Prova do Enem marca uma revolução no ensino brasileiro

Adeus à decoreba. Questões que avaliem o conteúdo, sim, mas que o relacionem com atividades cotidianas dos alunos. A prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano, que vai ser aplicada em todo o Brasil nos dias 3 e 4 de outubro, pretende começar a revolucionar o ensino médio brasileiro.

A partir deste ano, mais que avaliar o conhecimento dos estudantes, a prova do Enem terá maior importância para o ingresso dos alunos no ensino superior. No Paraná, a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) substituiu seu vestibular pela prova do Enem.

Na Universidade Federal do Paraná (UFPR) o Enem representará 10% do valor final da nota do vestibular. Até o ano passado, a nota do Enem era apenas um dos critérios de desempate da UFPR. Essas mudanças já tiveram reflexo no número de inscritos, que bateu recorde este ano: 4,5 milhões de inscrições.

A proposta do ministro é acabar com o vestibular, criando, com o Enem, uma avaliação unificada em todo o País, nos próximos anos. Nessa primeira tentativa, pelo menos 50 instituições federais do País vão usar o Enem de alguma forma.

Muitas mudanças e também muitas dúvidas. Há tempos o governo federal vinha avisando que iria mudar o Enem tradicional, que existe desde 1998. E aí, no meio do ano, o ministro Fernando Haddad comunicou que o Enem ia mudar mesmo. E que iria ser agora.

O aviso pegou estudantes, colégios, cursinhos e universidades de surpresa, fazendo com que todos tivessem que se adaptar às exigências enquanto seus planejamentos para 2009 já estavam em andamento.

“O novo Enem foi feito de forma afobada, porque temos eleições presidenciais no ano que vem. As próprias universidades não foram convencidas a adotar o Enem porque ele é bom, mas porque vão receber mais recursos se aderirem à proposta do governo federal”, ressalta o diretor-geral do Curso Positivo, Renato Ribas Vaz.

Aliás, as discussões sobre o Enem foram feitas muito mais com as instituições de ensino superior do que com os estados, responsáveis pelo ensino médio. “Muito pouco se respeitou as estruturas do ensino médio e por enquanto a estrutura é dúbia, tem pouca consistência. Tem que se ouvir as secretarias estaduais e o compromisso é de ampliar esse diálogo no próximo ano”, afirma a gestora em avaliação da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, Maria Inês Fini, uma das criadoras do primeiro Enem.

Para Fini, essa mudança chegou de forma imatura. “Não houve discussão com a sociedade nem tempo adequado para prepararmos os jovens. Temos que fazer uma guinada totalmente diferente. Do contrário, vamos ter pouquíssimas ações efetivas”, avalia.

Opinião parecida é a do professor Marlus Geronasso, coordenador do curso preparatório para o Enem do Grupo Educacional Uninter. “O novo Enem veio para ficar, é um caminho sem volta. Mas colocaram o carro na frente dos bois”, diz.

“Se essa avaliação servir para que, a partir dos resultados, haja investimento nas escolas públicas, tem que começar pontualmente nas regiões mais defasadas”, opina.

Prova do Enem deverá ser bem cansativa

Três minutos e trinta e sete segundos. Esse é o tempo médio que os alunos terão para responder cada uma das 180 questões do novo Enem. Por isso, a expectativa é que o Enem seja mais cansativo que difícil.

Alunos como Gustavo Viana Lopes, de 17 anos, dizem preferir o Enem, apesar de já terem sentido o cansaço durante simulados. “Eu vejo como um mérito decifrar a questão, mas como são muitas questões, quando chega no meio você já está vencido fisicamente”, conta.

Alguns estão mais resistentes à mudança, como a estudante Daniele Custódio, que concorre a uma vaga no curso de Arquitetura e que prefere o vestibular tradicional.

“Não acho que vai ser uma prova fácil como foi ,em anos anteriores. Para mim, que já fiz vestibular duas vezes e já sabia exatamente o que estudar, complica bastante”, acredita. Para Jéssica Volpe pesa a incerteza sobre os conteúdos. “Em anos anteriores era possível conversar com quem já tinha feito a prova para se ter uma ideia. Esse ano não se sabe o que esperar da prova”, diz.

Para o aluno, muda a percepção que se tem que ter sobre o estudo. “O aluno precisa desenvolver habilidade em juntar conhecimentos aprendidos nas diferentes aulas com o que vê na televisão e lê na revista. A proposta do Enem é trabalhar as múltiplas inteligências”, apresenta o diretor do curso preparatório Dom Bosco, Ari Herculano de Souza.

Segundo o professor, o Enem não deve fazer prova do tipo “pegadinha”. “Não vai ser de conteúdo difícil, mas alternativas muito parecidas entre si, o que avalia a tomada de decisão pelo aluno. Pode-se eliminar de cara qualquer alternativa politicamente não-correta, como as que lembrem segregação ou não preservação da natureza”. (LC)

Exigências para os professores

A identidade do ensino médio foi colocada em pauta com a proposta do novo Enem. E, mais do que se exigir dos alunos, vai se exigir mudança dos professores.

“Com a nova Lei de Diretrizes e Bases, em 1996, o MEC já apontava para mudanças. O governo não poderia fazer toda reformulação de leis sem cobrar a fatura. E essa fatura é o novo Enem”, define a professora Elaine Silva, que tem preparado os professores pelo Iesde Brasil.

Para que essa nova concepção seja adotada pelos estados, é importante que esse modelo seja viabilizado pelo governo federal com recursos, na opinião da gestora em avaliação da Secretaria de Educação de São Paulo, Maria Inês Fini. “Vai ficar muito fácil para o governo federal ditar as regras e não apoiar financeiramente os estados”, diz.

A concepção pensada pelo governo federal pretende trazer maior clareza sobre o papel do ensino médio. “Por um bom tempo, só se preparava para o ingresso no vestibular ou formava para o mercado de trabalho aqueles que não iam fazer o ensino superior”, lembra a coordenadora pedagógica do departamento de educação básica da Secretaria de Educação do Paraná, Maria Eneida Fantin.

“O vestibular de algumas regiões define o que as escolas devem ser, numa espécie de submissão do ensino médio de alguns vestibulares de alguns lugares, que se quer acabar”.

Raio-X do novo Enem

Datas da prova

-3 e 4 de outubro (sábado e domingo)

-No sábado, das 13h às 17h30, provas de Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias. No domingo, das 13h às 18h30, provas de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e Redação e Matemática e suas Tecnologias.

-Os portões de acesso aos locais de prova serão abertos às 12h e fechados às 12h55.

Locais

-As provas acontecerão em 1.826 municípios. No Paraná, haverá provas em 97 dos 399 municípios do Estado.

Mudanças

– De questões basicamente focadas na interpretação de texto, o novo Enem se propõe a cobrar mais conteúdo, voltado para a solução de problemas. Com isso, busca-se a reformulação do currículo do ensino médio.

– A prova vai valer também para certificação de conclusão do ensino médio, desde que o candidato tenha, no mínimo, 18 anos.

Simulados e conteúdos

Ministério da Educação: foram disponibilizadas 40 questões-modelo do novo Enem, que podem ser conferidas pelo site www.enem.inep.gov.br .

Grupo Educacional Uninter: pelo site www.grupouninter. com.br/enem, entrar no link “simulado”. O teste ficará disponível até 1º de outubro, com 60 questões, e poderá ser feito em até três horas. O resultado sai em seguida.

Inteligência Educacional e Sistemas de Ensino (Iesde): o programa “Enem sob consulta” permite que até 4 de outubro todas as videoaulas já produzidas pelo Iesde com conteúdo do ensino médio estejam disponíveis gratuitamente por, meio do site www.enemsobconsulta.com.br.

Novas edições

– O aluno pode fazer o Enem quantas vezes quiser, mesmo que tenha concluído o ensino médio já há alguns anos. A proposta inicial é a de que o Enem seja oferecido duas vezes por ano. Uma nova edição deverá ser aplicada em março ou abril de 2010.

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