Hanseníase não exige mais isolamento

Faz 56 anos, mas Joenize Dias não esquece de um dos dias mais tristes de sua vida. Emociona-se até hoje ao falar sobre o assunto. Quando tinha apenas 17 anos, seu pai a levou ao Hospital São Roque, em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba.

Ela se despediu dele e entrou no lugar onde deveria se tratar de hanseníase. Entre idas e vindas, Joenize passou anos e anos dentro do hospital. É uma das 30 pessoas que ainda vivem dentro da unidade, que hoje não trata apenas de hanseníase, mas também de outras doenças demartológicas. No entanto, por muito tempo, o Hospital São Roque abrigou pessoas que eram banidas da sociedade por causa da hanseníase.

O Hospital São Roque foi criado em 20 de outubro de 1926 para o isolamento das pessoas com lepra, como a henseníase era conhecida na época. Joenize não parou lá porque sua família não a queria mais.

Os parentes acharam melhor ir para o hospital para que ficasse boa logo. Mas este não foi o destino de muitos pacientes, que até chegavam de trem pertinho do hospital. Um vagão trazia as pessoas doentes.

Quando o trem parava, o vagão dos passageiros sadios era fechado, para que não houvesse qualquer tipo de contato. Ainda há gente no hospital que chegou desta maneira.

São histórias tristes de gente que sofre até hoje com o estigma em torno da doença, apesar dos avanços e de um conhecimento melhor sobre o que realmente acontece com quem é infectado pela bactéria que ocasiona a doença.

Para Joenize, hoje com 73 anos, tudo começou com caroços pelo corpo. Depois, a sensibilidade das pernas diminuiu bastante e ela sofreu uma queimadura ao ficar muito tempo perto do fogão à lenha, esperando a água esquentar para a mãe fazer um parto onde morava, perto do Jandaia do Sul, na região norte do Paraná. Até hoje o ferimento dá trabalho.

“Eu digo que tenho duas famílias. Uma lá fora e uma aqui no hospital. Da minha família, eu não posso reclamar. Mas do desprezo dos outros… Só Deus sabe o que eu passei”, afirma Joenize, que optou por ficar no hospital por achar que ali teria mais condições de saúde do que ficar em casa.

O Hospital São Roque não é um lugar triste por causa das histórias das pessoas que vivem ou já passaram por ali. O ambiente alegre, sadio e de convivência entre pacientes e internados fica evidente para quem é de fora.

Atualmente o hospital abriga os asilares (quem mora lá) e pacientes “rotativos”, que vão até lá, se tratam e vão embora. A capacidade é de 128 leitos. Mas chegou a abrigar 1,2 mil pessoas quando funcionava como área de isolamento. Teve até gente que se casou lá dentro, como a própria Joenize.

“Era algo parecido como uma cidade. Tinha delegacia, prefeitura, correios. Os que estavam em condições mais precárias ficavam no hospital. Os outros ficavam em casas”, comenta Mara Lúcia Gomes Dissenha, diretora administrativa do Hospital São Roque, que hoje trata mais de outras doenças ou complicações em pessoas que tem a hanseníase. A enfermidade pode ser tratada em qualquer unidade básica de saúde. Não há necessidade de encaminhamento para local específico.

De acordo com ela, o estigma da hanseníase permanece na sociedade. O mesmo fala Elisabeth Thadeo Sens, chefe da divisão de doenças endêmicas e prevalentes da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). Hoje em dia, não há mais tantos casos de comprometimento e feridas nos hansenianos.

O tratamento com medicamentos específicos e as orientações para que não se chegue a este ponto ajudam. No ano passado, foram registrados 1.165 casos de hanseníase no Paraná.

Deste total, 11% tinham já algum grau de incapacidade. Este é um dos motivos para procurar um médico o quanto antes. No último dia 25 foi lembrado o Dia Estadual de Conscientização sobre Hanseníase.

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