Carimbar, furar o papel e passar de um responsável a outro não contribui em nada para o andamento de um processo judicial, que pode levar de uma semana a um mês para ser distribuído.
Mas toda essa burocracia chega a ocupar até 70% do tempo de um processo na Justiça Federal, o que ratifica as reclamações da morosidade de uma decisão judicial.
Isso sem contar nos gastos que a Justiça tem com papel, grampo, tinta e outros. Só no ano passado, foram R$ 20 milhões no Tribunal Regional da 4.ª Região (TRF4), que abrange os estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
E tudo isso reflete no acúmulo de processos registrados, por exemplo, nas Varas de Justiça do Paraná, onde ingressam mais processos do que a capacidade para atender a demanda. Em 2009, entraram 213.060 processos novos, enquanto 171.595 foram encerrados.
Para tentar reduzir essa diferença, o TRF4 está implantando um sistema de processo eletrônico, o e-proc. A partir do mês que vem, todos os novos processos vão entrar por meio eletrônico. “Isso deve ter uma redução drástica do tempo de tramitação do processo”, afirma o juiz federal Gerson Luiz Rocha.
Com a informatização vai ser possível saber quanto um processo custa aos cofres públicos, valor que hoje não se tem ideia. Daqui a dois anos, a possibilidade de se digitalizar os processos mais antigos que sobrarem voltará a ser discutida.
“O advogado vai fazer a petição e colocar diretamente no sistema, aguardando o despacho do juiz. Sem contar que os servidores da Justiça vão poder ser realocados, por exemplo, do atendimento ao público, que praticamente vai desaparecer, já que a pessoa vai verificar o andamento do processo de casa, para funções nos atos efetivos de movimentação dos processos”, explica Rocha.
Motivos
Cerca de 80% dos processos que entram nos juizados são matéria previdenciária. Como as pessoas não conseguem o benefício via administrativa, elas recorrem à Justiça, o que, para o juiz federal, é um dos reflexos da grande desigualdade social do Brasil.
Aliado a esse fator, o juiz destaca que o grande número de processos é consequência de uma nova perspectiva do Direito. “Os direitos humanos foram contemplados com a Constituição de 1988 e as pessoas estão descobrindo os seus direitos. O Executivo não atende aos anseios e isso deságua no Judiciário, a última instância para resolver os problemas, o que é muito presente aqui na região sul”, aponta.
Para contornar a demora no julgamento dos processos, o juiz federal cita o cumprimento de 90% da meta 2 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo TRF4, no ano passado, o que representa 27.935 processos. A meta previa o julgamento de todos os processos distribuídos até 31 de dezembro de 2005.
Outro ponto destacado é o plano de gestão estratégica da instituição, de 2009, que determina a padronização de procedimentos que podem aumentar a agilidade, ao trazer boas práticas de uma determinada unidade para uma rotina padrão da Justiça. “Até hoje a Justiça tem uma grande dificuldade de autoconhecimento. O que cada unidade está fazendo de bom fica restrito àquele local”, demonstra o juiz federal.
NÚMEROS DA JUSTIÇA
Processos na Justiça Federal do Paraná em 2009
Distribuídos: 213.060
Baixados: 171.595
Sentenciados: 145.096
Conclusos para sentença: 15.969
Em tramitação: 273.553
Em movimento: 511.364
Processos no Tribunal de Justiça do Paraná em 2009
* Em primeiro grau de jurisdição:
Ações novas distribuídas: 1.069.679
Em andamento: 2.760.462
Suspensos ou arquivados sem baixa: 277.887 ,
Arquivados com baixa: 992.433
Desarquivados: 173.445
Julgados: 721.074
* Em segundo grau de jurisdição:
Distribuídos: 117.600
Julgados: 119.745
Solução é dada em quatro anos
O tempo médio de duração de um processo no Brasil, englobados todos os graus de jurisdição (do seu início até o final e esgotada a via recursal), gira em torno de quatro anos.
No Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), em primeiro grau de jurisdição, também é possível verificar uma defasagem entre os processos em andamento (mais de 2,7 milhões) e as ações novas distribuídas (mais de 1 milhão) com os processos julgados em 2009 (pouco mais de 721 mil), o que é justificado pelo “excesso de volume de serviço”.
Já em segundo grau de jurisdição, o número de julgamentos (mais de 119 mil) foi superior ao de feitos distribuídos (117,6 mil). Para efeito de comparação, na Justiça de São Paulo foram recebidos mais de 5,4 milhões de novos processos em 2009 e mais de 5,3 milhões de sentenças, uma diferença de menos de 100 mil.
O TJ-PR defende-se ao afirmar que processos paralisados por falta de impulso processual em tempo oportuno são exceções no âmbito da Justiça paranaense, conforme informações repassadas esta semana por e-mail à reportagem de O Estado.
“Efetivamente existem processos com trâmite processual em suspenso e as causas estão elencadas na legislação, dentre as quais requerimento das partes, morte ou perda de capacidade processual, ausência de defensor, não realização de prova técnica por falta de profissional, não localização de testemunhas, não realização de diligências por inércia dos interessados, dificuldades na materialização de citações e intimações”, admite o tribunal.
No fim do ano passado, o corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, criticou a carência de varas na justiça estadual do Paraná. Em resposta,
o TJ-PR informou que as varas criadas pelo Código de Organização e Divisão Judiciárias de 2003 “ainda não foram instaladas na sua integralidade
em razão de limitações financeiro-orçamentárias”.
O concurso em andamento para os cargos de analista e técnico judiciário podem contribuir para amenizar essa situação. “A carência de varas já foi detectada pelo TJ, o qual tem adotado as medidas possíveis e viáveis para a solução, instalando dentro de suas possibilidades varas onde existe a necessidade, o que também ocorrerá neste ano de 2010”, diz o tribunal. O aumento de servidores, o combate à cultura do litígio, incremento à conciliação e reforma da legislação são também soluções para a morosidade processual. (LC)