O juiz federal Danilo Pereira Junior assumiu semana passada a direção do Foro da Justiça Federal (JF) do Paraná. Especialista em Direito Tributário, o juiz já atuou na 1.ª Vara Criminal de Curitiba e também exerceu a corregedoria da Penitenciária Federal de Catanduvas. Entre suas metas estão o aprimoramento dos investimentos em informática e de todos os mecanismos que oferecem mais celeridade aos processos (como mutirões, por exemplo) e proporcionar mais acesso de todo cidadão ao Poder Judiciário. Pereira Junior critica alguns órgãos da administração pública que não resolvem os problemas dos servidores, os quais acabam indo parar na Justiça, e se mostra preocupado com o aumento da criminalidade.
O Estado – Qual o primeiro assunto que o senhor quer resolver, agora que é o diretor do Foro?
Danilo Pereira Junior – Nossa primeira tarefa é definir estratégia para o cumprimento da meta dois do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Paraná, que é o julgamento das ações que foram distribuídas até 31 de dezembro de 2005. Estamos fazendo levantamento destes processos, que no Paraná são cerca de 1,6 mil. Mutirão, redistribuição, convocação de juízes que estejam em situação mais cômoda e que se disponham a prestar esse auxílio.
OE – Quais as dificuldades que o senhor espera enfrentar na JF? Sabemos que há o problema da falta de pessoal e de magistrados. Sem falar no acúmulo de processos, que hoje são mais de 400 mil no Paraná.
DPJ – Nossa maior dificuldade é a questão de pessoal. Não só de servidores, mas também juízes. Não obstante os investimentos que têm sido feitos no tribunal, hoje não há vagas, nosso quadro está completo. E a Justiça cresceu demais. A própria informática, foco de nossos investimentos aqui na JF, permite o maior acesso a ela. Hoje o cidadão não precisa de advogado para recorrer ao Juizado. Isso tem proporcionado um incremento nas ações.
OE – O que está sendo feito para tentar resolver essa situação?
DPJ – Um exemplo: as turmas recursais dos juizados especiais recebem em média 500 processos por mês. Então a capacidade de julgar, por mais que o juiz trabalhe todos os dias, é impossível. Procuramos fazer programas de auxílio de juízes de varas mais confortáveis, para que eles profiram sentenças em outras varas. Temos um quadro qualificado de servidores, mas eles acabam fazendo outros concursos, saem, há rotatividade. A partir do momento em que você oferece mais acesso ao juizado – atendemos em média cem pessoas por dia -, aumenta o número de ações. Também criamos a central de atendimento, procuramos fazer convênios com faculdades, com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), para conseguir advogados voluntários. Mas temos outro problema. Neste país quase toda questão é judicializada, principalmente com a administração pública. O poder público tem que mudar de comportamento. A administração pública, quando lesa o cidadão, deve solucionar isso, e nós vemos cada vez mais a administração dessas questões (ser feita) pelo Poder Judiciário.
OE – A maior parte dos processos que tramitam na JF hoje é dos Juizados Especiais. Qual a situação do local hoje?
DPJ – Com a abertura dos juizados em 2002, passamos a observar que de 50% a 60% das demandas ajuizadas na Justiça Federal são de competência do juizado. As varas recursais recebem quase a mesma quantidade de processos que vão ao tribunal para julgamento. Mas lá são 24 desembargadores divididos em turmas e aqui são duas turmas com três juízes em cada uma delas. O que ocorre é que a lei que criou os juizados não criou estrutura para eles. Então os tribunais aproveitaram as estruturas já existentes e fizeram uma adequação. Por isso a nossa reivindicação (e esperança) no momento é o projeto que cria 230 varas federais (que está tramitando no Senado)., O projeto prevê a destinação de 10% dos cargos que devem ser criados para a lotação desses locais.
OE – Talvez seja por isso que a Justiça é tão lenta. Como o senhor vê essa constatação tão antiga da sociedade?
DPJ – A morosidade do Judiciário virou quase que um mito difícil de ser derrubado. Mas nós temos vários exemplos de justiça rápida. Quando os juizados começaram a funcionar havia processos que eram julgados em 50, 60 dias. Existem processos hoje, dependendo da vara, cujas sentenças saem em um tempo curto. As próprias conciliações têm produzido resultado de uma justiça mais célere. Mas temos que lembrar que a justiça tem, em alguns momentos, o seu tempo para amadurecer o julgamento. Outro problema é que nem sempre as partes do processo têm interesse na produção de uma justiça célere. O processo eletrônico, por exemplo, surge quando o próprio tribunal faz levantamento e percebe que 60% do tempo do processo fica parado no cartório, tempo de burocracia, expedições de ofício, etc. Com o processo eletrônico isso reduziu; ele foi concebido com um organograma de processos que evita movimentações incompatíveis com a sua natureza.
OE – Quantas varas a mais precisariam ser criadas para deixar a JF em uma situação mais confortável?
DPJ – Existe um projeto de criação de 230 varas no País. Mas a nossa carência no Paraná seria de seis a sete varas. O urgente seria isso, não o ideal. No Juizado Especial seriam necessárias pelo menos mais duas (hoje são quatro, mas cada uma tem em torno de 12 mil processos, um número muito expressivo). Deveria haver a criação de uma vara em Guaíra. A cidade é um problema de segurança pública. Não seria uma mera instalação de vara, é uma preocupação com a criminalidade. Com a concentração da fiscalização em Foz do Iguaçu, percebemos uma migração das ocorrências para Guaíra. Nossa fronteira com o Paraguai é o que leva ao abastecimento de todo o País de armamento e drogas. Infelizmente há notícias de células do PCC no Paraná, e isso fragiliza a segurança no Estado.
OE – Quais os tipos de crimes que mais preocupam a JF hoje, não pelo volume, mas pela gravidade? Quais têm crescido mais?
DPJ – A JF atua no crime organizado, na lavagem de dinheiro, nos crimes tributários, tráfico de armas, em alguns crimes praticados pela internet. Mas o crime organizado é o que mais nos chama a atenção, pelo seu preparo, sua inteligência, sua sofisticação. Nós, da região Sul, não vivíamos com isso antes, mas agora é uma realidade frequente. Temos verificado uma considerável apreensão de armas, de tráfico de entorpecentes, principalmente no oeste do Paraná. Com relação aos mais frequentes, houve uma época em que os mais expressivos eram os crimes contra a ordem tributária. Hoje são os crimes de lavagem de dinheiro que aumentam, os crimes de servidor público, infelizmente. Particularmente, o que mais me preocupa é o tráfico de entorpecentes e o tráfico de armas.
OE – Há situações em que o próprio sistema burocrático da Justiça não ajuda. Mas como o senhor avalia a crise do Judiciário, a maneira como a sociedade vê este poder?
DPJ – Temos um sistema recursal extremamente garantista, e que impede muitas vezes que as decisões tenham rapidez. Então também precisamos mudar paradigmas, buscar dar mais credibilidade às decisões dos juízes de primeiro grau. Ou a gente acredita nos juízes, ou temos que repensar o sistema, repensar a forma de recrutamento desses juízes. Pelo sistema de recursos que nós temos, as decisões judiciais de primeiro grau, em regra, têm pouco valor. E isso gera toda essa situação, principalmente no crime, essa sensação de impunidade. O que precisamos é uma mudança de cultura, mudança de alguns procedimentos e de colaboração dessas partes envolvidas no processo. O nosso Código de Processo foi concebido para relações simples, em que ,existem um autor e um réu, mas para relações mais complexas há consequências processuais maiores.