Em 2010, problemas de quase oito anos na administração do Porto de Paranaguá chegaram a pontos insustentáveis e vieram à tona. Com a Operação Colônia da Polícia Federal e intervenções da Justiça Federal e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) exigindo providências, o porto começou a seguir um novo caminho.

continua após a publicidade

O caso mais recente foi divulgado na última terça-feira. Uma liminar da Justiça Federal determinou que a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa) promova a limpeza e a conservação de toda a área do porto de Paranaguá, onde se desenvolviam ratos, cobras e pombos em meio aos grãos que caem nos processos de transferência de carga.

A liminar foi a gota d’água depois de 39 autuações da Appa entre 2004 e 2009 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), sem que fossem tomadas providências. Ela foi proferida a pedido do Ministério Público Federal (MPF), que constatou os problemas e ajuizou uma Ação Civil Pública. Uma audiência de conciliação foi feita em 21 de outubro, mas não houve acordo.

O juiz Marcos Josegrei da Silva expôs na justificativa da liminar que “a comunidade parnanguara não pode mais ficar exposta a toda sorte de doenças e a um odor que torna o ar em boa parte da cidade pesado e muito difícil de ser respirado, sobretudo nos dias quentes e úmidos”.

continua após a publicidade

Ele impôs multa diária de R$ 50 mil caso não haja limpeza diária da área do porto e das vias públicas que dão acesso a ele. Também exigiu da Appa a elaboração de estudos e implantação de ações para diminuir o desperdício de grãos, uma campanha de educação ambiental junto à comunidade portuária, e a identificação dos pontos de proliferação de pombos e roedores. Além disso, deverá ser planejada uma rota única para transporte de grãos dentro da cidade.

Por meio de nota, a Appa informou que, “embora não discorde da importância de tais medidas para a comunidade parnanguara, questiona que estas responsabilidades sejam atribuídas exclusivamente à autarquia, eximindo empresas e prefeitura de suas competências”. A comunicação ainda garante que muitas das medidas já são tomadas, portanto, “a Appa inicialmente apresentará pedido de reconsideração ao juiz federal que proferiu a decisão, com o objetivo de esclarecer e adequar alguns pontos da mesma”.

continua após a publicidade

Irregularidades

A Appa também foi multada em R$ 4,8 milhões pelo Ibama em julho. O Porto de Paranaguá foi interditado por algumas horas devido ao descumprimento de um acordo para regularização ambiental da operação do terminal.

Alguns documentos exigidos foram entregues no final de agosto e, na última semana, a Appa entregou ao Ibama os últimos levantamentos para a obtenção da licença ambiental dos terminais portuários. Ainda falta o Planejamento Estratégico Ambiental, que poderá ser entregue em até 13 meses, mas com o que tem, o Ibama já poderá conceder a licença que é o primeiro passo para a retomada da operação do terminal de álcool e da dragagem – que será feita por manutenção no Canal da Galheta e por aprofundamento dos berços de Paranaguá até Antonina.

Como se já não bastassem os problemas ambientais, o porto passou também por problemas administrativos. Em setembro de 2007, depois de denunciar irregularidades na contratação de licitações e de funcionários, o então diretor técnico do porto, Leopoldo de Castro Campos, foi demitido.

Em 2003, o Tribunal de Contas impugnou diversos contratos que não foram firmados através de licitação. Isso afetou o trabalho de três empre,sas: Cotriguaçu, Rocha Top e Coinbra, que tiveram as áreas de concessão em terrenos do porto ampliadas.

Vizinhos são os que mais sofrem

Quem mais sofre com as irregularidades são as pessoas que vivem perto do Porto de Paranaguá. Os moradores da Vila Becker, por exemplo, que já lutavam contra o gás eliminado pelo processamento de fertilizantes do terminal da Fospar, foram surpreendidos no início do ano passado com a construção de um terminal de álcool, da Alcopar.

Antes mesmo da inauguração, houve um vazamento da carga dos tonéis que alagou várias casas. Trinta famílias tiveram que ser removidas emergencialmente da vila e várias residências foram demolidas. Outras ainda estão em situação de risco.

“A intoxicação, um médico resolve com remedinhos, mas quanto aos vazamentos de álcool não há o que fazer. É um risco constante. O cheiro do álcool dá até dor de cabeça”, desabafa Sandra Armando Gonçalves, do lar, que mora na vila há 26 anos.

O vizinho dela, Nilton Dias Lopes, um segurança de 60 anos, acredita que os vazamentos continuam acontecendo. “Às 3h de segunda-feira meu neto ouviu um barulho muito forte. Achamos que era uma explosão. Ele queria pular da janela achando que tudo ia pelos ares”, conta.

Além do risco de explosão, a condição das moradias é precária. De acordo com a estudante Claudilene Constantino, de 26 anos, roubos são frequentes e a falta de limpeza e manutenção do gramado ao redor do terminal auxilia na proliferação de cobras e ratos. “O vazamento foi um empurrão para resolver a situação das pessoas da vila. Tiraram 30 famílias, mas nós ainda estamos aqui, esquecidos, aguardando as casas da Cohapar”, afirma.

A mãe e a cunhada dela fazem parte do grupo que teve as casas demolidas. As duas estão com o aluguel vencido desde o último dia 19 porque os R$ 4,2 mil cedidos pela Alcopar para o aluguel de um ano acabou. O contrato da empresa não foi renovado e a Appa entendeu que seria melhor assumir o pagamento dos aluguéis. A quantia referente ao próximo ano foi paga na última quinta-feira.

O aluguel vai durar até que cheguem as casas que estão sendo construídas pela Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar). As 400 famílias que vivem na Vila Becker (incluindo as 30 que já foram removidas) e outras que vivem no canal da Anhaia receberão casas de 52 metrso quadrados, financiadas em mais de R$ 20 milhões pelo porto, em uma área próxima de várias escolas e do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia. Atualmente, estão em andamento as obras de preparação do terreno. Na primeira fase, serão construídas 232 casas.

Trabalhadores também têm queixas

Para que o Porto de Paranaguá pudesse comercializar no mercado internacional 5.121.525 toneladas de soja apenas em 2010, vários funcionários tiveram que trabalhar muito. Entre eles estão 1.250 estivadores, acompanhados pelo Sindicato dos Estivadores de Paranaguá e Pontal do Paraná (Sindestiva).

O presidente da entidade, Antônio Carlos Bonzato, acredita que a comercialização poderia ser muito superior se as condições de trabalho fossem melhoradas. Bonzato está satisfeito com a atual superintendência, comandada por Mário Lobo Filho. Entretanto, como a mudança de superintendente é inevitável, Bonzato espera que o próximo comandante do porto, a ser nomeado pelo governador eleito Beto Richa no próximo ano, seja conhecido dos trabalhadores. “Esperamos que as coisas mudem e que o governador indique uma pessoa da área, com bom trânsito com os trabalhadores portuários, afinal, é ruim discutir as necessidades dos trabalhadores com quem não conhece o serviço prestado”, ressalta.

Ele alega que ouviu muitos boatos de irregularidades, principalmente com relação à dragagem, que teria sido impedida por interesses pessoais. “A dragagem já foi protelada por sete anos e até a compra da draga foi alvo de boatos. Muitas questões ainda estão sem respostas, como a parte ambiental e várias questões crônicas no tratamento com os trabalhadores e as operadoras portu,árias”, lembra.

Para melhorar o trabalho e otimizar os serviços prestados, Bonzato sugere a ampliação da faixa portuária, que está do mesmo tamanho há 35 anos. A melhora na infraestrutura também é uma necessidade dos operadores portuários. “Além disso, estamos nos últimos anos mendigando condução, porque um ponto é distante do outro no porto. Demora 40 minutos caminhando para ir do portão 4, onde entram todos os trabalhadores, até o terminal privado mais distante”, frisa.