Os consumidores lesados pelas fraudes nos postos de combustíveis, com a diferença na quantidade apontada na bomba e a efetiva entrada no tanque, dificilmente vão conseguir comprovar que foram vítimas do golpe. Por enquanto, não há maneira de determinar se, no mesmo momento em que o consumidor abastecia o veículo, os responsáveis pelos postos acionaram o dispositivo por controle remoto.
“Dificilmente, as pessoas guardam os comprovantes quando abastecem seus carros e esses são os únicos documentos que o consumidor poderia apresentar para exigir a diferença do combustível ou a devolução do dinheiro”, explica a coordenadora do Procon-PR, Claudia Silvano. “Mesmo quem tem a nota fiscal terá dificuldade em comprovar se tinha fraude naquele momento”, completa o promotor de Justiça Maximiliano Deliberador, da Promotoria de Defesa do Consumidor.
De acordo com ele, quem for abastecer deve pedir sempre nota fiscal e ainda pode solicitar para o posto fazer os testes de qualidade (para verificar se não há adulteração) e também de quantidade do combustível que sai da bomba. “A nota fiscal é o único comprovante da compra”, ressalta. Para Claudia, essa medida serve também para o consumidor se precaver em relação não somente a erros na quantidade, mas também a uma eventual adulteração do combustível.
A coordenadora do Procon ainda sugere que o consumidor procure informações sobre os postos em órgãos fiscalizadores, como o Procon, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) ou o Instituto de Pesos e Medidas do Paraná (Ipem-PR), verificando se há reclamações referentes aos estabelecimentos onde costumam abastecer. Outra medida seria fazer o controle dos quilômetros andados conforme a quantidade de combustível utilizada.
A saída para o consumidor lesado será entrar com uma ação pedindo indenização por danos morais contra os responsáveis pelos postos que tiverem a fraude comprovada. “Se for proposta uma ação civil pública e o proprietário do posto for condenado de maneira genérica, aquela pessoa que tem o comprovante pode se habilitar eventualmente, no futuro, a solicitar indenização até mesmo por danos morais”, explica Deliberador.
No entanto, o dano para o consumidor já está estabelecido, assim como a sensação de insegurança na hora de abastecer o carro. “O fato gerou uma grande insegurança aos consumidores. Ninguém tem como saber se tem ilícito. Só tem acesso às bombas pessoas credenciadas”, considera a promotora Cristina Corso Ruaro, da Promotoria de Defesa do Consumidor.
Caso seja comprovada a participação de algum posto nas fraudes, o estabelecimento pode ter que arcar com uma multa de R$ 400 a R$ 6 milhões, perante o Procon, assim como responder criminalmente na Justiça. Os resultados das fiscalizações feitas pelo Ipem-PR serão encaminhado ao Procon para que o órgão tome as medidas cabíveis.
MP-PR corre atrás de provas
Neste momento, o Ministério Público do Paraná (MP-PR) tem pressa em conseguir as provas sobre os indícios de fraude, mostrados na reportagem do Fantástico. “Evidente que se o Ministério Público tivesse esta informação antes, teria investigado e até mesmo iria atrás de um flagrante. Agora, o Ministério Público vai atrás de provas”, explica o procurador-geral de Justiça do Paraná, Olympio de Sá Sotto Maior Neto.
Apesar de já existir o video da reportagem, a gravação pode não ser utilizada como prova durante o processo. “O video vai auxiliar nas investigações e vai ser considerado no indiciamento, pois é o início de um apontamento de que o ‘cara’ é o autor. Não podemos negar que é uma prova bem grande, mas para o processo, ainda deverá ser feita uma análise se ela é válida ou não”, comenta o delegado titular da Delegacia de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor (Delcon), Jairo Estorilio.
Para o professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Jacinto de Miranda Coutinho, a reportagem não tem qualquer valor como prova e dificilmente será utilizada no processo. “Esse vídeo serve como jornalismo investigativo, mas não como prova material do crime, pois viola a esfera indivual do cidadão. Mesmo que ela assuma a autoria do crime na gravação, ela não está de acordo com a Constituição e não pode ser utilizada como prova”, ressalta.
O promotor Maximiliano Deliberador destaca ainda que o MP não tem mais o “elemento surpresa” para a obtenção de provas. “Nós temos que correr contra o tempo”, ressalta. A promotora Cristina Corso Ruaro conta que a gravação de Cleber Salazar na reportagem do programa Fantástico ocorreu em dezembro de 2011 e passou um mês até a exibição do material. “É possível que estes dispositivos já tenham sido retirados”, esclarece.
O Instituto de Pesos e Medidas do Paraná (Ipem-PR) determinou aos postos de combustíveis que não façam qualquer manutenção nas bombas sem autorização prévia. A intenção é manter as possíveis evidências de fraude até que os fiscais passem pelo menos dos 40 postos que Salazar tinha contrato de manutenção das bombas. Somente em Curitiba são 344 postos de combustíveis. Outros 220 estão localizados na Região Metropolitana.
“O único fiscal da Agência Nacional do Petróleo (ANP) aqui está de férias. Conversei com a direção da ANP e eles vão enviar um fiscal para acompanhar as fiscalizações do Ipem. Estamos tentando somar esforços, mas vai um certo tempo. O Ipem também informou que a partir do dia 20 deve ter mais pessoal”, afirma Estorilio.
Fiscalização encontra lacres rompidos
Nesta terça-feira o Ipem realizou mais uma fiscalização em dois postos, em conjunto com a Delegacia de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor (Delcon). Os estabecimentos visitados foram o Posto Flórida, localizado na Rua Deputado Joaquim José Pedrosa, no Cabral, em Curitiba e o Posto Arrancadão, na Rua 24 de Maio, em Pinhais, na Região Metropolitana.
Neste segundo local, foram encontradas diversas irregularidades referentes a rompimento de lacres do Ipem e evidências de componentes de fraude. Desta forma, o gerente do estabelecimento foi detido e levado à Delcon para prestar esclarecimentos. No entanto, foi liberado após ser interrogado, sem autuação, pois não houve caracterização de fraude, de acordo com o delegado Jairo Estorilio.
No posto Flórida, foram encontradas apenas pequenas irregularidades em relação à quantidade de combustível vendida aos consumidores, assim como já tinha acontecido em dois outros postos na segunda-feira.
Algumas das irregularidades nos postos de combustíveis de Curitiba e Região Metropolitana já tinham sido apontadas, no ano passado, pelo presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis no Paraná (Sindicombustíveis-PR), Roberto Fregonese. “Apesar de não termos conhecimento anterior sobre a técnica utilizada na fraude, sabíamos da existência de irregularidades nos volumes e adulteração de combustível”. De acordo com ele, um documento contendo essas denúncias foi encaminhado ao governador Beto Richa no ano passado “para que o novo governo tivesse conhecimento dos problemas do setor”.
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