Movimento Social Negro do Paraná

Através da missiva abaixo reproduzida, na íntegra, o Grupo Paulo Pimentel, em seus veículos online, manifesta sua estima a todas as etnias que compõem o povo brasileiro. Em especial, neste episódio, aos negros e movimentos regionais, na sua totalidade.

Respeito e democracia devem pautar o caminho diário trilhado por todos os meios de comunicação, com necessárias correções. Discriminação racial é um dos pontos a serem combatidos, cotidianamente, sem prejuízo da liberdade de expressão. É, também, nossa missão.

Carta resposta do Movimento Social Negro do Paraná ao Jornal Paraná Online sobre racismo nos meios de comunicação: “a charge do almoço com o Obama e o macaco”

As organizações do Movimento Social Negro do Paraná e as organizações antirracismo, citadas abaixo, manifestam seu repúdio ao Paraná Online pela divulgação de uma charge publicada no dia 19 de março de 2011, praticamente às vésperas do Dia Internacional de combate a Discriminação Racial: “almoço com Obama terá baião de dois, picanha, sorvete de graviola …. e banana, muita banana”. Para ilustrar as frases acima foi escolhido o desenho de “um único macaco” com orelhas grandes e a mão direita na boca.

Observa-se que a charge enfatiza símbolos regionais do nordeste brasileiro (culinária). O que faz um macaco (um animal) entre os símbolos do almoço como o primeiro presidente negro dos EUA, Barack Obama? Qual simbologia tem um animal neste contexto?

A charge incita preconceitos, discriminação, racismo, reforça estereótipos e estigmas sobre a população negra quando ao se referir a Obama, o presidente dos Estados Unidos, que é negro, preferiu um único macaco. Se o almoço é com Obama, seria na charge o macaco a representação de Obama? Por que um macaco? Obama se parece com um macaco? As pessoas que estariam no almoço com Obama se parecem com macacos? Os negros se parecem como macacos? Macacos são humanos? Se há muitas bananas é porque haverá muitos negros no almoço? Ou haverá macacos? Negros são macacos? Qual é a justificativa para esta charge ao se referir ao presidente dos EUA que é negro?

Incitar a discriminação racial no Brasil é crime. A Lei Nº 12.288, de 20 de julho de 2010 institui o Estatuto da Igualdade Racial mantendo a Lei 7716/1989 que no seu artigo 20 diz:

“Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa.

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

Art. 64. O § 3o do art. 20 da Lei no 7.716, de 1989, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IIII – Pena: A interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores.

A população negra (pretos e pardos) no Brasil, todos sabem, tem sofrido um processo cruel de desigualdade social e simbólica nos diversos espaços sociais. Carece de medidas emergenciais de reparação pelos mais de 350 anos de escravismo criminoso e pelas diferenças de tratamento dispensadas a esta população quando comparada a população branca (IBGE, 2008).

Contudo, para além dos indicares de vulnerabilidade, a população negra tem sofrido ao longo dos anos um perfil de racismo à brasileira que vitimiza os indivíduos a partir da “aparência”. Ou seja, as principais vítimas do preconceito racial, discriminação racial e o racismo no Brasil são aqueles que apresentam fenótipo (aparência) negro.

Assim, no Brasil, ao longo da história muitos estigmas e estereótipos foram construídos em torno da aparência dos negros para consubstanciar as diferenças (marcas de diferenciação). Estes estereótipos também são traduzidos em processos de “desumanização” do negro, identificado com animais. Sendo assim, não é novidade para ninguém que nas relações sociais no Brasil em situação de dominação de um grupo sobre o outro e de menosprezo, o negro é associado ao macaco.

Nas piadas racistas, nos jogos de futebol, e ainda nas escolas, crianças negras são xingadas de “macaco”. A única comparação possível de seres humanos é com os próprios seres humanos e não com animais.

Para este chargista que vive na sociedade brasileira e paranaense, não há lapso ou inocência em representar o almoço do presidente dos Estados Unidos, um homem negro, utilizando a ilustração de um macaco quando negros no Brasil são associados pejorativamente com tal animal. Os meios de comunicação conhecem a importância dos símbolos na comunicação das ideias. Cabe a pergunta: “Por que não foi escolhido o símbolo da águia, símbolo oficial dos EUA?”. Se a intenção era representar a “República das Bananas, não bastava um único cacho de bananas?” Por que um macaco? O que mesmo fazia um macaco ali no centro do desenho?

A discussão que se faz necessária é a naturalização do racismo na sociedade brasileira e o papel dos meios de comunicação, que devem ter responsabilidade enquanto formador de opinião, na garantia da liberdade e no compromisso da construção de uma sociedade justa e igualitária.

Para nós negros do Movimento Social Negro do Paraná não foi um deslize do chargista, e sim mais um exemplo da ideologia fortemente marcada na sociedade brasileira que é da naturalização das formas de preconceito, discriminação e racismo em relação a população negra.

 

Curitiba 27 de março de 2011

Assinam esta carta:

ACNAP- Associação Cultural de Negritude de Ação Popular

IPAD Brasil – Instituto de Pesquisa da Afrodescendência

IDDEHA- Instituto de Defesa dos Direitos Humanos

Mandato do Dep. Federal Dr. Rosinha

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