O Brasil é um dos recordista de cesarianas no mundo. Enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza uma taxa ideal em torno de 15% do total desse tipo de intervenção nos partos, no País, ainda de acordo com o órgão, alguns serviços privados de saúde atingem cifras de mais de 90%. Até na rede pública brasileira as cesarianas ficam entre 30 e 40%. Contudo, algumas mulheres invertem a tendência e estão preferindo o parto natural.

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Em Curitiba, um dos maiores defensores desse método foi o médico obstetra Moysés Paciornik, que morreu na última quinta-feira, após sofrer uma parada cardíaca ao ser submetido a uma cirurgia.

Além de defender que os bebês nasçam por intervenção cirúrgica apenas quando houverem riscos para a vida da mãe ou da própria criança, ele foi um grande divulgador dos benefícios do parto de cócoras. Nele, como o próprio nome diz, as mulheres têm seus filhos acocoradas – como fazem as integrantes de tribos indígenas – e não deitadas.

“O parto normal deitado nasceu na Europa, mas não é o mais indicado à saúde da mulher, pois pode causar problemas no canal vaginal. As mulheres que passam por ele, quando estão perto da menopausa, geralmente apresentam problemas de útero e bexiga. Em contrapartida, isto não acontece com as índias, que geralmente têm dezenas de filhos sem passar por cesariana e permanecem com a saúde perfeita”, afirmou o médico durante entrevista concedida a O Estado na semana anterior ao Natal.

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Segundo Moysés, quando a gestante deita para ter o filho, seu canal vaginal se estreita em torno de 28%, o que dificulta a passagem do bebê e o obriga a forçar caminho para nascer.

Já no parto de cócoras, o períneo (região que, para as mulheres, começa na parte de baixo da vulva e vai até o ânus) vai para trás e a bexiga sobe, o que faz com que o canal de parto se alargue e o nascimento seja facilitado.

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“O parto de cócoras é menos dolorido e muito mais rápido, pois a mãe empurra a criança de maneira mais fácil. Quando comecei a divulgá-lo por aqui (no Paraná), há cerca de 30 anos, ele foi muito criticado. Porém, atualmente, está sendo cada vez mais aceito e tido seus benefícios reconhecidos”, declarou. “O parto de cócoras é muito gratificante para a mulher, pois é ela quem o realiza e não o médico. Além disso, ela vê o filho nascer, o que não acontece no parto deitado.”

Em Curitiba, no hospital público Victor Ferreira do Amaral e no particular Santa Cruz, já existem mesas de parto especiais que permitem que a mulher fique em variadas posições e não apenas deitada.

Vivência

A missionária Cynthia Palumbo, de 46 anos, vivenciou tanto a experiência de ter um filho por cesariana quanto por parto normal de cócoras. Há 26 anos, devido a algumas complicações gestacionais, ela teve seu primeiro filho por procedimento cirúrgico.

Na segunda gestação, ficou decepcionada ao ouvir de um médico que, por ter tido o primeiro bebê por cesariana, não conseguiria ter o segundo de forma natural. Foi então que ela procurou Paciornik e conseguiu fazer o parto de cócoras. Posteriormente, teve outros cinco filhos por este método, sendo o último há dez anos.

“O primeiro parto de cócoras foi um pouco difícil, mas mesmo assim bem mais tranquilo do que a cesárea. A partir do segundo, foi ficando cada vez mais rápido e fácil. Além disso, a recuperação é muito mais rápida. Nos dias seguintes à cesariana, eu mal conseguia levantar em função da dor que sentia e era mais difícil fazer as coisas, inclusive cuidar do bebê.”

Nascimento realizado em casa

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Arquivo
Paciornik: inspiração nas índias.

Outra tendência que vem tomando força no País é a dos partos caseiros. Em Florianópolis (SC), o parto domiciliar é realizado há vários anos pela equipe Hanani, coordenada pela enfermeira obstétrica Vânia Sorgatto Collaço.

“As mulheres que buscam ter seus filhos em casa geralmente têm um conhecimento maior do próprio corpo e acreditam que hospital é para quem está doente.

Gestação não é doença”, analisa Vânia. Podem realizar o parto domiciliar todas as mulheres com gestação de baixo risco. Contudo, obstetras mais ortodoxos não recomendam a técnica, afirmando que, por mais que a gestação seja tranquila, no hospital, pode-se evitar problemas eventuais.

Vânia rebate dizendo que só ocorrem imprevistos em 3% dos casos e, quando acontecem, há tempo hábil de encaminhar a gestante para uma instituição hospitalar. “Contamos com todo um suporte para fazer os encaminhamentos e com o apoio de um obstetra para a realização de pré-natais.

Além disso, temos equipamentos de oxigênio e reanimação, mas dificilmente eles precisam ser utilizados.” Os partos domiciliares são feitos de cócoras, na água, de lado, de joelhos ou genu peitoral (quando a mulher se utiliza dos braços e das pernas para se apoiar). Segundo Vânia, ter o bebê em casa faz com que a mulher se sinta mais acolhida e em um ambiente mais harmônico.

Com isso, há menos medo, o parto é menos dolorido e mais rápido. A terapeuta holística Jayanti Di Bari, moradora da capital de Santa Catarina, tem quatro filhos. Todos nasceram de forma natural, sendo os três últimos em casa.

Destes, um nasceu de parto de cócoras, outro de genu peitoral e o último de parto de cócoras na água. “É totalmente diferente ter filhos em casa e no hospital. Nos partos domiciliares, me senti muito mais acolhida e tranquila.

No hospital, embora a equipe tenha sido prestativa, fiquei durante horas deitada em uma cama e sentindo muita dor, sujeita às regras e aos mecanismos da instituição. Senti maior ansiedade e preocupação. Além disso, não tive tanto contato com a criança após o nascimento quanto tive em casa.”

Em Curitiba, o médico obstetra Carlos Miner Navarro, integrante da diretoria da Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Paraná, apoia o parto domiciliar e já chegou a realizá-lo. Entretanto, reforça que não são todas as mulheres que podem passar pelo procedimento.

“O parto domiciliar está ligado à humanização do parto. Porém, ele não é indicado, por exemplo, a mulheres hipertensas, diabéticas e que morem longe de hospitais, sendo difícil removê-las ou à criança em caso de emergência”, informa.