O governo do Paraná vai criar assentamentos provisórios para abrigar trabalhadores sem-terra. A medida foi anunciada ontem, pelo secretário do Trabalho, Emprego e Promoção Social, padre Roque Zimmermann, em entrevista à TVE. “O Paraná está planejando uma solução criativa, imaginosa e nova para enfrentar o problema das invasões e conflitos no campo”, anunciou.
Segundo o secretário, o governador Roberto Requião determinou a transformação de uma fazenda da Embrapa, hoje com o Iapar, em uma agrovila. A área, próxima a Ponta Grossa, acolherá trabalhadores que poderão plantar e cuidar de suas criações recebendo orientações de técnicos da Emater e Iapar e Embrapa. Segundo Padre Roque, o governo do Paraná deverá negociar com o Incra a compra de 35 mil a 50 mil hectares de terras para assentar provisoriamente trabalhadores sem-terra. Os agricultores deverão ser orientados em relação ao uso da tecnologia hoje disponível a fim de conseguir efetivar os assentamentos. “Não adianta nada colocar as pessoas em assentamentos mal concebidos”, argumentou.
Assembléia
A Assembléia Legislativa se reuniu no fim de semana para formar uma comissão de negociação das questões da terra. Estavam presentes padre Roque e deputados que participarão da comissão. A principal reivindicação do grupo é uma atitude urgente em relação a reforma agrária. O deputado estadual Artagão Junior (PMDB) está preocupado com a gravidade do problema. “Essas invasões estão ocorrendo de forma desenfreada e nenhum de nós desejamos o conflito, mas todos sabemos que é necessário por um ponto final nessa situação”, diz.
Padre Roque declarou existir 14 mil famílias acampadas e as maiores invasões estão nas cidades de Laranjeiras do Sul e Rio Bonito do Iguaçu. “A tensão de fato é grande, os donos de terra estão preocupados. Acreditamos que nos próximos dias, o Incra estará comprando terras para realizar um assentamento provisório, com infra-estrutura para as famílias”, disse. O secretário esclareceu que a Comissão de Mediação das Questões da Terra é um grupo para evitar os conflitos.
“A nossa comissão quer acabar com mortes que possam ocorrer com as questões agrárias. É necessário que a Assembléia, o governo e toda a sociedade se mobilize para melhorar a situação de 80 mil pessoas que não têm o que comer ou plantar”, relatou Padre Roque.
Ação para desarmar o campo
O secretário de Segurança, Luiz Fernando Delarazi, determinou ontem ao comando da PM uma operação pente-fino, para desarmar fazendeiros e trabalhadores sem-terra em todas as áreas de conflito, no Paraná. A ordem do secretário atende à solicitação do governador Roberto Requião, que trabalha para a resolver pacificamente os conflitos.
Delazari explicou que a medida, pela qual toda pessoa armada que não tenha o porte da arma será imediatamente detida, visa impedir que a questão fundiária no Estado derive para a violência. O secretário completou que a seqüência de invasões nas últimas semanas excitou tanto um lado quanto outro do conflito, com fazendeiros e trabalhadores armando-se para a possibilidade de confronto.
As pessoas que vêm incentivando os movimentos se armarem foram duramente criticadas pelo secretário, pois elas dificultam qualquer tentativa diálogo entre as partes envolvidas nos conflitos e mesmo com o governo. Ele acredita que sindicatos como o Sinapro (Sindicato de Produtores Rurais) acabam contribuindo para a não solução pacífica do problema, à medida que aconselha os fazendeiros a se armarem e a contratarem seguranças, também armados, para enfrentar os sem-terra.
As operações pente-fino vão cobrir todas as áreas de invasão e conflito de terras no Estado. A Secretaria da Segurança Pública, por meio das polícias Militar e Civil, já tem um levantamento da realidade dessas áreas e está preparada para desencadear a operação nos próximos dias.
Governador determina saída pacífica
A Justiça concedeu a reintegração de posse da fazenda Laranjeiras, em Rio Bonito do Iguaçu, ocupada na semana passada por cerca de mil famílias de agricultores sem-terra. Mas o governo do Estado, como tem feitos com outras ocupações, vai tentar fazer com os agricultores desocupem o local de modo pacífico. “Sabemos do sofrimento dos proprietários, mas também sabemos que os sem-terra são cidadãos e têm seus direitos”, explica padre Roque.
O Sindicato Nacional dos Produtores Rurais (Sinapro), representando os proprietários, entrou na sexta-feira passada com um pedido de prisão em flagrante, na Vara Criminal de Cidade de Rio Bonito do Iguaçu, dos sem-terra que ocupam a fazenda. O advogado do órgão, Rafael de Castro Spadutto, diz que o pedido foi baseado em diversos crimes. Entre eles, invasão de propriedade alheia, crime de dano qualificado e formação de quadrilha ou bando.
Ele explica que os proprietários tomaram esta decisão porque só no Estado são 66 mandatos de reintegração de posse expedidos e nenhuma providencia foi tomada pela PM. “A polícia alega que precisa de autorização do governador”, explica. Segundo Rafael, o juiz da Vara Criminal local afirmou que a solução da situação não competia a ele e acabou encaminhando o pedido para a delegacia da cidade. Segundo informações de um policial de plantão, o delegado da cidade ainda não tomou conhecimento do assunto
A área de 550 alqueires tem treze proprietários. Um deles é o prefeito de Rio Bonito do Iguaçu, César Bovino.
Fazenda da Monsanto pode ser desapropriada
O governador Roberto Requião anunciou ontem que estuda a desapropriação de uma fazenda da multinacional Monsanto, em Ponta Grossa. A decisão do governador foi motivada por uma reportagem publicada na edição desta semana da revista IstoÉ/Dinheiro denunciando que o grupo Monsanto ameaça confiscar a soja brasileira que tenha sido produzida pela sua tecnologia e que não tenha pago royalties. Na reportagem fica claro que, como a produção de transgênicos no Brasil é proibida, a Monsanto está confessando que contrabandeou sementes modificadas e agora quer cobrar pelo ilícito.
Requião diz que pretende transformar a fazenda em uma unidade experimental orgânica, em parceira com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e com o Movimento da Agricultura Familiar Rural.
A medida, disse o governador, reforça uma das bandeiras do MST, que está na vanguarda da luta contra os transgênicos. O MST ocupou a fazenda de 43 hectares no dia 6 de maio, uma semana depois que 800 participantes da 2.ª Jornada de Agroecologia invadiram e destruiram campos de teste de milho transgênico.
Um projeto de lei proibindo o plantio, cultivo e comércio de organismos geneticamente modificados (OGMs), proposto pelo Bloco Parlamentar da Agropecuária, está em discussão na Assembléia Legislativa.
No Paraná, o Porto de Paranaguá – maior exportador de grãos do Brasil – segue orientação do governo federal de não embarcar produtos transgênicos. A fiscalização é feita por técnicos da Claspar e do Tecpar. Tais medidas asseguram a participação significativa do Paraná, o maior produtor nacional, em mercados como a China, que pretende comprar, só neste ano, 6 milhões de toneladas do produtos no Brasil.
Pedida prisão de Requião
O Sindicato Nacional dos Produtores Rurais (Sinapro) deu entrada ontem em ação no Tribunal de Justiça do Paraná pedindo a prisão do governador Roberto Requião (PMDB) e dos comandantes geral da PM, do Policiamento do Interior e do 10.º Batalhão da PM, com sede em Ivaiporã. O sindicato argumenta que eles deixaram de cumprir ordens de prisão dos invasores e de reintegração de posse da Fazenda Três Marias, em Manoel Ribas, ocupada há um mês. Outra ação pede intervenção federal no Paraná.
O presidente do Sinapro, Narciso da Rocha Clara, disse que a decisão da entidade pretende “evitar que o pior aconteça”. “Visitei vários produtores rurais. Eles me disseram que se nenhuma dessas medidas resultarem no objetivo concreto, o cumprimento de ordens de reintegração, os proprietários vão retirar os invasores”, disse.
O assessor de imprensa do governo paranaense, Benedito Pires, disse que o governo mostra “absoluta indiferença” em relação ao pedido de prisão de autoridades, pois tem dúvidas sobre a legitimidade do Sinapro. “O que esse sindicato está fazendo é botar gasolina na fogueira”, afirmou. “Faz de tudo para que haja conflito armado.” Pires acentuou que o governo não fará o que o Sinapro quer, mas agirá com dureza em relação a fazendeiros e sem-terra armados.
Pela manhã, o governador havia afirmado que prefere negociar com as famílias de sem-terra a cumprir ordens de reintegração de posse. Ele admitiu que, em princípio, o governo deve cumpri-las, mas tem evitado usar a polícia.