Foto: Clipping News |
Joanir Pereira move uma ação contra uma empresa. continua após a publicidade |
Foi polêmica a repercussão do adiamento de uma audiência em Cascavel, oeste do Estado, na semana passada, porque uma das partes, o trabalhador rural Joanir Pereira, foi para o Fórum usando chinelo de dedos. A decisão em adiar a sessão por 60 dias foi do juiz Bento Luiz de Azambuja Moreira, da 3.ª Vara do Trabalho do município. O magistrado justificou o cancelamento alegando que o calçado era ?incompatível com a dignidade do Poder Judiciário?. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional Paraná, repudiou o ato, bem como a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) também se manifestou exigindo explicações do juiz e, agora, o advogado de Joanir pretende mover uma ação indenizatória.
A audiência de conciliação fazia parte de um processo trabalhista movido pelo trabalhador rural, que está desempregado, contra a empresa Madeiras J. Bresolin. O advogado dele, Olímpio Marcelo Picoli, conta que todas as partes compareceram à sessão e, ao entrar na sala, o juiz olhou para o reclamante da ação e pediu que deixasse o local. ?Em seguida, ele disse que a audiência não ia acontecer. Num primeiro momento achei que era por algum problema processual. Foi quando ele informou que o motivo eram os chinelos?, lembra. O advogado diz que tentou persuadir o magistrado a não adiar a audiência, informando que aquela era a melhor roupa que seu cliente possuía. ?Disse ainda que ele estava desempregado, passando necessidade?.
Em vista da perplexidade dos presentes, Picoli conta que o juiz chegou a mencionar que doaria sapatos para que Joanir fosse à nova audiência. ?Ele informou que isso ia constar em ata, mas voltou atrás, dizendo que poderia ter outra interpretação?. De acordo com o advogado, quando informado do motivo do adiamento, Joanir, que não tem outros sapatos além dos chinelos – teria ficado indignado com a atitude do juiz. ?Estou acertando detalhes para entrar com uma ação indenizatória?, adianta o advogado.
Repúdio
A OAB-PR emitiu nota repudiando a atitude do juiz. ?Num país tropical como o Brasil, uma decisão como essa no âmbito da Justiça é absurda?, disse o presidente do órgão, Alberto de Paula Machado.
A Anamatra também lamentou o ocorrido. Segundo o presidente da entidade, Cláudio Montesso, ?não se pode considerar que a roupa do trabalhador, muitas vezes a única que possui, atenta contra a dignidade da Justiça?.
O juiz foi procurado pela reportagem para comentar o assunto, mas não atendeu ao telefonema.
Empresário doa trinta pares de sapatos
O caso de Joanir Pereira comoveu Marias, Josés e Joões Brasil afora. Mas um José da Silva, em especial, fabricante de calçados da cidade goiana de Caldas Novas, deu um passo além da comoção, ontem, ao ler a notícia pela internet: decidiu doar trinta pares de sapatos para o Fórum de Cascavel. O motivo ele tem na ponta da língua. ?Acho que todo cidadão brasileiro que tem o mínimo de senso de responsabilidade deveria ajudar de alguma forma o Poder Judiciário e o País a resolver suas questões?, enfatiza.
Sem se eximir de responsabilidade sobre o ocorrido, ele tem opinião firme quanto à decisão do juiz. ?É o mesmo que acho do nosso Brasil. Não tem mais condição de ser uma nação, não tem leis, nem respeito com seu cidadão. Temo que com uma decisão dessas o Judiciário até incite a pessoa ao roubo pela necessidade?, desabafa.
A doação será remetida nominalmente ao juiz para que conceda os pares às pessoas que não tiverem sapatos ?adeqüados? para entrar na sala de audiências. ?O bom senso da vara trabalhista vai repassar para quem precisa, de forma que casos como este não aconteçam novamente?.
No entanto, no que depender do TRT, o caso não se repetirá mais, nem que os sapatos não venham. Ontem, o órgão informou que o assunto já virou objeto de representação e que o juiz terá de dar explicações à Corregedoria Regional do Trabalho da 9.ª Região. Informou, ainda, que ?já há orientação para que o magistrado se abstenha de exigir vestuários especiais dos trabalhadores, uma vez que não há determinação legal para isso?, e que ?já há recomendação para que o juiz antecipe a audiência que foi adiada por esse motivo?.