"Por que você não olha para mim? Me diz o que é que eu tenho de mal! Por que você não olha para mim? Atrás dessa lente tem um cara legal." O refrão da música composta por Herbert Viana, do Paralamas do Sucesso, que virou hit nos anos 80s, reflete como boa parte das pessoas – em especial adolescentes – se sente em relação à necessidade do uso de óculos.
Segundo a oftalmologista Tânia Schaefer, presidente da Associação Paranaense de Oftalmologia, 70% das pessoas que são atendidas pelos profissionais necessitam de algum tipo de correção. "Os problemas mais comuns são miopia, hipermetropia e astigmatismo, e a primeira opção são os óculos", diz. Ela confirma, porém, que a maioria dos pacientes não se sente confortável com o acessório. "Algumas pessoas reclamam do incômodo, mesmo que hoje a indústria tenha disponibilizado armações e lentes de materiais leves, que incomodam menos".
De um modo geral, as pessoas só costumam procurar um especialista e detectar os problemas de visão quando começam a sentir dificuldades em enxergar. No caso das crianças, os principais indícios são quedas constantes ou baixo rendimento escolar, pois não conseguem acompanhar o ritmo das aulas porque muitas vezes têm dificuldades de enxergar. "O ideal é que seja feito um trabalho preventivo. Os pais costumam levar os filhos ao consultório só quando notam reflexos de estrabismo ou quando as crianças caem muito. O certo seria levar a criança ao oftalmologista no máximo com quatro anos". A explicação é simples. Muitos problemas podem regredir se o uso do óculos for empregado cedo.
Causas
Os problemas de visão que resultam na necessidade do uso de óculos pouca relação têm com hábitos. A predisposição ao desenvolvimento de problemas de visão está vinculado ao padrão individual de formação genética, que influencia inclusive o tamanho, a cor e o formato dos olhos. "Se vier determinado no padrão individual, a pessoa vai desenvolver a aberração", diz.
Mesmo quem não apresenta qualquer problema nas primeiras décadas da vida, certamente não estará livre dos óculos por volta dos 40 anos, quando a presbiopia atinge a visão. "Com o avançar dos anos, a musculatura ocular se desgasta e surge a vista cansada, que atinge 100% da população após os 40 anos", diz Tânia.
Diálogo entre pais e filhos é muito importante
Apesar de algumas pessoas não verem problema no uso dos óculos, muitas sofrem por terem que carregar o acessório, especialmente crianças e adolescentes. No primeiro caso, as limitações de movimento podem impedir que a criança interaja em brincadeiras comuns à infância. Na puberdade, a questão estética é que gera a problemática.
Segundo a psicóloga Regina Eliane Pick, especialista em atendimento infantil, o ideal para evitar problemas de ordem psicológica é que haja a manutenção de diálogo constante entre pais e filhos. "Muitas vezes os pais também tiveram ou têm que usar óculos e mesmo que não, cabe a eles mostrarem que as diferenças existem, mas não as fazem melhores ou piores", explica.
Outra medida eficiente para evitar que os óculos se tornem um problema que mine a auto-estima dos filhos, é permitir que a criança ou o adolescente escolha os próprios óculos. Antigamente, as armações eram grosseiras e pesadas. Hoje o mercado se ampliou. "Há armações mais leves, com hastes mais fixas e inspiradas em personagens infantis. Comprar os óculos pode ser uma grande diversão para a criança", diz a psicóloga.
Nesse trabalho de respeito às diferenças, a escola também tem um papel decisivo na aceitação do problema pelas crianças. "A escola deve ficar atenta para problemas de discriminação entre os alunos. Se possível, pode inclusive usar o exemplo entre quem usa e quem não usa óculos para desenvolver o debate sobre as diferenças entre as pessoas".
Acessório pode ser símbolo de estilo
Se para uns os óculos só trazem incômodo, para outros ele pode ser um símbolo de estilo. A consultora de estilo Ângela Valiera entrega que alguns clientes que atendeu pediram para que ela incluísse o acessório no pacote, mesmo sem possuir problema algum nos olhos. Os pedidos geralmente vêm de advogados e arquitetos. A oftalmologista Tânia Schaefer confirma a informação, revelando que muitas pessoas utilizam óculos sem grau algum.
Segundo Ângela, na questão de imagem, os óculos passam a impressão de seriedade e inteligência. "Pessoas que geralmente começam a trabalhar muito jovens em áreas onde a experiência conta muito, o acessório pode ser um aliado", revela, confessando que ela mesma já usou do artifício quando trabalhava como design gráfico. "Meus óculos eram indicados especialmente para dirigir ou trabalhar, mas usava também em reuniões com clientes".
Porém todo o cuidado é pouco. Se para pessoas mais jovens o acessório passa a imagem de uma seriedade positiva, para pessoas com mais de 40 anos, os óculos podem ter efeito contrário. "A partir dessa idade, os óculos passam a imagem de que a pessoa está envelhecendo e precisa de artifícios para desempenhar o seu trabalho", explica.
Cirurgia a laser corrige imperfeições
O empresário Saulo Camargo só descobriu que tinha problema na visão quando fez o exame obrigatório no Detran, aos 18 anos. Reprovado no teste, ele procurou um especialista e veio o diagnóstico: astigmatismo nos dois olhos, com 1,5 grau no olho esquerdo e 2,5 graus no direito.
Ele diz que, por ser a solução mais rápida, ele optou pelos óculos, mas que logo cogitou mudar para as lentes de contato. "Além da questão estética, nunca fui uma pessoa muito cuidadosa. As lentes sempre ficavam riscadas e as armações tortas", confessa. Outro problema era a limitação física que o acessório proporcionava, prejudicando a prática de esportes.
Sem a adaptação desejada, os óculos ficaram restritos a alguns momentos de leitura. Camargo optou, para o dia-a-dia, pelas lentes, que também traziam incômodos relativos aos cuidados. "Confesso que durante o período em que eu utilizei não consegui levar à risca os procedimentos de limpeza".
A vida do empresário só mudou no ano passado, quando ele foi submetido à cirurgia a laser que corrigiu as imperfeições visuais, possível após a estabilização do astigmatismo. "A recuperação foi muito rápida. Além de solucionar o problema, representou economia, pois gastava muito com as lentes".
