O presidente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, esteve ontem em Curitiba participando do encontro estadual que está sendo realizado esta semana em comemoração aos 20 anos de criação do movimento. Ele conversou com os militantes sobre as conjunturas econômica e política nacionais. Além disso, Stédile falou sobre a reforma agrária no País, ao lado do professor da Universidade de São Paulo, Plínio de Arruda Sampaio, um dos responsáveis pela elaboração do Plano Nacional de Reforma Agrária do governo Lula. A palestra aos integrantes do movimento aconteceu a portas fechadas.
Stédile destaca que o MST está negociando com o governo federal desde o final do ano passado sobre reforma. A proposta inicial do movimento era de assentar um milhão de famílias até 2007, mas durante as negociações, foi aceita a condição de assentar 400 mil famílias em três anos. “Estamos dando prioridade às famílias acampadas. Outras 130 mil receberam crédito fundiário, o que não consideramos reforma agrária”, conta Stédile.
O presidente do MST defende a mobilização popular para tentar alcançar o objetivo de desapropriar latifúndios improdutivos, conforme manda a lei. “Todo mundo sabe disso, mas sem mobilização a lei não é cumprida. Nenhuma família foi assentada no Brasil sem que houvesse pressão popular”, avalia Stédile.
O professor Plínio de Arruda Sampaio também acredita que a reforma agrária só será cumprida com o povo nas ruas pressionando o governo. “O presidente Lula é refém da situação. Ele quer fazer a reforma agrária, mas também não pode gastar mais do que tem. Não adianta só o MST ir para as ruas. A Central Única dos Trabalhadores (CUT), os funcionários públicos, precisam fazer um movimento tipo as Diretas Já”, comenta um dos responsáveis pelo plano de reforma agrária.
De acordo com o presidente nacional do MST, o governo federal é um grande aliado e o MST está esperando a implantação do Plano Nacional de Reforma Agrária o mais rápido possível.
A invasão de propriedades é a técnica utilizada pelo MST desde a sua criação para pressionar o governo sobre os assentamentos. Stédile disse que as ocupações não são planejadas nacionalmente. “Cada grupo é autônomo e define se invade ou não conforme as necessidades”, aponta. Os locais mais propensos para isso são aqueles onde há pobreza no campo e concentração elevada de latifúndios, de acordo com o presidente do MST. “Enquanto houver pobres na zona rural, seguiremos com o nosso movimento”, declara.
Abril Vermelho
O projeto chamado Abril Vermelho, em que seriam feitas várias invasões simultâneas no Brasil, na verdade está relacionado com a luta pela terra, e não uma ação nacional de ocupações, de acordo com Stédile. “Uma lei sancionada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso decreta que o dia 17 de abril é o Dia Nacional da Luta pela Reforma Agrária, lembrando os mortos no conflito em Eldorado dos Carajás (Pará). Nós só estamos cumprindo a lei”, conta.
Na avaliação de Stédile, no Paraná existem muitas pessoas sem terra e uma concentração relativamente grande de latifúndios, principalmente na região Noroeste do Estado, onde há pecuária extensiva. “Nós poderíamos fazer uma grande reforma agrária no Paraná”, afirma. Segundo o presidente do MST, o governo estadual sempre foi um aliado na luta pela terra.
Fazenda Bom Jesus não pode ser desapropriada
A Fazenda Bom Jesus, no município de Guaraqueçaba, litoral do Estado, de propriedade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), foi invadida por cerca de dez famílias no último final de semana. O local, com 6 mil hectares, é uma Área de Preservação Ambiental (APA) e não pode ser utilizada para reforma agrária. No mês de março as mesmas famílias já tinham ocupado a fazenda, sendo retiradas mediante ordem judicial.
Conforme o gerente executivo do Ibama no Paraná, Marino Elígio Gonçalves, a fazenda havia sido entregue à União como pagamento de dívida em 1999. “Ela foi repassada ao Ibama que pretende fazer de lá uma unidade de desenvolvimento e pesquisa de sementes e mudas de boa qualidade genética da Mata Atlântica”, explicou, reiterando que em hipótese alguma a área pode servir para reforma agrária.
Gonçalves destacou que em março as mesmas famílias invadiram a fazenda. “Conseguimos o mandado de reintegração de posse junto à Justiça e eles saíram sem muitos problemas. Só que agora retornaram. Vamos dar o prazo de no máximo 48 horas para que eles saiam, caso contrário vamos comunicar às autoridades competentes”, avisou o gerente. Ele disse que uma equipe de técnicos do Ibama está tentando negociar com os invasores uma saída pacífica. “A Mata Atlântica é muito importante devido a sua biodiversidade, daí a importância de seu estudo”, relatou. Gonçalves destacou que os invasores são pessoas independentes, não ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).