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Motoristas do Paraná prestes a perder CNH por pontos escapam de punição após nova lei

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No último dia 12 de abril entrou em vigor a lei 14.071/2020 que alterou alguns artigos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Essa mudança na lei, associada à Resolução 844 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), publicada em 9 de abril de 2021, fez com que quase metade dos motoristas infratores que corriam o risco de terem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) suspensa ou cassada no Paraná fossem anistiados de forma automática.

Isso porque houve uma mudança no sistema de pontuação atribuído aos condutores quando esses cometem alguma infração de trânsito. Antes da nova lei, quem acumulasse 20 ou mais pontos em 12 meses, independentemente da gravidade da infração cometida, teria a CNH suspensa. As regras mudaram, e agora essa pontuação só suspenderá a CNH se houver duas ou mais infrações gravíssimas no mesmo período.

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Caso o motorista tenha apenas uma infração gravíssima, o limite sobe para 30 pontos. Caso não tenha cometido nenhuma infração gravíssima dentro dos 12 meses, o condutor só terá a CNH suspensa se acumular 40 pontos ou mais. Este mesmo limite máximo é estendido também para os motoristas profissionais, que, diferentemente dos outros, podem cometer até cinco infrações gravíssimas, como ultrapassar em faixa contínua, dirigir embriagado ou avançar o sinal vermelho.

A resolução do Contran determina que os novos limites valem não só para os novos processos de suspensão e cassação, mas também para as infrações cometidas antes de 12 de abril. Dessa forma, engloba processos que ainda estão em fase de julgamento, de apresentação de recursos e que ainda não foram concluídos. Na prática, dos mais de 155 mil processos abertos no Detran-PR desde 2019, mais de 72 mil foram arquivados por força da legislação retroativa, por ainda estarem em fase de apresentação de recursos.

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A coordenadora de Infrações de Trânsito do Detran-PR, Marli Batagini, disse em entrevista à Gazeta do Povo que tanto a lei quanto a resolução vêm sendo cumpridas em sua totalidade no Paraná, mas apresentou uma reflexão sobre a mudança provocada pelos textos legais. De acordo com Marli, a alteração anterior – feita em novembro de 2016 e que ampliou o período de suspensão da carteira de um para seis meses – havia dado início a uma pequena mudança na mentalidade dos motoristas. O temor agora é que isso seja perdido.

“O legislador teria sido mais eficiente se tivesse dito na própria lei que essas mudanças se aplicariam a partir do dia 12 de abril, e não retroagir até o início dos tempos. Esse condutor que teve a sua suspensão arquivada, será que ele conseguiu internalizar que precisa refletir quando está na direção de um veículo? Uma pessoa que avançou três vezes o sinal vermelho a partir do dia 12 de abril cumprirá o período de suspensão de seis meses da carteira de habilitação. No entanto, se uma outra pessoa cometeu essas mesmas infrações no dia 11 de abril, mas exerce atividade remunerada, acabou tendo sua suspensão arquivada. É uma reflexão que eu faço, isso é correto? Houve uma educação desse motorista ou o legislador acabou por passar a mão na cabeça desse motorista que cometeu infrações de extrema gravidade?”, questionou.

Celso Mariano, engenheiro e ex-diretor de Educação da Secretaria de Trânsito de Curitiba (Setran), compartilha do mesmo entendimento. Apesar de classificar como preocupante a situação ocorrida no Paraná, ele estima que a anistia aos motoristas infratores tenha sido ainda maior em outros estados. “Muitos Detrans simplesmente não divulgam esses dados, sobre quantos processos havia e quantos foram arquivados. Muitas vezes não respondem porque não têm esses números”, apontou.

Para o especialista, a medida “fatalmente funciona como um desestímulo para quem cumpre as regras”. Segundo ele, o limite anterior podia não ser o modelo mais eficaz, mas “era o único freio que nós tínhamos”. “Pode haver a argumentação de que a legislação estava rigorosa demais. Não é verdade. Quando se autoriza alguém a conduzir um veículo, há aí um risco potencial inegável. Não dá para deixar qualquer um fazer isso, é um perigo. E não é só uma questão de dirigir um carro, mas de como se dirige o veículo. Qualquer um tem o potencial de aprender. Agora, dirigir com responsabilidade exige um outro conjunto de demandas”, avaliou.

Para David Duarte Lima, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Segurança no Trânsito, as novas mudanças podem ajudar a alimentar um círculo vicioso que existe na relação dos brasileiros com o trânsito. Segundo ele, sem uma punição rigorosa aos infratores, a sensação que fica é de que “a lei não vale na prática”.

“A gente muda a lei e muda o código de trânsito muitas vezes. A fiscalização no trânsito é uma peneira, deixa passar muita coisa. Há um sentimento de impunidade. Com essa mudança legislativa, afrouxou-se ainda mais a lei, e isso retroalimenta toda essa questão do sentimento de impunidade. Esse sentimento de que é possível não ser alcançado pela lei gera mais infrações, e infrações muitas vezes de alto risco, e que acabam gerando mais acidentes. Não se pune esses infratores, e por não serem punidas, as pessoas cometem mais infrações. Com mais infrações, temos mais acidentes. Esses acidentes não são punidos, e entra-se de novo nesse ciclo”, argumenta.

“A lei de trânsito tem que ter uma punição suficientemente forte para inibir o cometimento da infração. Mas se não há a fiscalização e o sentimento de que ‘posso fazer qualquer coisa de errado porque a polícia nunca passa por aqui’ prevalece, então a lei não vale na prática”, afirmou.

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