Foto: Daniel Derevecki

Além do engordamento da praia, calçadão será recuperado.

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Depois de anos em discussão, o governo estadual anunciou na semana passada as obras de recuperação da orla de Matinhos, destruída pelas freqüentes ressacas. O projeto – que, embora esboçado, ainda não é definitivo – deve englobar o engordamento da praia com a areia retirada do Canal da Galheta, no Porto de Paranaguá, e a colocação de esporões (quebra-mares), para evitar a sedimentação. Além disso, o calçadão deve ser recuperado. O comércio, a colônia pesqueira e a Prefeitura de Matinhos vêem com bons olhos a intervenção – embora haja estudiosos que discordem da medida.

A previsão é que seja depositado na praia 1,2 milhão de metros cúbicos de areia numa extensão de seis quilômetros, entre o Balneário Riviera e a Praia Brava. A faixa de areia deve ficar com cerca de 80 a cem metros. O engordamento, porém, não virá sozinho. Junto com ele, devem ser depositados os esporões (ou headlands), pedras soltas que funcionam como uma espécie de quebra-mar, capazes de dissipar a energia das ondas e evitar que o mar leve a areia.

Também será feita a construção de canais de desemboque do Rio Matinhos e do canal da Praia Brava, de forma que a embocadura dos rios fique disposta mar adentro e isso ajude a amenizar, de quebra, a questão da poluição da praia. ?Essas soluções estão associadas e o beneficio é ter a praia de novo?, afirma o professor do curso de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Eduardo Gobbi, que participa do projeto.

Mas, a despeito do anúncio, ainda não é possível falar sobre prazos. A Administração dos Portos (Appa) já solicitou à Marinha autorização para escavar o Canal da Galheta e, se for concedida, a retirada de areia deve começar ainda em janeiro. Paralelamente, informa a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedu), à frente do projeto, serão contratados serviços de sondagem marítima e batimetria (estudo que determina o relevo no fundo do mar) para verificar como devem ser dispostos os esporões. Será contratada uma equipe para elaborar o projeto executivo das obras.

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Enquanto todo o processo de dragagem no porto leva entre quatro e cinco meses, a colocação da areia na praia deve demorar cerca de 20 a 30 dias. Nesse meio-tempo, a Sedu espera concluir também os procedimentos de autorização junto aos órgãos ambientais.

Somente após a entrega dos pareceres é que o Patrimônio da União autorizará ou não a obra. ?Nossa preocupação é com o meio ambiente e com a navegabilidade. Se as manifestações forem favoráveis, autorizamos?, afirma o gerente regional do Patrimônio da União no Paraná, Dinarte Antônio Vaz, que solicitou ainda ao governo um parecer da Capitania dos Portos. Segundo ele, porém, geralmente definições como essas levam tempo. ?São estudos complexos, tanto que a dragagem em Paranaguá é motivo de controvérsias até hoje?, aponta.

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Qualidade da areia discutida

A qualidade da areia que será utilizada para o engordamento da praia também é pauta de discussões, já que a mesma sairá dos fundos de um canal portuário. Mas de acordo com o professor Eduardo Gobbi, isso não deve ser problema. ?A areia do fundo geralmente é mais problemática, mas a da embocadura (do canal, que será utilizada) é mais limpa?, explica.

Além disso, a Appa teria procedido a estudos do material e constatado que, aparentemente, não há contaminação. De acordo com a Administração dos Portos, os excessos de areia são pesquisados conforme normas do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) e, quando livres de contaminação, estão liberados para uso na praia. A Sedu afirma ainda que toda a areia destinada a Matinhos passará por prévia analise e triagem para verificar o material a ser aproveitado.

Quem se incomoda com a dragagem são os pescadores de Paranaguá. Para o presidente da Federação das Colônias de Pescadores do Estado, Edmir Manoel Ferreira, a pescaria fica prejudicada com os constantes processos de retirada da areia do fundo da baía – o que deve ser piorado com a Galheta. ?Como os peixes ficam nos canais, mexem no solo, eles se assustam e saem?, justifica. (LM)

Engordamento traz solução rápida

Lígia Martoni

Foto: Daniel Derevecki

Antônio Cunha Neto.

O geólogo Antônio Fernandes da Cunha Neto, que já fez estudos para a região e propôs soluções como as que serão adotadas, faz algumas observações com relação à intervenção que será feita na praia de Matinhos.

Para ele, é fundamental que se verifique, ainda com relação à areia, a granometria do material proveniente da Galheta. ?Se for mais fina que a areia daqui, o mar vai levar mais rápido. Além disso, o trabalho deve ser feito seguindo ao máximo a morfologia da praia?, afirma. Segundo ele, não se pode permitir que Matinhos se torne apenas uma alternativa mais barata para a deposição da areia que obrigatoriamente deve ser tirada do canal portuário – uma vez que levá-la para alto mar é uma solução cara, afirma.

Há pouco mais de dois anos, o geólogo apresentou uma alternativa para a praia de Matinhos: tratava-se da colocação dos esporões, feitos em forma de gabiões, para segurar a areia na praia. A diferença é que, na concepção de Cunha Neto, o engordamento não precisaria ser feito, uma vez que o próprio mar daria conta de repor a areia. ?Só que isso leva tempo; já o engordamento traz soluções rápidas, mas deve obrigatoriamente ser acompanhado de intervenções que segurem a areia, caso contrário serão R$ 15 milhões (que é o valor previsto no convênio assinado entre os órgãos governamentais que participarão da obra) jogados ao mar.?

Além disso, prevê, é necessário que se faça a drenagem pluvial, para evitar que o mar forme ?canais?, a manutenção da obra (o que inclui colocação de areia de tempos em tempos) e que se observe os aspectos construtivos – já que, para o estudioso, a execução deve ser perfeita para o bom aproveitamento do trabalho. Mais uma observação é com relação ao transporte e deposição da areia – quesito no qual espera-se gastar pelo menos R$5 milhões. ?Carretas e mais carretas carregadas de areia transitando pelas ruas de Matinhos certamente irão prejudicar as vias. Por isso, é fundamental que se contemple a recuperação das vias de acesso?, alerta.

De qualquer forma, ele acredita que, da maneira como a notícia do engordamento foi colocada até agora, Matinhos pode estar diante da solução de um problema antigo. ?As intervenções da forma correta, com um projeto contemplado por estudos e levantamentos precisos, já deveriam ter sido feitas há pelo menos dez anos. Afinal, já se perdeu uma Babilônia de dinheiro nessa praia em obras que não adiantaram nada.?

Comunidade esperançosa com mudanças

O prefeito de Matinhos, Francisco Carlim dos Santos, se diz satisfeito com o anúncio e demonstra tranqüilidade com relação à manutenção da obra – que obrigatoriamente terá de ser feita, ainda que os esporões ajudem a segurar a areia. ?Como o canal da Galheta deve assorear de novo daqui a alguns anos, essa areia será trazida para cá novamente para fazer a nossa manutenção.? Para isso, já está previsto um contrato de cinco anos com possibilidade de renovação por mais cinco para a retirada da areia e a posterior colocação em Matinhos.

O presidente da Associação Comercial de Matinhos, Nelson Cotovicz, afirma que o setor está esperançoso com o anúncio. ?Com isso teremos mídia positiva; atrairá para a cidade muito mais veranistas, que aquecerão as vendas por parte do comércio local.? Aliado a isso, a valorização imobiliária também deve voltar ao município, já que há a expectativa do retorno de turistas.

Da mesma forma, o presidente da colônia de pescadores da cidade, Mário Jorge Hanek, vê com bons olhos o anúncio. ?Quando tem ressaca, a gente tem de arrastar as canoas em cima das pedras. É a solução pela qual que reivindicamos há anos?, comemora. A única ressalva é que a comunidade pesqueira tinha de ter mais participação nas discussões. ?Deveria ter sido feita uma consulta conosco, afinal a experiência dos pescadores mais antigos vale muito. Não sabemos bem como será feito o projeto e achamos que o ideal seria aliar a técnica à nossa prática?, reivindica. Os pescadores, porém, são enfáticos: ?Só vamos acreditar mesmo que vai sair quando a última pedra for colocada?, garante o pescador Guido Ramos. (LM)