livre da multa diária
Apesar de iniciada a retirada das famílias ontem, ainda não se sabe qual será o posicionamento da Justiça com relação à desocupação em etapas solicitada pela Via Campesina. Sem a apreciação do pedido na data-limite para desocupação, caso o juiz Fabrício Mussi decida não acatar o que os sem terra pedem, pode acabar valendo a partir de hoje a multa direcionada pessoalmente ao governador Roberto Requião de R$ 2 mil diários em caso de descumprimento da ordem de reintegração.
Isso porque, ontem, o recurso impetrado pelo governador no Tribunal de Justiça na segunda-feira ainda não havia sido julgado pelo desembargador Paulo Hapner. A reportagem de O Estado tentou mais uma vez contatar a advogada do governador, Ivana Cordeiro, sem sucesso. No entanto, segundo o líder da Via Campesina, Celso Barbosa, o agravo de instrumento tentado por Requião tem por objetivo derrubar a liminar que garante a reintegração de posse da fazenda experimental à Syngenta e, assim, livrá-lo da multa imposta pela Justiça.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp), entretanto, dá como certa a desocupação, afirmando que a retirada das famílias continua hoje e que a PM estará de olho no cumprimento da palavra dos sem terra.
Mas os advogados que representam a empresa no Paraná não aceitam o novo prazo: ?Para nós, não está havendo desocupação alguma. Fica claro que essa é mais uma estratégia maliciosa para fingir que estão saindo. Eles tiveram mais de um ano para deixar o local e agora pedem dias para remover um acampamento que pode ser retirado em questão de horas?, protesta a advogada Rogéria Dotti Dória. ?Esperamos que o juiz não aceite esse pedido?, desabafa.
Palmital
Ontem policiais do 16.º Batalhão da PM fizeram a reintegração de posse da fazenda Paineira, em Palmital, a cerca de 140 quilômetros de Guarapuava. Pelo menos 37 integrantes do Movimento Sem Terra, o MST, estavam acampados no local, invadido em janeiro deste ano. A reintegração foi pacífica e os sem terra foram levados para assentamos próximos.