Em Antonina, onde duas pessoas morreram soterradas com a destruição que assolou o litoral em março, a fúria dos deslizamentos de terra continua a ameaçar o sossego e a coragem de recomeçar dos moradores. Tanto que a resistência em deixar as residências, como ocorre em Morretes, é bem menor. Além disso, o posicionamento da Defesa Civil estadual e da Mineropar sobre a interdição dos bairros Laranjeiras, Caixa d’Água e Km 4 é mais contundente. “Não dá para voltar para boa parte das casas desses bairros, tanto que elas continuam com a energia elétrica cortada. Só estamos permitindo que os moradores circulem pelas casas, a fim de aproveitar algum material do que restou de suas moradias”, conta o psicólogo da Secretaria de Ação Social de Antonina, Durval Souza Filho.
“É muito risco para uma vida, não dá para autorizarmos o retorno”, revela. Mesmo assim, diariamente, o psicólogo é consultado por antigos moradores que ainda nutrem a esperança de voltar para os antigos endereços. O desempregador Nabor Veiga, que estava em Laranjeiras para buscar as esquadrias de alumínio da janela, tentou sem sucesso negociar seu retorno. “Eu, meu irmão e mais minha mãe tivemos que nos acomodar em uma casa pequena. Além do desconforto, por mês gastamos R$ 800 só para morar”, conta Veiga.
Quem não teve renda para arcar com um aluguel e nem parentes ou amigos para se hospedar precisou recorrer aos abrigos. O antigo morador da localidade Beco das Viúvas, João Batista Campos, viveu uma verdadeira peregrinação ao longo desses quatro meses na condição de desabrigado. “Fiquei apavorado ao ver tudo desabar”, lembra. “No que depender de mim não volto nunca mais para lá”. A afirmação vem de alguém que precisou se adaptar à vida sem privacidade. “Em um primeiro momento tive que pedir licença do meu serviço, porque não sabia se iriam mudar minha família de endereço ao longo do dia. Depois, passamos para um colégio (Escola Municipal Professor Gil Feres), onde 15 famílias tinham que dividir uma cozinha e um banheiro. Conseguimos mais conforto quando nos realocaram para a Capemi (Caixa de Pecúlio Militar)”, conta.
“As crianças baixaram o rendimento escolar com toda essa situação, mas estamos superando”, revela Batista que virou uma espécie de líder comunitário no abrigo.
Em Antonina, a reconstrução das 88 moradias tende a demorar mais do que Morretes, já que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) só liberou no dia 15 deste mês a licença de instalação para o início das obras no terreno localizado na Avenida Thiago Peixoto, no bairro Batel. “Se o tempo ajudar, em seis meses poderemos entregar as casas”, prevê Souza Filho. Para Antonina, o total de recursos que o governo estadual repassará será de R$ 9,34 milhões. Todo aporte financeiro para o litoral é fruto do orçamento de R$ 25 milhões que o governo federal destinará para o Paraná, por intermédio do Ministério da Integração Nacional e a Secretaria Nacional da Defesa Civil.
Invasão de privacidade
Além da dificuldade de não ter um lar, os moradores das áreas interditadas em Antonina ainda testemunham o descaso de pessoas que circulam pelas áreas devastadas seja para “apreciar” a tragédia alheia, seja para usar as construções para consumir drogas. “A cidade está dominada pelo crack e o uso desses espaços para essa finalidade é um grande problema que estamos enfrentando”, admite Souza Filho.