O juiz federal Eduardo Appio, da 3.ª Vara Federal de Cascavel, concedeu liminar anteontem ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), autorizando o instituto a ocupar a Fazenda Rio das Cobras, da empresa Araupel, no município de Quedas do Iguaçu, no Sudoeste do Estado, e adotar as medidas necessárias ao início do assentamento das 2 mil famílias acampadas no local.

O juiz, acompanhado da procuradora da República Camila Ganthous, realizou inspeção anteontem à tarde nas terras do imóvel – que totalizam 59.376 hectares, avaliados em R$ 200 milhões. A fazenda é considerada a maior gleba existente no País em processo de regularização de terras ocupadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Appio também determinou a produção de nova prova pericial.

A decisão de inspecionar a fazenda foi tomada pelo juiz depois da audiência de conciliação entre o Incra e a Araupel, realizada no dia 5. Pelas benfeitorias existentes no local, o Incra ofereceu R$ 75 milhões, valor aceito pela empresa. O Ministério Público Federal (MPF), no entanto, discordou do valor apresentado.

Plano

Segundo o superintendente do Incra no Paraná, Celso Lisboa de Lacerda, a partir de agora, um Plano de Desenvolvimento de Assentamentos (PDA) será elaborado e desenvolvido por um grupo de agrônomos terceirizados pelo instituto, juntamente com as famílias do local. As ações que serão implantadas no assentamento sairão desse planejamento.

Todos os integrantes do MST serão cadastrados e as famílias que não se encaixam no perfil do assentamento terão que deixar a área de 25 mil hectares. “A situação de cada família será analisada e aos poucos o assentamento será realizado. Se tivermos condições de assentar somente 1.500 famílias, 500 terão que ser retiradas. Temos um prazo de um ano para definir essas questões e concluir os trabalhos”, explicou.

Nulidade do título

O Incra ingressou na Justiça Federal no dia 24 de setembro com ação ordinária requerendo a declaração de nulidade do título de propriedade da Araupel. O Incra alega que a fazenda, situada em terras da União, nunca poderia ser titulada pelo Estado do Paraná em favor de particulares, ou seja, o Estado não poderia ter iniciado o assentamento, já no início do século passado. Enquanto não fosse legalizada a posse em favor do Incra, o órgão não poderia realizar qualquer tipo de providência para o assentamento das famílias acampadas, algumas há mais de cinco anos no local.

Durante a inspeção, o juiz federal percorreu 50 km dentro da gleba e observou que há dois acampamentos instalados, ambos com presença de crianças e idosos – um deles fixou-se na região em 1999 e outro em 2003. Há escola em funcionamento, com assistência da Prefeitura de Quedas do Iguaçu. O governo do Paraná oferece cestas básicas e assistência à saúde, além de professores e material escolar. As condições de moradia e alimentação, porém, são precárias. Há trabalhadores do movimento que guarnecem as entradas e saídas dos acampamentos. Ainda de acordo com o juiz federal, somente a regularização da posse da área, com a conseqüente implementação dos projetos de assentamento, permitirá a preservação ambiental da região, bem como a realização de obras de infra-estrutura pelo governo federal.

Conforme despacho do juiz Eduardo Appio, “o regime atual no qual os cidadãos brasileiros que lá se encontram aguardando uma solução política para este importante problema ofende, sob meu ponto de vista, o princípio da dignidade da pessoa humana, pois lhes submete a um regime provisório, que, em alguns casos, já ultrapassa cinco anos”. Segundo o juiz, a discussão dos valores das benfeitorias não impedirá que o Incra inicie imediatamente o assentamento das famílias no local.

A reportagem de O Estado entrou em contato com a empresa Araupel, com sede em Porto Alegre, mas não encontrou os responsáveis que poderiam falar sobre o assunto.

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