Férias de início de ano, estou no jardim da casa de praia e um som diferente me chama a atenção: um pássaro piando. Mas que coisa! Um grunhido constante, insistente, chega a ser chato. Vou ver do que se trata e me surpreendo com a cena: um pássaro de cor preta é o responsável pelo piar insistente e um outro pássaro, três vezes menor de cor cinza amarelada, está a ciscar atrás de comida que dedicadamente coloca na boca do pássaro maior. Descobri! Trata-se de um filhote chupim (Molothrus bonariensis) com uma mãe corruíra (Troglodytes aedon). Durante dias vi a cena se repetindo, a pequena e dedicada corruíra mãe, dando comida na boca do insaciável filhote chupim, três vezes maior do que ela, crescendo a cada dia junto com sua fome.
Psicóloga e escritora em férias, peguei caneta e papel e não pude deixar passar a oportunidade para fazer uma analogia ao comportamento humano. Em minha mente veio a quantidade de filhos chupins na espécie humana, sobregarregando suas mães, pequenas corruíras. Bom, cabe aqui um esclarecimento sobre pássaros (ornitologia). O chupim tem por comportamento habitual jogar fora os ovos dos ninhos existentes e colocar os seus próprios para outros pássaros (tico-tico, corruíra) criarem, por isso a cena que me chamou a atenção, a pequena corruíra cuidando da criação do grandão chupim. Tá! E daí, qual a analogia ao comportamento humano? Bom, na psicologia clínica vejo constantemente filhos adultos com capacidade produtiva morando com seus pais, recebendo casa, comida à mesa, roupa lavada, conforto e utilizando o dinheiro que produzem, quando produzem, para o seu próprio deleite: sair na night, comprar carro, roupas de grife, bebidas, drogas… E em casa, se a conta de luz vem alta, não lhe diz respeito; se a empregada cobra mais pela quantidade de roupa que lava, não lhe diz respeito; se os eletrodomésticos estragam, não lhe diz respeito. E os pais? Esses já trabalharam uma vida, muitos já estão aposentados, construíram patrimônio e estão como a pequena corruíra, alimentando o ?Zé grandão do chupim? que ?não se toca? que suas asas são maiores e tem condições físicas e emocionais para alçar vôo e se sustentar. Melhor ainda, que tem condições de agregar à vida dos pais, retribuindo toda a dedicação que eles tiveram.
Então, lá vai um recado:
* Filho chupim, cria dignidade e muda a história. Cabe lembrar que maioridade não se define ao atingir 18 anos, mas sim com a capacidade de se auto-sustentar.
* Mãe corruíra, enxergue e valorize as potencialidades de seu filho e estimule a sua independência.
* Mãe e filho, é possível voar juntos atingindo grandes distâncias e vislumbrando belas paisagens! Bom vôo!
Tereza Karam
Psicóloga