Várzeas do Rio Iguaçu sob ameaça da ação do homem

De Balsa Nova até Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, as várzeas do Rio Iguaçu deveriam somar 83 quilômetros. No entanto, o que antes já foi um bioma de numerosas espécies de fauna e flora, extenso e robusto, hoje se esvai. Da extensão total, 48 quilômetros já foram completamente extintos e o restante, 35 quilômetros, no município de Araucária, está indo para o mesmo caminho. As organizações ambientais alertam: 25% desse remanescente já está comprometido; é preciso preservar o que ainda resiste. 

Os principais agentes que destroem as várzeas do Rio Iguaçu são duas atividades comuns na região: o pastoreio na mata ciliar e a exploração desenfreada da área, para extração de areia e argila. Esta última agride com ainda mais intensidade, como a reportagem de O Estado constatou ?in loco?.

Partindo de Araucária, o primeiro local de parada foi a região de Botiatuva, onde hoje uma grande empresa está em plena atividade de mineração. Do alto se pode ver a vegetação rala e as áreas de inundações (cavas). A segunda região parece uma das áreas onde a várzea (floresta úmida) ainda parece intacta. A diferença entre as duas áreas do trajeto é indiscutível.

Segundo José Paulo Loureiro, engenheiro agrônomo da Associação Atmosphera, o passivo se dá da seguinte maneira: eles fazem escavação, tiram a argila e depois a areia, destruindo a vegetação, e abandonam a área alagada. ?A atividade altera completamente o ecossistema. Muda de mata ciliar (várzea) para lacustre. O lençol freático, sem a mata, já não é mais reposto e, com isso, qualquer chuva alaga, ameaçando também a fauna?, afirma. Ele diz que, ao longo desses 35 quilômetros, atuam cerca de 13 areais, seis de grande porte. ?Eles detonaram Pinhais, São José, Fazenda Rio Grande e agora estão vindo para cá?, aponta Loureiro.

Adonis Ferreira Bobko, representante da organização não governamental Amar, também de Araucária, completa que a areia e a argila presentes nas regiões de várzea funcionam ainda como filtros naturais para a poluição do rio. Sem elas, a sujeira não é barrada. Entre as espécies presentes na mata ciliar que diminuíram bastante, Adonis cita veado, capivara, paca, cutia, socó-boi, biguás e, da flora, a espinheira-santa, o cambuí, a guajuvira e, em especial, os branquilhos.

Em outro ponto da região de Araucária, em Rio Abaixo, quase distrito de Guajuvira, do lado direito se pode ver como era a paisagem, toda fechada de branquilhos. Do lado esquerdo, os dois ambientalistas mostram como começa a mudar a paisagem, com a exploração. A situação mais drástica de destruição das várzeas do Iguaçu aparece em Rio Verde Abaixo, divisa com Balsa Nova. Onde era mata fechada, na última semana O Estado encontrou máquinas tirando a areia da área quase totalmente modificada.

MP denuncia precariedade na fiscalização

De acordo com o promotor Edson Luiz Peters, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Ambientais da Região Metropolitana de Curitiba, o volume de extração de areia continua crescente tanto no leito do Rio Iguaçu quanto nas várzeas. Segundo ele, é por isso que existe a ameaça de degradação. Ele diz que parte dessa extração é clandestina e outra é autorizada, ?mas nenhuma é controlada, como deveria?.

?O que fazemos é cobrar dos órgãos competentes, entre eles o IAP (Instituto Ambiental do Paraná), para que seja feita a fiscalização contínua?, afirma. Sem esse controle, as áreas são exploradas e abandonadas, ficando apenas as cavas: ?Uma herança de prejuízo para a sociedade e para o próprio Estado?, comenta Peters. Uma das maneiras apontadas por ele para conter essa exploração e preservar as várzeas é a criação de uma unidade de conservação.

Sobre os mineradores, o promotor diz que há dois anos houve embargo geral na área, mas muitas empresas fizeram, perante o Instituto Ambiental do Paraná, um termo de ajustamento de conduta (TAC). Na avaliação de Peters, muitas empresas não cumprem o TAC e o IAP não fiscaliza de maneira efetiva.

Em nota, o IAP informou que ?de 13 empreendimentos de extração de areia vistoriados, autuados e embargados, cerca de sete tiveram TAC firmado junto ao órgão, assinados de setembro de 2005 até dezembro do ano passado. Destes, três já atenderam todas as exigências de recuperação ambiental, passaram por vistorias, e estão com a licença de operação em mãos. Os demais ainda estão com os TACs em vigência (um ano para todos) e estão cumprindo o cronograma estabelecido (inclui relatórios trimestrais, com informações sobre o andamento da recuperação do passivo ambiental)?.

O órgão também garantiu que ?são feitas fiscalizações periódicas para avaliar o cumprimento dos relatórios e detectado qualquer descumprimento o escritório regional do IAP é acionado para autuação?. A Associação dos Mineradores de Areia e Saibro do Alto Iguaçu (Amas) foi procurada durante três dias para entrevista, mas não retornou.

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