Mais de cinco décadas depois do início do êxodo rural no Brasil, os motivos para o fenômeno continuam os mesmos. A falta de incentivo financeiro e de infra-estrutura para o pequeno trabalhador faz com que ele desista de tentar a vida no campo.
Segundo Jelson Oliveira, secretário executivo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o ápice do êxodo rural aconteceu na década de 1970, com a industrialização e urbanização do País. No início do século XX, 20% da população vivia nas cidades e 80% no campo. Cem anos depois, essa porcentagem foi invertida: 20% das pessoas estão na zona rural e o restante nos grandes centros. “Atualmente o êxodo é menor do que em outros momentos da história brasileira, mas ele continua acontecendo”, aponta. Como exemplo, Oliveira destaca a industrialização do Paraná nos últimos oito anos, que atraiu muitas pessoas do interior para a Região Metropolitana de Curitiba.
Ele afirma que os migrantes, percebendo as precárias condições de sobrevivência nas cidades, iniciaram a volta ao campo na década de 1980 com várias organizações, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), criado em 1984: “Somente no Paraná, 15 mil famílias estão em acampamentos querendo voltar para o campo, apesar da falta de uma boa política de incentivo agrícola”.
Para o secretário, os motivos para o êxodo atual são os mesmos que caracterizaram o início do fenômeno: “Há um preconceito no campo, principalmente entre os jovens, basicamente quem mais sai da zona rural e vai para a urbana”, avalia. “No campo existe o regime patriarcal, e na cidade há a ilusão de mais liberdade. O jovem, motivado por questões culturais, sai de um lugar que pensa ser atrasado e de trabalho pesado para um que parece ser mais fácil e com mais oportunidades”.
A migração acontece também pela falta de uma política agrícola que proporcione uma boa infra-estrutura e crédito para os trabalhadores rurais. De acordo com o integrante da CPT, estradas, habitação adequada e educação adaptada ao pequeno produtor podem fazer uma grande diferença na hora de partir ou ficar no campo. Outra solução é a reforma agrária ampla e integral, que mude a estrutura existente nos dias de hoje: “A reforma precisa garantir empregos e descentralizar o desenvolvimento, que leva progresso, e dê garantias para se ficar no campo”, opina Oliveira.
Família
O incentivo à agricultura familiar pode ser a saída para diminuir drasticamente o êxodo rural, segundo Nilton Bezerra Guedes, engenheiro agrônomo e assessor da Superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra): “A agricultura familiar é indispensável. Necessita-se de uma política de crédito para o custeio da lavoura e uma assistência técnica decente, dentro de um plano regional de desenvolvimento”.
Guedes afirma que não se pode pensar apenas em agricultura de subsistência em propriedades separadas. Elas precisam se modernizar para uma empresa familiar, que tira os alimentos necessários para a sobrevivência, mas também transforma a produção e consegue lugar no mercado. “As regiões precisam de equilíbrio nas forças e de organização. Uma agricultura familiar moderna, visando também ao mercado, precisa transformar o produto para agregar mais renda”, conta o assessor. Ele acredita que não adianta fazer reforma agrária sem dar sustentabilidade: “O pequeno produtor sempre esteve desprotegido dos altos juros, do preço mínimo de venda de seus produtos e do aumento dos insumos agrícolas”.
Expulsos
Para Guedes, o êxodo também é causado pela expulsão da terra feita pelo sistema financeiro, com o leilão das propriedades. O pequeno produtor faz um financiamento para arcar com os custos da lavoura, mas não consegue pagá-lo: “A falta de incentivo é histórica e para corrigir demora mais tempo. Mas em algumas regiões já há um avanço”. De acordo com ele, foram investidos no ano passado R$ 5,4 bilhões, repassados pelo Programa Nacional de Agricultura Familiar do governo federal.