Vocação para ser herói da vida real é a condição indispensável para quem sonha fazer parte do Siate, que chegou aos 25 anos de existência na semana que passou, totalmente incorporado ao cotidiano. Basta tentar imaginar como as gerações anteriores sobreviveram sem contar com serviço pré-hospitalar capaz de socorrer pessoas, realizar o primeiro atendimento e resgatá-las de forma adequada, envolvendo o risco de morrer e a corrida contra o tempo até o hospital.
“Era comum vítimas graves morrerem no caminho, porque as pessoas improvisavam uma tala em caso de fratura ou amarravam pano na tentativa de estancar o sangramento e traziam o paciente da maneira que dava dentro do carro da família ou contavam com a ambulância do hospital, que até então apenas fazia o deslocamento de vítimas em cima de uma maca”, recorda um dos fundadores do Siate, o médico e cirurgião do aparelho digestivo, Ricardo Rydygier de Ruediger.
Sequelas
“Muitas pessoas ficaram tetraplégicas porque tiveram lesão na coluna vertebral, mas por conta do transporte inadequado atingiram a medula. Vidas se perderam pela falta de manobras simples, como a de desenrolar a língua de uma pessoa em convulsão”, exemplifica.
Ciente de todos os desafios para desenvolver e pôr em prática o projeto-piloto do Siate, Ruediger afirma categoricamente que a principal razão para o serviço ter se expandido e estar completando 25 anos é o envolvimento dos profissionais. “Estamos vivos porque somos muitos teimosos e entusiasmados”.
Estrutura bipolar
A estrutura do Siate está condicionada à disponibilidade de recursos de cada governante que assume a gestão do Estado e do município, uma vez que a verba chega por convênio. “Em meio a essa condição bipolar do que cada governante prioriza, já tivemos períodos em que contávamos com 15 ambulâncias para toda a cidade e outros, com cinco, mas graças ao compromisso dos profissionais em serviço o atendimento sempre foi feito. Foi essa convivência com os socorristas que me fez sempre estar disposto a ajudar e fazer a diferença, mesmo nas adversidades”, resume o médico fundador do Siate, Ricardo Rydygier de Ruediger, que trabalhou nesses 25 anos como médico do Siate até maio.
Duplas
Não é raro verificar que a maioria das ambulâncias chega à ocorrência com dois socorristas, sendo que um deles acumula a função de condutor. Pela recomendação dos idealizadores do serviço, cada ambulância deveria levar ao local de atendimento dois socorristas e mais um condutor com a formação de socorrista.
Horários definidos
Os socorristas têm horários de almoço diferente da maioria, porque acidentes de trânsito e domésticos costumam se concentrar no almoço ou após o jantar.
Quinze minutos depois da refeição, já estavam de prontidão e, 11h52, foram acionados para o segundo atendimento, acidente entre carro e moto seguido por atropelamento no Santa Quitéria.
No local, a equipe atendeu duas vítimas com ferimentos leves e seguiu para a terceira ocorrência, um homem de 73 anos, que caiu na rua e cortou a cabeça.
Dias
“Segunda e terça normalmente têm menos ocorrências”, explicou João. Ao contrário do colega Emerson, com 19 anos como socorrista, João tem apenas um ano e meio no serviço. “Por enquanto, ninguém morreu na minha ambulância”.
Emerson é socorrista há 19 anos e João, há um ano e meio. Foto: Gerson Klaina. |
Existem plantões ‘mais leves’
Como é de rotina, a dupla formada pelo cabo Emerson da Silva, 40 anos,, e o soldado João Victor de Andrade, 28 anos, chegou por volta da 7h15, vestiu a farda e organizou o material na ambulância. Dez minutos antes das 8h, entrou a primeira ocorrência do dia, “vítima feminina de queda em escadaria em hotel na Rua João Negrão, quase esquina com a Rua Pedro Ivo”. A ocorrência entrou às 7h51 e às 7h58 eles já estavam no local, tentando convencer a vítima a receber atendimento e ser conduzida até o hospital.
“Ela tinha escoriações no rosto e contusão no tornozelo, mas estava com a pressão arterial bem alterada e confusa. Levamos quase 20 minutos para persuadi-la a receber atendimento no hospital”, explica Silva. Segundo o protocolo do Siate, no caso em que a vítima não tem responsável e está alterada, a equipe não pode liberá-la.
Quando a vítima está consciente, mas se recusa a ir de ambulância para o atendimento de uma fratura, por exemplo, a equipe solicita a assinatura de termo de responsabilidade a fim de se resguardar em casos de processos judiciais. Retornaram e almoçaram às 11h30, no refeitório do quartel.
Duas horas de conforto
Em 19 anos no Siate, o experiente socorrista Emerson coleciona casos que deixariam qualquer super-herói no chinelo. Certa vez, na Linha Verde, o motorista de um carro perdeu o controle da direção e foi parar dentro de um córrego. A vítima ficou com uma parte do corpo presa na roda do veículo. Era frio e, por quase duas horas, Emerson permaneceu dentro da água, embaixo da lataria do veículo, confortando e atendendo a vítima. Enquanto isso, outra equipe buscava uma maneira de levantar o carro para o resgate. “O homem achava que iria morrer, mas conseguimos salvá-lo”.