Nos corredores estreitos apinham-se dezenas
de pessoas, à espera de atendimento.

Quem vai às varas de Família de Curitiba tem a sensação de estar chegando num albergue noturno ou em um centro de retirantes. Nos corredores estreitos de um casarão antigo apinha-se gente. Nos balcões dos cartórios amontoam-se pessoas. Os funcionários ficam sem rumo. Não sabem se o processo está no chão, na pilha do canto, em cima da cadeira, ou na sala ao lado. Tudo está tomado. Não há mais espaço para nada.

As dificuldades já começam na rua. Instalada na Avenida Paraná, sem número, a placa indicativa mal dá para ler. A diretora do Fórum, Joeci Machado Camargo, uma guerreira há 16 anos na magistratura, está quase abatida. Para a juíza, só resta a ajuda de Deus, porque todos os demais canais foram esgotados. “Estou cansada, desiludida. Preciso pensar também na minha carreira. Por duas vezes, cedi minha vez para o Tribunal de Alçada”, confessa entristecida. Lá circulam mais de 500 pessoas por dia. São oito juízes e oito promotores. Apenas dois banheiros. Mal funcionam. Há mau cheiro nos corredores sem ventilação. São mais de 20 mil processos tramitando e aumentando, porque “pela porta que não entra o dinheiro sai a felicidade”, adverte Joeci. Segundo ela, os conflitos de família aumentam em razão da crise social, do desemprego. Ela chega a realizar quarenta audiências numa sexta-feira. Para a segurança do local há apenas um guarda. Joeci diz que as varas de Família têm que sair do local com urgência, para que tudo não se torne um caos incontrolável, porque a estrutura está totalmente superada. Conta que estão acenando com o Alçadinha – imóvel ocupado pelo Tribunal de Alçada – para a mudança das Varas.

Entre um espaço e outro, entre ouvir uma pessoa e atender outra, desdobrando-se, fazendo quase o impossível, Joeci Machado Camargo falou:

Pergunta – Dra. Joeci, a senhora está satisfeita com a estrutura das Varas de Família?

Joeci – Não. É uma estrutura precária porque o prédio é pequeno e não consegue dar cobertura e atendimento ideais. As varas estão abarrotadas de processos. A equipe técnica interdisciplinar que trabalha na parte de baixo, onde está o banco, não tem espaço, está trabalhando em salas muito pequenas, onde as pessoas se amontoam, na realidade. Nós temos apenas dois banheiros, que é para todo o prédio e ainda para as pessoas que circulam por aqui. Então, nós não temos nenhuma estrutura para o atendimento. Na época em que o prédio foi alugado, a estrutura comportava muito bem o atendimento, hoje, não. Hoje estamos trabalhando com muita dificuldade.

Pergunta – Há sete anos, o espaço era suficiente, dava para atender condignamente?

Joeci – Sim. Veja bem, nós temos hoje quatro varas de Família. Nós temos quatro juízes que atendem a área de família e mais quatro juízes que atendem a área de alimentos. E ainda temos, para cada juiz, um promotor. Então nós temos oito promotores e oito juízes e não existe espaço físico para tudo isso. São quatro varas que estão apertadas. A parte de arquivo, que fica em baixo do prédio, não é um local adequado. E fora isso, hoje nós temos em média, em cada vara, tramitando mais de cinco mil processos. Então são mais de vinte mil processos. Tanto que apenas neste anos nós temos distribuídas 2.490 ações.

Pergunta – E a questão de funcionários?

Joeci – Os funcionários são dos cartórios, não têm vinculação com o Poder Judiciário.

Pergunta – Mas são suficientes?

Joeci – Nunca vão conseguir comportar o atendimento total de uma Vara de Família, mas a estrutura do cartório nós controlamos através do escrivão. Exigimos que o escrivão tome determinadas providências, mas não atuamos na parte interna do cartório. O juiz não atua na parte interna de funcionalismo.

Pergunta – Qual seria a solução?

Joeci – Com a saída do Tribunal de Alçada ali do antigo prédio da LBA, do lado da Escola da Magistratura, provavelmente irá ficar vago aquele prédio. Já existe um estudo para que a gente venha a ocupá-lo, porque foi alugado um prédio para o Tribunal de Alçada. E o atual deverá ser entregue até o final do ano. Acredito que se der para levantarmos o espaço físico daqui e se o espaço físico de lá for maior, aí sim nós poderemos nos mudar para lá.

Pergunta – Isso solucionaria o problema e traria mais conforto e agilidade para o atendimento?

Joeci – Sim. Porque nós precisamos de espaço. Agora, é preciso ver se o espaço do Alçadinha é bem maior do que o daqui. Eu não conheço. Pelo o que me parece tem o prédio e uma casa, que é um anexo. Se essa casa permanecer, acredito, sem conhecer, que o espaço possa atender as necessidades das varas de Família. Mas sem a casa me parece que aquele prédio é pequeno também.

Pergunta – Então, é trocar seis por meia dúzia?

Joeci – Na verdade nós precisamos sair daqui com urgência! A situação daqui é muito delicada. Os dois banheiros que existem mal funcionam. Vivem dando problema. Em dia de calor, isso daqui é insuportável!

Pergunta – Quantas pessoas circulam diariamente por aqui?

Joeci – Cerca de 500 pessoas.

Pergunta – Existe algum dispositivo de segurança no caso de alguma emergência?

Joeci – Não. Temos apenas um guarda, que fica lá fora e que cuida de todo o corredor.

Pergunta – Isso não preocupa a senhora?

Joeci – A gente acredita na sorte. Não tem como! Já pedimos mais um policial militar, mas não existe contingente para isso, então só fica um soldado.

Pergunta – O novo Código trata bem as questões de Família?

Joeci – O novo Código veio traduzir aquilo que nós já estávamos fazendo. O que a jurisprudência já havia encampado. Então, me parece que em algumas coisas ficou interessante, porque traduziu o direito da parte que era abrangido pela jurisprudência, e em outros deixou muito a desejar. O Código, no meu entender, não abrangeu toda a matéria.

Pergunta – Mas ele facilita a solução de algumas questões?

Joeci – Não. A decisão do conflito nunca vai acabar. Não adianta existir normas. Porque sempre vai ter uma coisa ou outra. As normas estão regulamentadas pelo novo Código de uma forma mais clara. Isto sim. Aquilo que não havia sido regulamentado, que estava sendo dominado pela jurisprudência ou pela doutrina, alguns comportamentos que ainda estavam inseridos na Constituição e não tinham regulamentação, aí sim.

Pergunta – A senhora acha que os conflitos entre homens e mulheres estão aumentado?

Joeci – Sim, principalmente por causa do desemprego. Hoje, a mulher galgou um espaço muito grande no emprego e diminuiu a possibilidade de trabalho do homem, pois o homem se acomodou e a mulher é mais dedicada.

Só que em virtude da recessão econômica que nós estamos vivendo, isso reflete diretamente nas varas de Família. Porque, quando o dinheiro não entra pela porta, a felicidade sai por ela. Com isso, o homem ou a mulher acabam saindo de casa, ou entram no vício da bebida e a desestrutura e desarmonia se instalam de vez.

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