O Programa M?Boé Kuaa, um projeto com duração de cinco anos, que capacita índios guaranis a dar aulas em suas aldeias, tem realizado experiências pedagógicas muito originais. A opinião é do coordenador-geral de educação escolar indígena do Ministério de Educação (MEC), Kleber Gesteira Matos, que ressalta o constante diálogo entre os participantes do curso e os membros mais velhos das aldeias.
Ele frisa também o valor do intercâmbio cultural e a maneira em que os participantes desenvolvem o conhecimento, aliando os estudos com a prática. ?O processo pedagógico é muito interessante, ainda mais numa época de crise de ensino?, afirma. O projeto conta com a participação do MEC, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e das secretarias de Estado de Educação do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Ontem, no Seminário para Formadores do Programa M?Boé Kuaa, em Florianópolis, foi finalizada a sistematização e programação das etapas deste ano. Cerca de 80 índios da etnia guarani já participaram das duas primeiras etapas do curso de formação no ano passado. O curso tem validade de ensino médio.
Segundo Matos, no programa M?Boe Kuaa, que em guarani significa processo de ensino-aprendizagem, os futuros formadores compartilham experiências pedagógicas, fazem pesquisas a respeito da cultura guarani e refletem sobre a história e as condições políticas de sua etnia. Matos diz que o curso acontece em módulos presenciais de um mês, período no qual os participantes dos seis estados são reunidos em Florianópolis. ?Quando retornam para suas aldeias, voltam com uma série de objetivos de pesquisa e de estudos para apresentarem na etapa seguinte?, afirma.
Para Matos, um dos objetivos do programa é contribuir para a valorização da identidade e cultura étnica, ao mesmo tempo em que se estimula o diálogo com toda a sociedade brasileira. ?É importante valorizar o conhecimento tradicional de um lado, e é igualmente importante dispor o que a cultura ocidental pode oferecer?. Embora a língua guarani tenha evoluído com o tempo, como acontece com todos os idiomas, o programa pretende resgatar a cultura guarani. Conforme Matos, está previsto para que neste ano sejam publicados diversos materiais, trazendo narrativas, músicas e conhecimentos tradicionais dos guaranis.
Documentação
Segundo a doutora de lingüística da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ruth Monserrat – que dá aulas de guarani e português no programa – o idioma guarani é o único que possui documentação escrita por não-índios desde o século XVII. Ela diz que esse fato contribui para que os guaranis possam recuperar com mais facilidade a memória de seu povo.
O povo guarani possui cerca de 35 a 40 mil indivíduos, mas os que vivem do litoral do Espírito Santo até o Rio Grande do Sul são aproximadamente sete mil indivíduos. Matos diz que grande parte deles são praticamente monoglotas e vivem em situações precárias.
