A edição do dia 1º de abril de 1964, uma quarta-feira, não deixava margem para dúvidas: a crise política se agravava. A manchete do dia era: “Rebelião em Minas”.
A seguir vários títulos secundários, todos com destaque para o assunto palpitante: “Prontidão militar no Estado para manutenção da ordem”, “General Mourão abre a revolta”, “Levante em São Paulo”, “Lacerda decreta feriado e controla situação na Guanabara”.
Ao lado do título do jornal, um pequeno aviso: “Aulas suspensas hoje e amanhã”. E no pé da página: “Bispos do Paraná vão lançar proclamação contra perigo comunista que ameaça o País”.
O que parecia ser o começo de uma guerra civil virou fumaça no dia seguinte. O presidente João Goulart fugiu, o golpe se consolidou no dia 1º de abril. A coluna Triboladas mandou bala.
No dia 31 de março Dartagnan escreveu para a edição do dia seguinte: “Por hoje chega. Agora, democraticamente, vou dormir. Talvez acorde numa ditadura… e duro, porque os bancos vão fechar hoje”.
No dia seguinte, ao perceber que tudo tinha acabado, ele não deixou de fazer piada: “Só no Brasil é que acontecem estas coisas, justamente no dia 1º de abril”. Oficialmente, para se livrar de gozações eternas, os autores do golpe – ou revolução, como preferem outros – recuaram a data histórica para 31 de março.
Ainda como hoje, 1º de abril era o Dia da Mentira, quando todos faziam piadas e pegadas, mas naquele tempo a tradição era muito forte. E não compensava correr riscos de sofrer gozações.
No dia 1º de abril o Palácio do Planalto já tinha outro ocupante, como atesta a manchete da Tribuna do dia 2 de abril de 1964: “Mazzili empossado na presidência da República”.
Ranieri Mazzili era o presidente da Câmara dos Deputados. No dia seguinte, 3 de abril, a manchete era: “Jango desapareceu”. “As torres de controle dos aeroportos de três países sul americanos se mantinham em expectativa, aguardando possível chegada do avião que conduz o sr. João Goulart.
Notícias desencontradas e sem confirmação, adiantavam que o ex-presidente do Brasil se dirigia para exílio no Paraguai, talvez para o Uruguai, ou ainda para a Argentina. Goulart viaja em um avião Coronado, com capacidade de combustível para doze horas de voo”. Sem presidente, não tinha reação. Acabou-se tudo.
Longa crise política
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General Mourão Filho botou tanques nas ruas e precipitou o golpe. |
Foi assim que terminou a longa crise política brasileira iniciada em 24 de agosto de 1961, quando o presidente Jânio Quadros, eleito seis meses antes com a maior votação jamais destinada a um político no Brasil, resolveu renunciar e não explicou direito a ninguém os motivos.
Jânio deixou o comando da Nação para o vice João Goulart, que nem estava no Brasil: estava na China. Parece piada, mas é verdade. E para voltar ao Brasil e assumir o poder, Jango, como também era conhecido, teve de aceitar a imposição do parlamentarismo: ia virar presidente, mas não ia mandar em nada.
Este sistema, que estreou em setembro de 1961, também não domou as crises crônicas. Em janeiro de 1963, um plebiscito devolveu a presidência com poderes plenos para João Goulart, o que serviu apenas para radicalizar o quadro político: de um lado a esquerda pedia reformas de base, entre elas a reforma agrária; de outro os conservadores, incluindo amplos setores da igreja católica e do exército, morriam de medo do comunismo, cujos seguidores defendiam as reformas.
Os militares e governadores recalcitrantes, como Carlos Lacerda (Rio) e Magalhães Pinto (Minas), conspiravam, mas ninguém ia em frente. Até um general que não era dos mais notáveis, Olímpio Mourão Filho, se encher da lengalenga e botar os tanques nas ruas.
Mourão tinha passado integralista – movimento fascista brasileiro. Mas foi criticado até por aliados como Magalhães Pinto, pela precipitação. Ele ligou para todo mundo e disse, no dia 31 de março daquele ano: “Minhas tropas estão nas ruas”.
Ele deslocou tropas com poucas armas, poucos recursos e de forma atabalhoada para Juiz de Fora e Rio de Janeiro. Podia causar banho de sangue. Mas deu certo. Indagado porque foi tão precipitado, Mourão Filho declarou: “Em matéria de política sou uma vaca fardada”.
