Por falta de informação e apoio de familiares e médicos, muitas mulheres param de amamentar muito antes do que deveriam. Usam desculpas como “meu peito vai cair; meu leite é fraco; meu seio é pequeno e dá pouco leite; não posso mais fazer nada da vida porque tenho que ficar presa ao bebê; meu seio está rachado, sangrando e doendo demais”, por exemplo, para começar a dar as fórmulas prontas (leites de lata), sem saber que todas estas desculpas são mitos e como é importante amamentar o máximo de tempo possível. Além de aumentar o afeto e o vínculo entre mamãe e bebê, há dezenas de benefícios para ambos (veja no infográfico).
A pediatra Claudete Closs, coordenadora do Programa de Amamentação (Proama), da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, explica que é uma orientação do Ministério da Saúde que a criança seja amamentada exclusivamente pelo peito até os seis meses de vida. Depois disto, até um ano de idade, a introdução de papinhas vêm complementar o aleitamento (e não o contrário). E a partir de um ano, o leite continua alimentando, hidratando e imunizando a criança de várias doenças. O desejável, diz Claudete, é que a mãe dê o peito até os dois anos ou mais. “O leite materno é como uma vacina. E a mãe que tem um filho tem que se disponibilizar para ele”, diz a pediatra.
No parto
A primeira amamentação tem que ser já na sala de parto. A educadora perinatal (doula) Tyffany Buchmann diz que, assim que o bebê sai da mãe, deve ser levado ao contato com o seio. Além do estímulo ao afeto, o contato faz com que o corpo materno comece imediatamente a produzir a ocitocina e a prolactina. “Mesmo que o bebê não pegue a mama ou sugue, as lambidinhas que ele dá acionam os hormônios imediatamente”, diz Tiffany.
A ocitocina causa contrações no útero, que além de ajudá-lo a voltar ao tamanho normal, faz com que a placenta solte-se sem precisar ser arrancada. As contrações ocorrem sempre que a mãe amamenta, evitando que algum pedaço de placenta fique lá dentro. E a prolactina é o hormônio que produz o leite materno.
Marido e família tem que dar apoio
Para que a amamentação tenha sucesso, a mulher não pode passar por nenhuma situação de estresse ou tensão. Quando isto ocorre, há a liberação de adrenalina que, segundo a endocrinologista do laboratório Laboratório Frischmann Aisengart, Myrna Campagnoli, bloqueia a produção de ocitocina.
O psicológico da mulher precisa estar “em ordem”. A nutricionista e doutora em bioquímica Juliana Cassolato constatou que muitas mulheres param de amamentar pela falta de apoio da família (incluindo o companheiro), dos profissionais de saúde em geral e da falta de informação delas e das famílias.
“A família não entende que o bebê está se adaptando ao mundo e porquê às vezes choram depois da amamentação. As mulheres ouvem coisas como ‘seu leite é fraco, não tá sustendando o bebê‘, ‘você não vai dar conta’. Coisas que interferem no psicológico e fazem reduzir o leite. Não existe leite fraco. O que existe é o despreparo de todos para lidar com o bebê”, alertou a nutricionista.
Por parte dos profissionais de saúde, diz Juliana, todos ficaram muito reféns da balança e, a qualquer regressão de peso, já querem dar o leite artificial, sem insistir muito na melhora do a,leitamento materno. As mães e seus familiares mal sabem que há meios de reestimular a produção de leite e que a mamdeira deve ser evitada, pois é mais fácil de sugar e faz o bebê desistir do seio.
Lei vai multar “constrangimentos”
O vereador Aldemir Manfron (PP) encabeça um projeto de lei que prevê multa aos estabelecimentos comerciais de Curitiba que proibirem ou causarem constrangimento às mães que estejam amamentando dentro de suas instalações. O projeto foi proposto em maio, já passou pela Comissão de Constituição e Justiça e agora aguarda um parecer da Comissão de Direitos Humanos, antes de ser submetido à votação. Em São Paulo já existe lei semelhante, sancionada em abril. O artigo 9.º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, garante que o poder público, as instituições e empregadores tem que propiciar condições adequadas ao aleitamento materno.
A amamentação em público ainda é muito polêmica. Muitas mães ainda ouvem coisas como “amamentação é intimista, faça isto em local ‘apropriado‘”, “cubra estes peitos, você está constrangendo as pessoas ao redor”. A advogada Raquel Azevedo passou por uma situação “estraha”. Enquanto visitava o Museu do Olho, sentou-se numa poltrona do salão para amamentar Helena, de três meses. “Eu vi que uma das seguranças estava incomodada e veio falar comigo. Ela não foi grosseira, nem disse que eu não podia amamentar ali. Mas me disse que, se eu precisasse, havia um fraldário no museu, onde também havia uma poltrona de amamentação. Como a Helena já estava mamando, esperei ela terminar para ver o fraldário. A poltrona era exatamente igual a que eu estava, sem contar que era dentro de um banheiro. A segurança foi muito educada. Mas nas entrelinhas parecia que eu não deveria estar amamentando no meio do museu”, relatou a advogada.
Raquel também conta que percebe os olhares estanhos nos shoppings. “A maioria deles tem fraldários, com poltrona de amamentação. Mas às vezes estou na praça de alimentação com meu marido e eu não vou deixá-lo sozinho para ir ao fraldário. Fico acompanhando, esperando ele terminar de comer e amamentando a Helena. Não acho certo ficar cobrindo e abafando o rosto de bebê. As pessoas ficam olhando estranho”, lamentou Raquel.
Amamentação no trabalho
Anualmente, de 1.º a 9 de agosto, é celebrada a Semana do Aleitamento Materno. Este ano, a campanha tem como tema “Amamentação e trabalho. Para dar certo, o compromisso é de todos”, que tem como objetivo conscientizar que, mesmo depois que a mãe retorna da licença maternidade, ela pode continuar amamentando.
Mas, para que isto aconteça, é necessário o envolvimento de todos. Marido e família precisam ajudar na “logística” com o bebê, caso a mãe opte por amamentá-lo no trabalho. E dentro da empresa, a mãe precisa ter ajuda dos chefes e colegas, com a flexibilização do horário de trabalho, permissão para que possa sair e amamentar o bebê em casa ou na creche, ou que tenha uma sala de apoio, com local sossegado para ordenhar o leite a cada três horas e uma geladeira para armazená-lo, até a hora de ir embora. Sem contar que a mãe deve ser poupada de muito estresse, tensão e cobranças, para que o seu psicológico não interfira na produção de leite.
Veja a entrevista com a educadora perinatal.