Ponto de explosão

Estresse deixa motoristas e passageiros sem paciência em Curitiba

Qualquer motorista sabe como é estressante enfrentar o trânsito de Curitiba, especialmente nos horários de pico. Agora, imagine o que é dirigir um ônibus lotado, por seis horas a fio, ainda tendo que cumprir o horário de chegar em cada ponto. É assim o dia a dia dos cerca de 7 mil motoristas do transporte coletivo da capital.

Ciciro Back
Jacinta nunca teve problemas.

Essa rotina pode estar afetando o comportamento não só de motoristas, mas também de cobradores. Segundo levantamento feito pela Urbs, entre janeiro e agosto, houve 7.871 reclamações de usuários, a maioria delas por não atender ao sinal de embarque, dirigir o veículo sem respeitar as regras de trânsito e faltar com a educação, cordialidade e respeito.

O número de queixas é alto, mas deve ser levado em conta que, durante esses oito meses, motoristas e cobradores fizeram aproximadamente 1,1 milhão de viagens. Isso significa uma queixa a cada 140 viagens. A Tribuna esteve nos terminais do Pinheirinho e do Santa Cândida, no período da tarde e ouviu usuários que reclamam do comportamento de motoristas e cobradores. Pedro Augusto Pereira, 77 anos, diz que foi “esquecido” pelos motoristas em pontos de ônibus. “Aconteceu várias vezes e ainda teve uma em que machuquei meu braço, porque o motorista fechou a porta em cima”, contou. “Não é porque a gente é idoso que eles podem tratar a gente de qualquer maneira”, complementou.

Porta

Ciciro Back
Adriano: parar só no ponto.

A auxiliar de serviços gerais Viviane Aparecida Pereira, de 43 anos, também já foi fechada em uma porta. “Não fiz nada, não reclamei, porque não adianta. Eles andam sempre muito estressados, acho que é por causa da escala”, disse. “Eles derrubam a gente, não deixam a gente entrar. Parece que não estamos pagando a passagem. Esses dias uma mulher caiu debaixo do expresso e o pessoal teve que avisar o motorista ou ela ia ser atropelada”, destacou a funcionária pública Laudia Soares da Silva, de 54 anos.

“Esses dias eu estava com meu menino pequeno, e um cobrador que não estava trabalhando estava sentado no banco preferencial. Entrou um senhor, eu pedi para ele sair e ele não saiu. Fiz reclamação pelo 156”, afirmou a vendedora Bruna Batista de Oliveira, de 23 anos. O promotor Antônio Carlos Spema é portador de deficiência física e usa muletas. Ele também reclama do comportamento de motoristas e cobradores. “Minha muleta está quebrada, porque fecharam a porta em mim. “Já cai nos ônibus várias vezes. Eles são mal-educados e vivem apavorados por causa de horário”.

Ciciro Back
Iolanda: eles me conhecem.

Profissionais reclamam

Os motoristas e cobradores se defendem. “99% das pessoas são mal-educadas e estressadas, a gente tem que fazer de conta que não é com a gente”, declarou Adriano José Rubini, motorista há três anos. “Para trabalhar nesse sistema tem que ser surdo, cego e mudo”, afirmou o motorista João Batista Nascimento, sobre o comportamento de muitos passageiros.

Já a cobradora Jacinta Teixeira Santo, disse que nunca teve problemas no trabalho. “Cumprimento as pessoas, alguns cumprimentam ta,mbém e são bem-educados”, disse. Para ela, as linhas com maior fluxo de pessoas geram maior estresse. “Acho que depende da linha, porque tem linha que o ônibus fica mais cheio e as pessoas ficam mais nervosas”, avaliou.

Ciciro Back
Ana Rosa foi levada até em casa.

Sobre a reclamação de que não atendem ao sinal de embarque, Adriano conta que muitas vezes os passageiros dão sinal, quando ele já está passando pelo ponto. “Mas a gente não pode parar fora do ponto, é norma da Urbs”, explicou. O presidente do Sindicato dos Motoristas e Cobradores de ânibus de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc), Anderson Teixeira, reforçou ainda que essa parada muitas vezes pode ser arriscada para os trabalhadores, por conta da grande quantidade de assaltos.

Anderson contestou os dados da Urbs. “Eu acredito que 90% não é verdade. O 156 não tem critério, qualquer pessoa pode ligar e falar qualquer coisa”, opinou. Ele relatou ainda que já aconteceu caso de um motorista ligar para reclamar de si próprio, para demonstrar que os dados não são confiáveis.

Passageiros também elogiam

Ciciro Back
Neide: são sempre educados.

Pelo que a Tribuna apurou nos terminais do Pinheirinho e do Santa Cândida, a maioria dos usuários não tem do que reclamar, e até elogia a conduta dos motoristas e cobradores. “Nunca tive problema nenhum com eles, são sempre educados”, afirmou a dona de casa Neide Luz Lima, de 49 anos. “Eles já me conhecem, param e ficam me esperando quando me veem”, disse Iolanda Mielque, de 76 anos. “Uma vez eu desmaiei no ponto e o motorista me levou até em casa”, contou a doméstica Ana Rosa de Oliveira, de 59 anos.

Helena Darago Dalapola, de 84 anos, também considera os motoristas e cobradores educados. “O povo está exagerando falando mal”, considerou. Para Sirlei Antonia Kriszcwski, de 42 anos, os trabalhadores são os que mais sofrem. “Os motoristas sofrem muito mais do que nós, com ônibus lotados, as pessoas entram xingando”. O soldador Thiago Rodrigues, de 23, acha que os motoristas e cobradores são tolerantes. “Eles são bem tolerantes, porque tem muita gente que discute e xinga”.

Treinamento anual é obrigatório

Ciciro Back
Helena: o povo exagera.

Segundo o diretor de educação da Secretaria de Trânsito de Curitiba (Setran), Cassiano Novo, os 7 mil motoristas da capital assistem obrigatoriamente palestras de duas horas a cada ano. “No ciclo anterior o tema foi direção defensiva e estamos fechando ciclo sobre a segurança dos passageiros”, afirma. “Queremos modificar as palestras, estendendo a carga horária e fazendo uma didática menos expositiva e mais vivencial”, explica.

Seguro

O SegBus, seguro de acidentes que cobre usuários do transporte coletivo de Curitiba, também oferece treinamentos aos motoristas. No programa de desenvolvimento comportamental, feito em duas sessões de três horas cada, a intenção é motivar os trabalhadores. “Dirigir ele já sabe, sabe frear e desacelerar.

Talvez esteja faltando motivação, entusiasmo”, explica o consultor em programas de segurança no trânsito J. Pedro Correa. “A partir do comportamental, ele melhora toda a performance dele”, complementa.

Ciciro Back

Grupos de WhatsApp da Tribuna
Receba Notícias no seu WhatsApp!
Receba as notícias do seu bairro e do seu time pelo WhatsApp.
Participe dos Grupos da Tribuna