Paciência. Essa é a palavra de ordem para quem necessita de atendimento em unidades de saúde localizadas na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Levantar de madrugada, chegar por volta das 5h em um dos postos e ainda não ter a garantia de ser atendido. E, se tiver a sorte de conseguir marcar uma consulta, ainda esperar horas e horas pelo médico. Sem falar no dia de trabalho perdido, que na maioria das vezes acontece. Depender da saúde pública nos municípios da RMC é um verdadeiro sofrimento.

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Em Almirante Tamandaré, por exemplo, a atenção básica à saúde está precária. Isso porque a única unidade 24 horas da cidade está fechada desde o ano passado e o Hospital Nossa Senhora da Conceição está atendendo parcialmente desde que três pessoas foram presas – em dezembro de 2008 – acusadas de desvio de verba do local.

Por conta disso, a Justiça suspendeu o repasse para a instituição. Corrupção à parte, quem sofre com tudo isso é a população mais pobre, que não tem dinheiro para pagar uma consulta particular ou um plano de saúde. Basta averiguar a situação na unidade de saúde do centro de Almirante.

Para conseguir consulta no local, sempre lotado – situação agravada com o fechamento da unidade 24 horas – é preciso chegar às 5h. “Isso aqui é uma bagunça. Não existe ordem de chegada. Minha filha está grávida e ficou três horas esperando”, reclamou Idenir Goulart. O carpinteiro Arnobel Soares teve um prego enfiado no pé e esperou sete horas para ser atendido. “O atendimento dos médicos é bom. Eles se esforçam. Mas esperar tanto tempo não dá”, afirmou.

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A situação é ainda mais complicada para mulheres grávidas ou que têm bebês pequenos. Embora em algumas unidades haja o aviso de que elas devem ter preferência, não é o que se vê nas filas. O mesmo ocorre com os idosos. Em São José dos Pinhais, na unidade de saúde do Jardim Ipê, Daiana Cristina Santos chegou às 5h para pegar a ficha, mas às 9h nem sabia quando faria a consulta para seu filho de cinco meses.

No Guatupê, Wilson Steben contou que esperou quase quatro meses para consultar com um cardiologista. “O atendimento é precário”, afirmou. Há casos que a pessoa nem consegue a ficha e tem que voltar no outro dia.

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Arnobel: “Esperar tanto não dá”.
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Em Colombo, uma das cidades que mais encaminham pacientes para hospitais de Curitiba, os problemas não são diferentes. Na unidade de saúde do Alto Maracanã, região bastante populosa da cidade, é visível a precariedade. Júlio César Oliveira contou que trouxe o colega para tratar um corte que fez no trabalho, mas teve que esperar mais de uma hora, mesmo com o corte aberto. “E ainda assim fizeram o básico e me mandaram para o Cajuru”, reclamou.

Em Campo Largo e Pinhais, também é só reclamação. E todas da mesma ordem: demora no atendimento. Os idosos Ignes e Abílio Kilo tiveram que esperar por pelo menos cinco horas para atendimento, apesar da idade. “A gente ainda pode andar, então esperamos. Mas e quem não pode?”, indagou Abílio. Em Pinhais, as pessoas também se indignam. “Já são 9h e estou desde as 5h esperando o médico”, reclamou Clarice Rezende.

Na busca de soluções

A coordenadora de Atenção Básica em Saúde em Colombo, Valquíria Plucheg, explicou que a baixa arrecadação, aliada ao crescimento acelerado da população tornam a situação difícil na cidade. Valquíria explicou ainda que mesmo com as dificuldades, ainda assim, Colombo contrata especialistas na medida do possível.

“A demanda é grande na atenç&,atilde;o básica, mas conseguimos contornar a situação. Estamos sempre correndo atrás para melhorar o atendimento. Mas há especialidades que as pessoas esperam mais, pois têm que entrar na Central de Marcação de Especialidades do governo do Estado”, analisou. Valquíria disse que a administração está realizando a distritalização das unidades, o que, na prática, deverá otimizar os serviços.

O secretário de Saúde de Almirante Tamandaré, Luciano Bugalski, informou que a prefeitura criou uma comissão para tratar o problema da unidade 24 horas e do hospital. Segundo ele, já está prevista uma licitação para a contratação de funcionários – uma vez que o Ministério Público questionou tanto a contratação quanto o repasse de verbas do local. Ele confirmou que houve aumento no movimento na unidade do Cachoeira, em virtude da falta do posto 24 horas. “Mas já reforçamos o atendimento”, afirmou.

Superlotação na capital

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Júlio César: “Fizeram o básico”.

A falta de estrutura na saúde básica dos municípios da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) acaba produzindo outro problema, mas dessa vez para a capital: hospitais e unidades 24 horas têm que atender muita gente da RMC, o que atrasa os procedimentos para quem é da cidade. No Hospital de Clínicas (HC) de Curitiba, por exemplo, cerca de 30% do total de 6,5 mil novas consultas eletivas – que não são de urgência e emergência – que são feitas por mês são de pacientes da RMC.

Para a gerente da Unidade de Ambulatórios do HC, Tereza Krause, há vários atendimentos que não teriam a necessidade de ir para um hospital de grande porte. “Creio que se os municípios da RMC tivessem uma melhor estrutura na saúde básica isso não aconteceria. Atendemos todos, mas é como se fosse um ônibus cheio: vai entrando cada vez mais gente sem descer ninguém”, disse.

No Hospital Evangélico, a situação é parecida. Lá, cerca de 25% dos pacientes atendidos em consultas eletivas são oriundos da RMC. A superintendente de Saúde do Evangélico, Edmara Seegmuller, explica que não há estudos que apontem os motivos que levam a essa demanda, mas ela acredita que questões socioeconômicas, além das condições dos serviços de saúde destes municípios, possam ser explicações plausíveis.

Falta de profissionais dificulta os trabalhos

O secretário de Saúde de Campo Largo, Luciano Werner, admitiu as dificuldades na saúde básica do município. Ele afirmou que o problema é a falta de profissionais de saúde e a impossibilidade de remunerá-los adequadamente. E para piorar, não há a perspectiva de contratações tão cedo. “Infelizmente a oferta é limitada e a demanda, infinita”, lamentou.

Dessa forma, o secretário disse que a prefeitura vem fazendo o máximo que pode. “Se pecamos na quantidade, então temos que melhorar a qualidade do acolhimento. Sabemos que as filas são um problema, mas fazemos de tudo para que o paciente seja bem atendido”, alegou. Segundo Werner, a prefeitura tem um projeto de informatizar todas as unidades, para agilizar o atendimento. Um dos grandes problemas em Campo Largo são as unidades localizadas em áreas mais retiradas, onde não há especialistas. “Além de contratar, precisamos investir em capacitação, para haver resolutividade”, afirmou.

O secretário de Saúde de São José dos Pinhais, Alan Diorio, também alegou que a escassez de profissionais é o dilema na saúde pública da cidade, aliada ao crescimento desordenado da população. Segundo ele, algumas unidades ficam sobrecarregadas, como a que atende a região de Borda do Campo – onde será construída mais uma unidade – do Guatupê e do Afonso Pena – a unidade deste bairro está sendo ampliada. O secretário também informou que este ano foram contratados oito médicos.

A prefeitura de Pinhais info,rmou que já foi implementado na cidade o serviço de coletas de exames e marcação de consultas especializadas direto nas unidades. Ainda de acordo com a prefeitura, a saúde básica do município deverá disponibilizar em breve atendimento de fisioterapia e de saúde mental.