"O Brasil é um país de fibra". Com essa afirmação, o professor Eloy Casagrande Júnior, da Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR), defende a utilização de fibras naturais em substituição às fibras sintéticas, o que traria crescimento econômico e, principalmente, diminuiria os impactos ambientais causados por produtos da cadeia produtiva do petróleo, por exemplo.
Para o professor, a mais rica biodiversidade do mundo, a brasileira, tem de ser usada em favor do seu povo. "O investimento em uma cadeia produtiva de fibras naturais é a chave para o desenvolvimento sustentável, uma alternativa para os homens do campo e uma ferramenta a mais para a geração de empregos", afirma.
O professor cita as fibras do bambu, vime, sisal, cana-de-açúcar, bananeira e carnaúba como matéria-prima não só para o artesanato, mas também para a indústria, como a de móveis, a alimentícia e, até, a automotiva. "O bambu era considerado uma praga, que crescia facilmente em meio às plantações. É muito barato e facilmente renovável, sua utilização poderia diminuir, e muito, o extrativismo da madeira", comentou, lembrando que enquanto o ciclo do pinus dura dez, doze anos, o bambu leva, em média, três anos para poder ser colhido.
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Matéria-prima não somente para o artesanato, mas para a indústria. |
A UTFPR também vem desenvolvendo pesquisas para criar o laminado de bambu, uma placa, tipo compensado, que poderá ser utilizado na construção e na indústria de móveis. Outra matéria-prima cujas fibras já são bastante usadas na indústria, principalmente de móveis, é o vime.
Para discutir o uso das fibras vegetais na indústria, a UTFPR promoveu, na última semana, o 1.º Fórum Paranaense de Fibras Naturais, em que acadêmicos, artesãos e empresários reuniram-se para discutir estratégias e projetos sobre fibra natural, levando em conta as questões sociais, ambientais e econômicas, ou seja, "o tripé do desenvolvimento sustentável", segundo Casagrande Jr.
Para ele, o ponto alto do fórum foi a palestra da arquiteta Mônica Smits, especialista na economia chinesa, com o tema O bambu e o desenvolvimento econômico na China. O professor revelou que, na palestra, Mônica explicou como o maior produtor de bambu no mundo montou uma base de desenvolvimento com a exploração em toda a Ásia. Neste continente, o bambu é responsável por cerca de um bilhão de postos de trabalho. "Eles fizeram com o bambu o que o Brasil faz com a madeira. Mas lá, os impactos ambientais são infinitamente menores", destacou Casagrande.
Para Eloy, o Brasil ainda está engatinhando para ter uma cadeia produtiva de bambu, ou qualquer outra fibra natural. Para isso, ainda falta tecnologia, projetos de design e incentivo ao plantio das matérias-primas, que, para o professor, seria o primeiro passo. "Por que não instruir o agricultor que, além da soja, do milho e dos hortifruti ele também pode produzir bambu, vime, etc.?", diz. "Aos poucos estamos avançando, mas ainda estamos limitados ao artesanato e a algumas empresas pioneiras na responsabilidade social", completa Eloy.
Artesãos desenvolvem vários produtos
Foto: Ciciro Back/O Estado |
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Maria: "Como uma terapia". |
Enquanto o Brasil ainda não tem estrutura adequada para a utilização das fibras em larga escala, são os artesãos os que mais aproveitam esses recursos, baratos e abundantes para prover seu sustento. Enfeites de fibra de coco, móveis e produtos de jardinagem feitos de bambu têm agradado, cada vez mais, os consumidores que freqüentam feiras de artesanato.
E o artesanato pode servir como fonte de renda alternativa para moradores de zonas rurais. Em Fazenda Rio Grande, por exemplo, a Comunidade Nossa Senhora das Graças aproveitou a abundância de bambu na região para transformá-lo em gerador de renda para as famílias locais.
Duas vezes por semana, cerca de 15 pessoas se reúnem nos fundos da capela para produzir móveis, luminárias, suportes para vasos de flores, produtos de decoração, e até troféus. "No começo do ano recebemos uma encomenda de um banco para confeccionar os troféus de um importante prêmio que ele iria entregar", contou, entusiasmado, o fundador da comunidade, Fkaru Sato.
Sato contou que o projeto, em parceira com a UTFPR, a qual enviou professores e estudantes para instruir os novos artesãos, é uma grande oportunidade. "Ninguém se sustenta apenas com o que produz aqui. Mas aos poucos estamos crescendo e, em breve, isso deve virar nossa profissão", ressaltou.
A dona de casa Maria Solange Sinja contou que, com o que ganha com o artesanato, não precisa mais pedir dinheiro para o marido para comprar alguma roupa, ir ao salão de beleza, entre outros caprichos. "Além do lucro e de aprender uma coisa nova, ainda serve como uma terapia. Dois dias na semana eu deixo de lado os afazeres domésticos e venho aqui me distrair".
Além de atender a encomendas, a comunidade está expondo seus trabalhos todos os sábados, no Ceasa.
Indústria internacional observa novo mercado
Foto: Ciciro Back/O Estado |
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No Brasil, setor ainda é pouco explorado, mas deve ganhar espaço com interesse do exterior. |
Mais resistentes, mais baratas, atóxicas e biodegradáveis, as fibras vegetais estão sendo vistas com bons olhos pela indústria internacional, principalmente a de autopeças. Muitas das marcas mais famosas de veículos já utilizam, há bastante tempo, a fibra do coco no estofamento dos bancos de seus carros.
Mas em Quatro Barras, também na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), há uma empresa empregando as fibras vegetais em outros projetos. "Já estamos vendendo o porta-pacotes (tampão do porta-malas) fabricado com fibra de sisal, coco, juta e curauá. Há ainda outros três projetos em fase de protótipo", disse o engenheiro Vaner Rosa de Andrade, da Tréves, que quis manter sigilo sobre os outros projetos.
Vaner explicou que as fibras naturais não são usadas no seu estado original, sendo combinadas com componentes sintéticos, como o polipropileno, o que resulta em um material misto bem mais resistente. Segundo o engenheiro, a indústria automotiva mundial caminha para, um dia, produzir veículos com todos os componentes recicláveis ou biodegradáveis.
