Onze horas da manhã de domingo (14). Esse foi o horário que a balconista Jeinissi dos Santos chegou à Unidade de Saúde 24 horas do Campo Comprido, em Curitiba, para uma consulta de emergência. Dezesseis horas do mesmo dia: Jeinissi desistiu de esperar e foi embora porque ainda havia 52 pessoas na sua frente. Nove horas de ontem. Foi o horário que a balconista voltou à unidade de saúde para tentar atendimento novamente. E, depois de tanta espera, foi atendida às 16h30 de ontem.
O caso da balconista é semelhante ao de dezenas de pessoas que lotaram ontem os corredores da Unidade 24 horas do Campo Comprido e do Posto de Saúde Vila Machado, no Pinheirinho. Além dos transtornos de rotina, o período de férias está trazendo ainda mais problemas para os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) em Curitiba. Por causa da falta de médicos, os pacientes com casos clínicos, ou seja, que não são considerados de emergência, estão sofrendo com a demora no atendimento.
?Entre erros e azares, tudo aconteceu?. Essa foi a explicação do diretor do Sistema de Urgência de Curitiba, Matheos Chomatas, para os problemas. Segundo ele, dos quatro clínicos da Unidade do Campo Comprido, um está de férias e foi escalado erroneamente para o plantão, outro faltou e o terceiro comunicou ontem mesmo que não iria mais trabalhar porque estava assumindo outro emprego. Já na Vila Machado, dos três clínicos, um está de férias e outro pegou licença médica.
Rotina
A situação dos postos de saúde pode até ter se agravado pela falta pontual de médicos. Entretanto, quem usa o sistema de saúde garante que a demora é rotina. Os moradores do bairro Pinheirinho precisam enfrentar filas durante a madrugada para conseguir consultas no posto da Vila Machado. A situação ficou mais crítica desde o final do ano passado porque só um clínico está atendendo. Os usuários alegam ainda que não há médicos de outras especialidades. Onélia Passaroti, moradora da região, foi na semana passada até o posto de saúde, para tentar conseguir uma consulta com o clínico geral. Chegou às 5h e pegou a última das seis senhas liberadas por dia para consultas com o médico. ?Tinha muita gente na fila que acabou tendo que voltar para casa sem atendimento. Havia senhoras na fila que tentavam há três dias para conseguir a senha para a consulta?, conta.
A moradora Francielle de Almeida Valente chegou pouco depois das 4h no posto para tentar se consultar com um ginecologista. Após enfrentar a longa fila e pegar a senha, Francielle foi informada que o médico ginecologista estava de férias. ?Os funcionários do posto poderiam ao menos avisar que existem médicos que estão de férias?, relata.
Acúmulo
Já no Campo Comprido, um dos motivos para a Unidade de Saúde não conseguir desafogar o atendimento é a quantidade de pacientes que vêm de outros bairros de Curitiba que não fazem parte da área de atendimento e de cidades da Região Metropolitana, como Campo Magro e Campo Largo. A unidade está recebendo pessoas de uma região que deveria ser atendida pela Unidade 24 horas do Fazendinha, fechada para reformas desde o ano passado.
?Lá no posto da Ferraria (bairro de Campo Largo) me falaram que eu estou com suspeita de trombose e me mandaram para cá. Cheguei lá às 3h30 e saí de manhã para vir para cá?, contou o chacareiro Vilmar da Silva Oliveira às 16h de ontem, na Unidade do Campo Comprido. ?É um descaso, né??, desabafou. Mas, mesmo com dor, Vilmar não perdeu o bom-humor. ?A gente é pobre, sofre, mas se diverte?, disse, ao comentar a atitude de um homem que saiu da consulta gritando ?aleluia? para o médico por ter sido atendido.
Prefeitura anuncia reformas e contratação de médicos
Andréa Bordinhão
O diretor do Sistema de Urgência de Curitiba, Matheos Chomatas, reconhece que a estrutura física de muitos postos de saúde e unidades de atendimento está defasada e que faltam médicos. ?Os prédios são plantas saturadas. Não dão conta de dar conforto às pessoas. Mas nós não estamos nos omitindo. A Prefeitura está se esforçando?, declarou.
A reforma na Unidade do Fazendinha, assim como a construção das novas Unidades do CIC e do Cajuru, devem terminar no final de março. Tanto a unidade CIC quanto a do Fazendinha vão absorver pacientes do Campo Comprido. Além disso, com o tempo, essas unidades devem mudar de perfil e passar a atender somente casos de urgência.
A Prefeitura também vai contratar médicos. As inscrições para o concurso público estão abertas até o próximo dia 21. Serão contratados, em princípio, 218 médicos. Mas, segundo Chomatas, a Prefeitura vai ficar com um banco reserva para poder contratar à medida que precisar. Os médicos devem assumir até março.
Vila Machado e Campo Comprido
Quanto aos casos específicos de ontem no Campo Comprido, Chomatas afirmou que, assim que soube da situação, pediu que houvesse remanejamento de médicos para lá ou que se procurasse algum profissional livre que, no caso, receberia adicional. Entretanto, este médico só chegou às 17h. Das 9h às 16h (quando o médico da escala chegou), o atendimento foi feito por um único clínico.
Já na Vila Machado, quando foi questionado pela reportagem sobre a falta de ginecologista, Chomatas pediu que fosse verificada a situação. A informação que o diretor recebeu pelo telefone foi de que havia ginecologista atendendo ontem no posto.