O trânsito curitibano está ferindo e matando menos. Essa é a conclusão de um levantamento feito pelo médico Carlo Valério Andrade, que assina a coluna Sinal Vital na Tribuna, com dados do Corpo de Bombeiros do Paraná. De acordo com a estatística, de 2010 para 2015, houve quedas em todos os indicadores: óbitos constatados no local do acidente (-50%), mortes em atropelamentos (-33%), atropelamentos (-30%), feridos em atropelamentos (-28%), acidentes (-22%) e feridos (-22%).
Vários fatores contribuíram para a redução da violência no trânsito da capital. Para Andrade, o principal motivo é o inchaço da frota, que impede a fluidez do tráfego. Já as autoridades atribuem o resultado às campanhas educativas, fiscalização e medidas adotadas, como implantação da Via e Área Calma, faixas exclusivas para ônibus e ciclorrotas. Conforme a pesquisa, a Avenida Sete de Setembro registrou a maior queda de atropelamentos entre 2011 e 2015 (-48%), passando de 37 para 19 ocorrências. Em julho de 2014, foi implantada no local a Via Calma – com limite de velocidade de 30 km/h.
Conscientização
Para o Corpo de Bombeiros, o trânsito da capital está mais seguro por causa das ações de prevenção. “Nós trabalhamos com duas linhas: prevenção e atendimento a ocorrências. Como o número de atendimentos caiu, podemos concluir que as ações preventivas de conscientização que realizamos em conjunto com outros órgãos causaram essa melhora”, afirma a tenente Rafaela Mansur Diotalevi, citando o projeto Vida no Trânsito, tocado pela prefeitura.
O Batalhão de Polícia de Trânsito da Polícia Militar do Paraná (BPTran) também aponta que as campanhas de orientação feitas com parceiros contribuem para tornar o trânsito menos violento. “Como não temos viaturas e efetivo suficiente, contamos com o apoio de funcionários de empresas privadas, igrejas e instituições para realizar blitze educativas uma ou duas vezes ao mês”, conta o soldado Gerson Teixeira.
Linha Verde: uma exceção à regra
Pelo levantamento de Andrade, o único número que piorou foi o de atropelamentos na Linha Verde, que passou de 15 em 2011 para 31 em 2015, um aumento de 51%. Para o engenheiro civil Eduardo Ratton, professor do Departamento de Transportes da UFPR, a má concepção do sistema viário seria a responsável pelo aumento de ocorrências na Linha Verde. “É um mau exemplo de projeto, desde sua criação. A função de vias arteriais e perimetrais de tráfego é garantir uma maior fluidez para deslocamentos de média distância e de passagem, desafogando o tráfego da zona central”, opina.
Na análise do especialista, “este tipo de solução viária não é compatível para os pedestres, que embarcam ou desembarcam da canaleta central exclusiva para os ônibus e ficam alguns minutos aguardando e avaliando a possibilidade de atravessar várias pistas correndo”. Ele observa, ainda, que os sinaleiros e faixas de travessia de pedestres estão a mais de meio quilômetro de distância das estações de desembarque.
Inchaço motorizado
Na visão de Andrade, a melhora nos números é explicada pela grande quantidade de carros: “Curitiba é a capital com maior taxa de motorização, disparado é onde tem mais carro no país. Os motoristas não conseguem andar mais rápido porque está inchado de automóveis, e consequentemente, os acidentes diminuem”. A cidade tem 1,8 habitante por veículo, conforme dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e da estimativa populacional do Instituto Brasi,leiro de Geografia e Estatística para 2013.
Para o autor do levantamento, as campanhas de trânsito da prefeitura de Curitiba são muito infantis e não têm a capacidade de mudar o comportamento do infrator. “Na Austrália, por exemplo, as campanhas são muito mais agressivas. Aqui, você pede por favor pro cara fazer a gentileza de respeitar a legislação. Lá, se você bebe ao dirigir, você é um idiota. Isso machuca o mau condutor. Com a Vó Gertrudes (foto), não se resolve nada”, critica, mencionando a personagem fictícia de peças publicitárias da administração municipal.
Tripé de prevenção
O diretor de engenharia da Secretaria Municipal de Trânsito (Setran), Mauricio Razera, argumenta que apenas o alto número de veículos não provocaria sozinho a diminuição da velocidade e, como consequência, dos acidentes. “Tecnicamente, não é essa a explicação, já que não temos a totalidade de carros circulando o tempo todo. O excesso do limite de velocidade é grande em todas as vias de Curitiba, e não é o único causador de acidentes. Das ocorrências, 30% são causadas por excesso de velocidade. Os outros 70% são causados por imprudência e álcool”, afirma.
Segundo ele, o que deixou o tráfego menos violento foram diversas ações da prefeitura, que prioriza a segurança no trânsito e o compartilhamento das vias por diversos modais (carro, motocicleta, bicicleta). O projeto Vida no Trânsito, a implantação de ciclorrotas e de faixas exclusivas de ônibus seriam algumas das iniciativas. “Essa melhora sensível é um legado de três pontos: fiscalização, educação no trânsito com campanhas de prevenção e engenharia de trânsito, que pensa projetos de mobilidade”, lista.