Entre os 200 milhões de brasileiros, cerca de 90 milhões compõem a força de trabalho no País. Destes, o consultor e headhunter Bernt Entschev estima que de 9 milhões a 11 milhões sejam funcionários públicos. Mas no que depender de muitos, o número deve crescer ainda mais, já que a procura por vagas em concursos públicos não para de crescer. Para o próximo ano a previsão é de 52.585 contratações por concursos, de acordo com o Projeto de Lei Orçamentária Anual, que podem aumentar em R$ 2,746 bilhões as despesas com salários.
Estabilidade e bons benefícios estimulam a procura dos trabalhadores, fazendo com que o cenário se torne complexo: bons profissionais – que deixaram para trás milhares de candidatos no processo seletivo – têm acesso à remuneração competitiva com o setor privado ao mesmo tempo em que se deparam com o desafio da motivação, já que são poucas as chances de crescimento profissional e as estruturas de trabalho são muito consolidadas.
“As pessoas admitidas pelos concursos públicos formam a elite brasileira. São os melhores, obviamente a elite do nosso pensamento. Mas é uma pena muito grande se a gente não puder aproveitá-las adequadamente, com todo o talento que elas têm. A pessoa faz o concurso, se prepara, estuda, mas depois que passa acaba improdutiva. Isso não pode acontecer”, avalia o consultor, que não descarta o processo de modernização pelo qual o setor público vem passando.
Por que a procura por concursos públicos está tão grande?
Existem épocas com apelo muito maior para concurso público, que é de insegurança na economia de mercado. Desde a crise de 2008 para cá tornou-se uma febre fazer concurso. Principalmente pela estabilidade e porque algumas funções do governo pagam realmente bem. Também tem muito a ver com ideologia do governo. O presidente Fernando Henrique Cardoso trabalhou muito para diminuir o tamanho do Estado e, com isso, precisou diminuir o número de funcionários públicos. Já com o PT no poder está aumentando a base, onerando ainda mais o País com a carga tributária, já que o governo em si não produz nada e precisa pagar seus funcionários.
A remuneração é a principal diferença entre os setores público e privado?
O funcionário público, de modo geral, tem regimes e regimentos muito diferenciados da iniciativa privada. A primeira grande diferença é a estabilidade. É quase impossível conseguir demitir um funcionário público. A segunda condição é que os funcionários públicos se aposentam com salário integral, coisa que não acontece na iniciativa privada. Isso não afeta tanto as pessoas que estão na base. O cidadão que ganha R$ 2 mil na prefeitura, por exemplo, pode também conseguir a aposentadoria pelo setor privado. Mas quando a pessoa tem cargos mais altos, isso é mais representativo.
Isto pode comprometer a qualidade do trabalho?
Administrar um funcionário público é mais complexo. Como ele tem direitos “imexíveis”, obviamente é preciso motivá-lo, fazer com que ele trabalhe, atenda bem o público e não desvie. Não só dinheiro ou recursos, mas no sentido de não trabalhar, ficar enrolando. Isso também é desviar. Mas a grande maioria dos funcionários públicos é gente muito honesta e infelizmente nossa tendência é generalizar as pessoas, pegando 2% ou 3% que são ineficientes, desonestos.
Onde estão os bons profissionais: no setor público ou no privado?
Uma pequena parcela de funcionários públicos tenta ingressar em outros departamentos, aqueles que já estão na própria base do governo, e a maioria vem da iniciativa privada, nos mais diversos níveis. Mas n&at,ilde;o vamos encontrar gerentes ou diretores fazendo concurso. Para os cargos de base, de até R$ 5 mil, a iniciativa privada é pior que o governo. De R$ 5 mil pra cima o profissional vai ganhar mais na iniciativa privada, que tende a remunerar melhor e consegue segurá-lo. Alguns departamentos do governo já conseguem dar benefícios por produtividade, mas ainda é uma pequena monta.
Há um perfil para o funcionário público?
Acho uma pena o indivíduo com alta iniciativa, com capacidade grande de guiar seu próprio nariz, ir para o serviço público porque é cheio de regras, de limitações. Quando a pessoa tem essa capacidade muito grande de empreender é uma pena, pois estamos perdendo um belo de um empresário, capaz de montar uma empresa, com dinâmica própria dele. Isso não quer dizer que não possa fazer o mesmo no serviço público, mas é muito mais complicado porque muitas das normas dependem de aprovação em Assembleia, Congresso. Mesmo que seja um funcionário brilhante, com uma ideia maravilhosa, tem que passar pelo Congresso.
Qual a orientação para o profissional que pretende fazer concurso público?
Oriento todo mundo que queira fazer concurso que fale com as pessoas que já trabalham no departamento. Vá até lá, converse com elas, diga que quer fazer o concurso e converse com o gerente do departamento, para ter ideia do que vai enfrentar quando passar no concurso. Leia tudo sobre a instituição, sobre a vaga. Mas nada substitui uma visita pessoal até lá para ver como é o ambiente.