Menos habitantes, mais recursos

Dos 399 municípios do Paraná, 109, ou 38%, foram criados entre 1980 e 2001. O resultado são cidades com populações minúsculas. Em 222 delas (55%) o número de habitantes é inferior a 10 mil pessoas. 108 (27%) têm menos de 5 mil moradores, de acordo com estimativas do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes). O cientista político e professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fabricio Tomio, aponta o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) como um dos principais motivadores para o desmembramento das cidades em municípios menores.  

O caso de Ivaiporã ilustra bem essa situação. Entre 1995 e 1999, a cidade foi desmembrada e dela surgiram outras duas: Ariranha do Ivaí, com população estimada, em 2006, de 2.530 habitantes e Arapuã, com 3.519 moradores no mesmo ano. Com a criação desses dois municípios, a mesma população passou a ter acesso a uma quantia maior do FPM. Se Ivaiporã ainda congregasse as duas cidades, estaria com população estimada de 34.713 habitantes e teria recebido, em abril, cerca de R$ 615.625.10. No entanto, com o dinheiro que agora é destinado às duas outras cidades, o valor que a região recebe pulou para R$ 1.019.237,74.

O prefeito de Arapuã, Deodato Matias, comemora. Enquanto era distrito de Ivaiporã, o local não contava com médico. Hoje são três, além de ter atendimento de emergência, exames e remédios. A vida dos estudantes também melhorou. Apenas dois ônibus buscavam os alunos na zona rural. Agora são dez veículos. Quando chovia, chegar ou sair da cidade também era um problema. Com os recursos do FPM, as vias foram cascalhadas e o escoamento da safra garantido.

Apesar das melhorias, sobram despesas com a folha de pagamento. O orçamento previsto para este ano é de R$ 6,4 milhões: R$ 2,8 milhão oriundos do FPM e outra boa parte de convênios com o governo estadual. Desse montante, 42% vai para pagar a folha de pagamento municipal, ou seja, R$ 2,688 milhões. A Câmara Municipal, que possui nove vereadores e faz sessões uma vez por semana, recebe anualmente R$ 180 mil. As despesas poderiam ser ainda maiores, mas o Legislativo funciona junto à Prefeitura, que banca outros gastos.

O prefeito de Ariranha do Ivaí, Silvio Gabriel Petrassi, também diz que depois do desmembramento a vida da população melhorou. Para conseguir uma consulta médica era necessário sair de casa às 3h e ir até Ivaiporã. Agora a cidade tem três profissionais. Como em Arapuã, o acesso à escola e a qualidade do ensino melhoraram, além das estradas. Porém, boa parte do orçamento anual, de R$ 5,4 milhões, também fica com a folha de pagamento: 44%, o que corresponde a R$ 2,376 milhões. Só a Câmara Municipal leva R$ 330 mil. Mensalmente, os nove vereadores recebem R$ 27,5 mil por sessões realizadas uma vez por semana. Ivaiporã, que tem cerca de 30 mil habitantes, também tem enormes gastos com a folha de pagamento. Só para a Câmara Municipal, que tem nove vereadores, são destinados, mensalmente, até R$ 92 mil.

Quem ganha e quem perde com o processo?

Para o cientista político e professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fabricio Tomio, o processo de criação de novas cidades tem o seu lado positivo, mas também problemas. Por um lado, o dinheiro acaba chegando a lugares remotos e mudando diretamente a vida de localidades pequenas. Por outro, os demais municípios da unidade federativa perdem recursos uma vez que o montante enviado ao estado continua sempre igual.

Outro ponto negativo são as despesas administrativas que as pequenas cidades acabam tendo. Fabrício explica que o problema ocorre porque a Constituição brasileira trata todos os municípios como iguais. Ambas precisam ter um Executivo e um Legislativo. No entanto, o professor defende a adoção de modelos alternativos, como a criação de conselhos gestores para cidades menores.

Dessa forma não haveria gastos com prefeitos, secretários e muito menos com a Câmara de Vereadores. Os conselheiros poderiam ser eleitos pela sociedade, sem remuneração, e juntos decidiriam o que seria feito. Ele explica que nestas localidades não há muito dinheiro e o trabalho se restringe à administração da saúde, educação, agricultura e manutenção das estradas. Um profissional formado em administração daria conta de todo o trabalho.

Fragmentação ainda aguarda regulamentação

O processo de criação dos municípios se acelerou na década de 1940, com a criação de um fundo para distribuir recursos federais para os municípios. Hoje é o chamado Fundo de Participação dos Municípios (FPM). As pequenas cidades passaram então a não depender apenas de uma renda própria para sobreviver. Entre 1950 e 1960, os estados também passaram a estimular a proliferação das pequenas cidades: quanto mais municípios, mais renda entraria no Estado.

Em 1967, o regime militar criou uma lei definindo critérios mais rígidos para a criação de novas cidades, freando a proliferação de novos municípios. Antes, cada Estado tinha sua própria legislação. A Constituição de 1988 devolveu a autonomia aos estados.

Na época, a arrecadação do FPM passou de 5% do Imposto de Renda e do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) para 22,5%. Essas duas situações voltaram a estimular a criação de novas cidades. Surgiram municípios com menos de mil eleitores. A briga dos estados por mais recursos só acabou depois que o governo estabeleceu um valor fixo para cada unidade da Federação.

Hoje os estados também não têm mais autonomia para criar novas cidades. O processo de fragmentação municipal voltou a ser regido por lei federal, que ainda não foi regulamentada.

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