Feirinha opõe artesanato e muamba

Já virou chavão dizer que a Feirinha do Largo da Ordem é a praia dos curitibanos. Com 34 anos de tradição, a feira é ponto de encontro de quem mora na cidade e cartão de visita para quem vem de fora, recebendo mais de 1,5 mil pessoas por domingo. O lugar ficou famoso por reunir artesãos e suas produções originais. Pelo menos, costumava ser assim.

Hoje a coisa mudou de figura. A feira está inchada, quem chega depois de certo horário mal consegue andar entre as barracas e, os produtos que antes eram originais, hoje estão misturados a bugigangas trazidas do Paraguai e produtos "típicos artesanais", vindos direto da 25 de Março – famosa rua de São Paulo de onde saem a maior parte das quinquilharias e falsificações vendidas Brasil afora.

Preocupada com a perda contínua de caracterização da Feira, a Prefeitura de Curitiba resolveu tomar uma providência. Tirou a administração da Feirinha da Fundação de Ação Social (FAS) e passou para os cuidados da recém-criada Secretaria Municipal de Turismo.

De acordo com o secretário Luiz de Carvalho, hoje a Feira do Largo é uma "balbúrdia". "Isso é resultado do abandono. Por cinco anos, os feirantes ficaram sem qualquer atenção. Com isso, a feira perdeu o foco. Hoje a gente encontra muito produto industrializado e, em contra partida, tem mais de 300 artesãos esperando uma oportunidade", disse.

A nova administração da Feira já começa a operar esta semana. Todos os 1,2 mil feirantes terão de se recadastrar na Secretaria de Turismo. A Prefeitura quer saber o tipo de produto vendido por cada barraca, quem é o artista responsável por cada uma delas. Depois disso, será feita uma espécie de setorização da feira, com diversas linhas de artesanato. Com isso, Carvalho espera focar o evento no artista paranaense e tornar o passeio mais agradável. "Essa reformulação vai demandar tempo e por isso não temos prazo fixo para terminar. Mas até o fim do ano, a feira vai estar de cara nova. E o curitibano que for passear no Largo ou levar um amigo que veio de fora, não terá mais que ficar disputando espaço para circular", garante o secretário.

A mudança também vai permitir que outros feirantes ganhem barracas na Feira. O pre requisito será a produção de artigos de qualidade essencialmente artesanais. Carvalho assegura que os feirantes que hoje vendem produtos não artesanais, não perderão seus pontos. "Eles terão de se adequar", explica.

Artesãos demonstram preocupação

Os artistas que expõem na feira sentem com a desvirtuação do lugar. Paulo Antunes é artesão e há 25 anos expõe seus produtos numa feirinha do largo. Ele aproveita o coco verde, que os visitantes tomam e depois jogam fora, para fazer seus produtos. Ao todo, ele usa 30 itens do coco para isso. ?Nesse tempo todo que eu estou aqui, a feira aumentou bastante e apareceu muita coisa que não é artesanal?, afirma.

Antunes diz estar otimista com as propostas de mudanças anunciadas pela prefeitura. ?O real interesse na feira sempre foi pelos produtos de arte feitos. Tem que resgatar isso porque hoje há uma avalanche de produtos ditos artesanais mas que vêm da 25 de Março?, diz.

Até quem cresceu indo passear na feira aos domingos já percebe as mudanças. A dona de casa Cláudia Arruda evita ir ao largo da Ordem aos domingos. Além do movimento grande e do empurra-empurra que se forma em função do pouco espaço para circular, desagrada Cláudia o fato de que a essência artesanal se perdeu. ?Quando quero comprar algo que só existe aqui, acordo bem cedo e chego praticamente com os feirantes. Assim não me incomodo, compro o que eu quero e tomo meu café da manhã: pastel. E acho que é uma das poucas coisas da essência da feira que ainda sobraram?, diz.

Mas há outros que não notam a alteração no comportamento. Para Vitalina Scariote, que trabalha há 12 anos na feirinha, não existe uma diferença nitida de comercialização. ?Eu mesmo pinto meu material, assim como outros companheiros da feira?.

Pastel

João Pinheiro se orgulha de ser o primeiro dono de pastelaria a se instalar na Feira do Largo. Ele está há 18 anos no local e as pessoas fazem fila para comprar seus pastéis. A receita do sucesso é simples: ?é preciso conhecer muito bem o produto e usar ingredientes de qualidade?. E é assim, de maneira simples, que ele acredita que conquistou a clientela. (SR)

Para vereadora, falta administração

A vereadora Julieta Reis é uma espécie de ?madrinha? dos feirantes do Largo da Ordem. Ela trabalhava na Prefeitura de Curitiba na época da implantação da feirinha. Julieta conta que o objetivo de criar o evento semanal era de revitalizar a região do Largo. ?E o objetivo foi alcançado com sucesso. Hoje não só o Largo mas todo o entorno têm cara nova. A feira é muito mais do que um espaço de comercialização?, afirma.

Mas a vereadora vê com preocupação o desvio do foco original da feira. Para ela, a culpa disso foi a falta de ações administrativas por quatro anos, que acabaram deixando os artesãos ?órfãos?, sem referências. ?Não houve atenção para a feira, os requerimentos nunca eram respondidos. Então o resultado disso é evidente: colocam produtos sem autorização e o desvio só foi aumentando. Espero que agora, nas mãos da secretaria de Turismo, isto mude.?

A vereadora afirma que a visão que se deve ter da Feira é da arte direcionada ao trabalho. Para ela, o mercado está cada vez mais exigente e as pessoas buscam originalidade. ?Por isso deve haver uma seleção e dar oportunidade para gente nova?, afirma. (SR) 

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna
Voltar ao topo