Na capital, em algumas obras não há
equipamentos de proteção obrigatória.

Quando se fala em acidentes de trabalho, logo se pensa nas ocorrências da construção civil e da metalurgia. Por muito tempo esses segmentos foram os campeões em sinistros durante o emprego. Mas esse panorama mudou. Nos últimos anos, dois setores passaram a liderar esse ranking: o madeireiro e o de logística (transporte e armazenamento de cargas).

De acordo com dados da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) do Paraná, foram registrados mais de 27 mil acidentes de trabalho em 2002 no Estado. Desse total, 30% aconteceram na indústria de madeira. Os números já não são tão expressivos como na década de 1970, quando era detectado um milhão de acidentes no Brasil por ano. Atualmente, esse índice gira em torno de 350 mil ocorrências no mesmo período. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 160 milhões de casos de doenças relacionadas à profissão, 250 milhões de acidentes de trabalho e 330 mil óbitos acontecem anualmente em todo o mundo.

O chefe do setor de Medicina e Segurança do Trabalho da DRT, Sérgio de Barros, explica que a mudança no ranking de acidentes aconteceu pelas ações do governo, dos sindicatos e das próprias empresas de construção civil a fim de diminuir os afastamentos nos canteiros de obras. Dados do Ministério do Trabalho mostram que o índice de acidentes neste setor era de 2,82% do total em todo o País. Em 2000, passou para 2,06%.

No Paraná, onde existem 260 empresas construtoras e 6,5 mil empregados, a incidência é ainda menor. O Sindicato da Construção Civil do Paraná (Sinduscon-PR) implantou em 1996 o Programa de Segurança e Saúde. No ano que o projeto entrou em vigor, as construções representavam 1,71% dos casos. Em 2002, este número caiu para 0,37%. Hoje em dia, este setor está no terceiro lugar no ranking de acidentes.

Segundo Barros, o problema da construção civil está nas diferenças entre a capital e o interior. “Em Curitiba, os trabalhadores de grandes obras estão protegidos. As empresas já colocaram proteções nos poços dos elevadores, bandeijões, roupa especial, como cintos e botas apropriados”, conta. “A dificuldade na capital está nas pequenas obras, onde a informalidade impera. Os pedreiros estão de chinelo e praticamente sem proteção”, comenta. Já nas cidades do interior, nem mesmos as grandes construções têm o cuidado devido. “Onde há as subdelegacias do Trabalho, tudo está bem. Nos outros municípios, nem os prédios altos estão protegidos. É uma questão delicada”, avalia Barros.

Informalidade

A informalidade também é motivo de preocupação na indústria madeireira. De acordo com o integrante do DRT, a maior parte dos acidentes acontece em empresas familiares, geralmente bem humildes. As máquinas antigas, o excesso de barulho, o pó da serragem e os cavacos (pequenos pedaços de madeira que se soltam durante o processo) podem causar problemas respiratórios, de vista e de audição, sem falar nas possíveis mutilações. O quadro é agravado pelo fato de os trabalhadores não possuírem qualificação profissional.

O ranking de acidentes também considera o setor moveleiro como parte integrante da indústria da madeira e que apresenta muitas ocorrências. Na fabricação de móveis, o processo é um pouco mais qualificado. Os erros, porém, persistem devido às máquinas e à insalubridade do ambiente de trabalho. Por causa disso, os casos de mutilação são comuns nas fábricas de móveis. Barros conta que os banhos químicos de imersão na madeira (para proteger o material contra fungos), a pintura e as colas são os itens que também podem causar acidentes nesta área. “Muitos empregados trabalham de chinelo de dedo, sem máscara, protetor auditivo e óculos de segurança”, explica Barros.

O ramo de logística, que compreende o transporte e armazenamento de cargas, é o segundo no índice de acidentes. “Hoje em dia, em função do comércio eletrônico, houve um fortalecimento grande desta área e isso motivou o aumento dos acidentes”, justifica Barros. Os acidentes acontecem no trajeto propriamente dito, como em acidentes na estrada, e nos armazéns.

A prevenção traz economia

Uma estimativa do Ministério do Trabalho aponta que R$ 20 bilhões são gastos com acidentes de trabalho por ano no Brasil, o que representa aproximadamente 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Neste valor, estão inclusos os auxílios e pensões do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), além da paralisação e substituição de mão-de-obra nas empresas.

“É muito dinheiro jogado fora e que pode ser investido em outro lugar”, comenta Barros, chefe da Segurança do Trabalho da DRT. “Se essa quantia for aplicada na prevenção, a empresa vai economizar bastante. O investimento na segurança de trabalho não pode ser visto como gasto.” De acordo com ele, se a empresa empregar R$ 1, em dois anos tem a economia de R$ 5. “Isso faz parte das visões estratégicas da empresa e que precisam estar ligadas com a filosofia de trabalho”, indica Barros.

Ele conta que as fábricas e estabelecimentos que atingem recordes de períodos sem acidentes de trabalho fazem uma festa enorme por ter atingido os objetivos de garantir a qualidade de vida do trabalhador, redução de despesas e melhora na imagem da empresa.

As dificuldades de investimento estão nas pequenas e médias empresas. Essas não possuem tanto dinheiro para investir, deixando a segurança do trabalho de lado, ocasionando acidentes desnecessários. “Oitenta por cento dos erros são provenientes de falta de assessoria neste setor e de desconhecimento da legislação”, comenta o integrante do DRT.

Galvanoplastia tem alto risco de morte

As atividades com substâncias químicas são outro motivo grave de acidentes de trabalho. Um dos setores com mais problemas é o da galvanoplastia, na indústria metalúrgica. Consiste em um processo químico pelo qual se dá proteção à superfície de um material. O efeito também pode ser decorativo.

A exposição ao cromo e ao ácido sulfúrico, por exemplo, podem trazer prejuízos a longo prazo à saúde do trabalhador. A fumaça, o calor e a intoxicação geram problemas de destruição do septo nasal, perfuração do estômago, cirrose hepática, câncer, impotência, entre outros. “E há aqueles casos como o do trabalhador que cai dentro da banheira com as substâncias químicas e sai todo queimado”, conta o diretor de saúde do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Curitiba, Núncio Manala.

O processo que utiliza a sílica, uma espécie de areia, para tirar a ferrugem do aço é um dos mais agressivos para a saúde. Os jatos com alta velocidade espalham a sílica no ar, fazendo com que o trabalhador, trancado em uma sala, respire o produto. “Isso empedra o pulmão, originando a doença silicose, em que o paciente morre por falta de ar”, comenta Manala. Ele afirma que em 1998 e 1999 foram registrados 85 casos da doença. Destes, já morreram 59. “E só aqueles que conseguem transplante de pulmão podem sobreviver”, aponta.

Para combater esse quadro triste, há quatro anos, um acordo foi assinado pelas 96 empresas da área na Região Metropolitana de Curitiba a fim de fornecer mais condições aos empregados. A fiscalização do DRT apontou que sete estabelecimentos ainda não se adequaram e poderão ser interditados.

Além da proteção individual, um bom ambiente de trabalho

Não basta fornecer ao empregado máscaras, luvas, roupas especiais, protetores de ouvido e óculos de segurança. A prevenção dos acidentes precisa ser realizada no ambiente de trabalho. “A proteção individual é um dos itens, mas não o principal. As empresas devem interferir o mínimo no corpo do operário e o máximo no ambiente”, explica Barros.

Nos processos químicos, por exemplo, o trabalhador usa máscaras. Mas a fumaça também entra no corpo por meio da pele e da mucosa da boca. “Mesmo usando máscara, o trabalhador pode ter a ruptura do septo nasal, que corrói a cavidade do nariz. Seria preciso instalar um sistema de exaustão para sanar o problema”, cita Barros. Em outros setores, o ideal é a infra-estrutura ser adaptada e, se houver algum resíduo, o equipamento individual é distribuído aos funcionários.

Para garantir a saúde do trabalhador, são feitos programas de prevenção de riscos ambientais. Uma das medidas é criar o mapa de risco, que indica quais são os possíveis prejuízos físicos, químicos e ergonômicos (relacionados às ferramentas de trabalho). Além disso, é instaurado um Programa de Controle Medicional de Saúde Ocupacional, com o objetivo de determinar quais os exames necessários aos quais os empregados devem se submeter.

Punições

A fiscalização sobre a segurança dos trabalhadores é realizada pela Delegacia Regional do Trabalho. As denúncias são passadas para os sindicatos da categoria, que, por sua vez, as envia para a DRT. As empresas que desrespeitarem a legislação serão multadas. Dependendo da gravidade da situação, os estabelecimentos podem ser interditados.

Números sobre os acidentes de trabalho

* As indústrias de madeira e móveis, o transporte e armazenamento de cargas e a construção civil são os setores líderes de acidente de trabalho.

* Em 2002, foram registrados mais de 27 mil ocorrências deste tipo no Paraná.

* No Brasil aconteceram 350 mil acidentes de trabalho no ano passado.

* A Organização Internacional do Trabalho estima que 160 milhões de doenças profissionais, 250 milhões de acidentes de trabalho e 330 mil mortes ocorrem em todo o mundo anualmente.

* Somente no Brasil são gastos R$ 20 bilhões, por ano, nos custos dos acidentes de trabalho.

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