Da desculpa do trânsito lento à reunião que durou até mais tarde no trabalho, encontrar alguém que nunca tenha dito uma mentirinha é praticamente impossível. Elas são normais, segundo especialistas, e por vezes indispensáveis no trato social. Hoje é o dia reservado às mentiras. E no 1.º de Abril, tradicionalmente, vale tudo. Do trote à galhofa, mentir vira a regra. Passada a festa, no entanto, o excesso pode tornar-se perigoso. Psicólogos e médicos fazem questão de definir limites para a brincadeira.
“O problema está na repetição diária, no uso da mentira como escape”, explica o psicólogo Dionisio Banaszewski, presidente do Conselho Regional de Psicologia. A mentira, nesse caso, tem nome. É a mitomania: mentira patológica. “As pessoas acabam acreditando em sua própria mentira. Tornam-se vítimas de uma ilusão”, diz o psicólogo, que relaciona esse tipo de procedimento as mentiras usadas pelos dependentes químicos.
Segundo Dionísio, a mentira surge ainda na infância como mecanismo necessário ao desenvolvimento da criança. Mas os pais devem ficar atentos. Encobertar o excesso de mentiras pode formar um mentiroso em potencial. “A educação deve ser para a verdade”, explica.
Histórico
O Dia da Mentira surgiu em 1564, quando Carlos IX, rei da França, determinou que o ano começasse no dia 1.º de janeiro, no que foi seguido por outros países da Europa. Antes, o ano tinha início no dia 1.º de abril, que, com a mudança, tornou-se um início de ano de mentirinha e passou a ser data específica para brincadeiras. Surgiram então os trotes (que os franceses denominavam de plaisanteries) todos os anos, como a da carta que se mandava por um portador destinada a outra pessoa, na qual se lia o seguinte: “Hoje é 1.º de abril. Mande este burro pra onde ele quiser ir.”
Uma das brincadeiras mais comuns era feita em cartas convidando amigos para assistirem ao casamento de pessoas que nem sequer se conheciam, mencionando a igreja, o dia e a hora em que seria celebrado o suposto casamento.
Jornalistas são vítimas de trotes
No mundo todo, a imprensa é uma das grande vítimas das brincadeiras de 1.º de abril. Na data, dezenas de mentiras com cara de furo de reportagem chegam às redações para desespero dos editores. O folclore de 1.º de abril traz algumas pérolas de guerras inexistentes, negócios impraticáveis e descobertas absurdas.
Se dependesse do jornal Star, de Johannesburgo, por exemplo, Moçambique hoje faria parte da África do Sul. A compra teria custado U$S 10 bilhões e foi noticiada como furo pelo matutino. As relações internacionais também foram estarrecidas pelo anúncio de guerra feito pela república russa do Djortostão ao Vaticano . O motivo teria sido a disputa pelo título de menor país da Europa. A guerra dos pequenos foi destaque do Moscow Times.
Até a seleção brasileira entrou na brincadeira de primeiro de abril. A Rádio Medi, de Tânger, no Marrocos, noticiou que o Brasil não iria participar da Copa do Mundo de 98 porque o dinheiro da viagem seria usado na luta contra as queimadas da mata amazônica. Os trotes futebolísticos também deixaram o Vietnã em festa. Com pompa, os jornais locais anunciaram a contratação de Diego Maradona para dirigir o selecionado vietnamita.