Hoje é o dia nacional de combate ao abuso e à exploração sexual contra crianças e adolescentes. Só o Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, atendeu, em 2004, 165 casos de violência sexual contra crianças de até 12 anos de idade. Para a psicóloga que acompanha o serviço dentro da instituição, Daniela Prestes, os números mostram apenas uma parte do problema. Muitos casos ainda não são denunciados.
Entre os tipos de violência, a sexual é a que tem sido registrada com mais freqüência. No Pequeno Príncipe, no ano passado, foram 241 casos, sendo 68% deles de abuso sexual. Em segundo lugar ficou a agressão física, com 39, em terceiro a agressão psicológica, com 23, e negligência, 14.
Os números assustam porque não correspondem à realidade, já que muitos casos não chegam a ser denunciados. Uma das razões disto pode ser o fato de que os principais agressores se encontram no ambiente intra-familiar.
Dados do Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítima de Exploração Sexual e Maus Tratos (Nucria), criado em 2004 no Estado, revelaram que, nos casos de estupro, o padrasto é o denunciado na maioria dos registros (31%), seguido pelo vizinho (22%), colega (17%), namorado (13%), pai (9%), tio (4%) e empregado (4%). Já nos casos de atentado violento ao pudor, o pai é a figura mais denunciada, seguida por tio, desconhecido, vizinho, padrasto, avô, empregado e mãe.
Apesar de a situação ainda ser preocupante, as autoridades vem trabalhando para combater o problema. Em 2002 foi criada em Curitiba uma rede de proteção envolvendo a escola, postos de saúde, conselhos tutelares e outras instituições que prestam atendimento a crianças e adolescentes. Quando uma denúncia é feita, a criança é encaminhada para um posto de saúde e em seguida para o Hospital Pequeno Príncipe, que concentra o atendimento de todos os casos.
As crianças maiores de 12 anos são encaminhadas para o Hospital de Clínicas. Nos dois locais elas são atendidas por equipe multidisciplinar que inclui médicos, psicólogos, assistentes sociais.
No entanto, este ano Daniela conta que houve uma redução no número de atendimentos. Existem algumas suposições para explicar a situação. Uma delas seria o fato de os agressores estarem se controlando porque sabem da ação. Outra explicação não é nada animadora: os casos não estão sendo denunciados.
A diretora da Rede de Proteção da Fundação de Ação Social de Curitiba, Ana Maria Machado, acredita que muitos deles não chegam ao conhecimento da rede. É preciso que a sociedade fique mais atenta. Ela explica que as crianças e adolescentes dão sinais de que algo está errado.
Trabalho em conjunto
O trabalho de enfrentamento aos casos de abuso, violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes no estado foi elogiado pelo coordenador do Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil e representante da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Pedro Américo Furtado Oliveira. Ele participou ontem da reunião do governador, Roberto Requião, com o secretariado, onde fez uma palestra sobre o assunto. Durante o encontro Requião prometeu recursos para ampliar a área.
Oliveira chegou a propor uma parceria entre a OIT e o governo do Estado para cooperar com as ações que vêm sendo realizadas no combate ao trabalho infantil. Ele destacou como modelo o trabalho que vem sendo realizado na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina. ?Pela primeira vez um governo do Estado compromete recursos do orçamento para a execução de políticas públicas nessa área?, comentou. ?Isso vai mostrar para outros estados e países limítrofes o empenho no enfrentamento ao trabalho infantil?, acrescentou.
O plano de combate à violência apresenta um trabalho integrado de órgãos e secretarias de estado, Ministério Público, Judiciário e organizações não governamentais (ONGs), que adotam um conjunto de ações articuladas para intervir técnica, política e financeiramente no enfrentamento das diversas modalidades de violência e do abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes.
Segundo Oliveira, hoje o Brasil é um dos poucos países em desenvolvimento a praticar as normas da convenção 182 da OIT, que visa eliminar a exploração infantil, em consonância com a legislação nacional, que permite o trabalho a partir dos 16 anos de idade. As ações adotadas no Brasil foram responsáveis pela redução de 40% do trabalho infantil. Em 2002, havia 8,4 milhões de crianças ocupadas e atualmente 5,1 milhões de crianças ainda trabalham.