Ratos, mau cheiro, lixo, mosquitos, baratas, água contaminada invadindo residências quando chove demais. Pode parecer cena de uma cidade pobre, sem condições, com pouca infraestrutura, no interior do Brasil. Mas não.

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Essas são as dificuldades rotineiras de quem mora na Rua José Maurício Higgins, perto da Rua das Carmelitas, no bairro Boqueirão, em Curitiba. Moradores e comerciantes precisam lidar, todos os dias, com o incômodo das valetas abertas que recebem esgoto doméstico.

“Quando chove, todo mundo já fica esperando a água da valeta subir e entrar em casa. Sempre foi assim e eu moro aqui há 30 anos. Os ratos que aparecem são enormes”, conta o pintor automotivo Lucas Abiach Guizlin. “Isto aqui é um absurdo”, comenta Antônio Raul Kochenski, dono de um minimercado. “Há anos a gente luta e nada acontece aqui. É mau cheiro, pernilongo, rato, barata. E ainda tem gente que vem aqui de carro e, de noite, despeja lixo dentro das valetas”, revela o morador Sílvio da Maia.

O que os moradores da Rua José Maurício Higgins passam diariamente é a mesma rotina de muitos brasileiros que não foram contemplados com a rede coletora de esgoto.

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Uma pesquisa do Instituto Trata Brasil (uma organização da sociedade civil de interesse público que visa à mobilização para garantir universalização do saneamento no Brasil) e do Ibope indica que um terço dos entrevistados já vivenciou ou conhece alguém que já teve problemas relacionados ao esgoto.

Praticamente um quinto dos domicílios (18%) sofre com problemas de refluxo; 17% lidam com problemas de enchentes e inundações. Um terço dos entrevistados precisa enfrentar o mau cheiro dos esgotos.

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O levantamento ainda detectou que 77% das pessoas acreditam que estão ligadas à rede de esgoto. No entanto, o índice considerado pelo Ministério das Cidades é de quase 50%.

A pesquisa mostra também que, quanto menor a renda, a escolaridade e classe social do entrevistado, menor é o percentual de ligações na rede. Do total de pessoas consultadas, 26% estão insatisfeitas com os serviços de coleta e tratamento de esgoto; 50% dizem estar satisfeitas.

No Paraná

A Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar) afirma que a cobertura da rede de esgoto atinge 67,76% da população da região metropolitana de Curitiba (incluindo a capital). Somente em Curitiba, a rede está disponível para 90,14% dos moradores.

As localidades onde ainda não há rede de esgoto estão espalhadas por toda a cidade. Segundo Antônio Carlos Girardi, gerente geral de Curitiba e região metropolitana da Sanepar, ocorrerá expansão da rede na região norte da capital, abrangendo o bairro Santa Cândida e outros no município de Colombo. As regiões sul e leste de Curitiba também receberão mais atenção.

“Só para esgotamento sanitário existem recursos garantidos de R$ 275 milhões, entre PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), financiamentos da Caixa Econômica Federal, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e recursos da União, referentes a obras previstas até 2012”, assegura.

Ligação é responsabilidade do proprietário

Além da falta de acesso à coleta e tratamento de esgoto, a ligação incorreta na rede ocasiona vários problemas. O proprietário do imóvel é o responsável pela ligação.

“Às vezes, por desconhecimento, a ligação para o escoamento da água da chuva é feita na rede de esgoto, que tem uma tubulação estreita. Pode acontecer o refluxo, quando o esgoto volta para dentro da casa. Com uma chuva muito forte, a rede não tem capacidade de absorver tudo. Muitas vezes o morador nem sabe que a ligação está errada”, explica Antônio Carlos Girardi, da Sanepar.

Quem faz o contrário, liga o esgoto na galeria pluvial, contrib,ui para a poluição dos rios. É um canal direto, que deveria servir apenas para escoar a água da chuva.

Girardi conta que a Sanepar faz a orientação individual. O proprietário executa o serviço e depois a companhia vai até o local para uma vistoria. Se não foi realizado, a Sanepar avisa o responsável e passa o caso para a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, que tem o poder de multar.

“É um intenso trabalho de conscientização. A região da bacia do Rio Belém, por exemplo, tem mais de 90% da população atendida com rede de esgoto. Mas o rio está poluído. Algumas residências fazem a ligação irregular e lançam esgoto na galeria pluvial, que vai direto para o rio. O mesmo acontece com as valetas”, esclarece. Para orientações, ligue no telefone 115. (JC)

Em dez anos, cobertura pode chegar a 80%

O presidente do Instituto Trata Brasil, Raul Pinho, diz que o País precisa de R$ 270 bilhões para cobrir o atual déficit de saneamento. O PAC reservou para este segmento R$ 10 bilhões ao ano.

“Fazendo uma conta simples e considerando que todo governo vai aplicar pelo menos esta quantia anualmente, levaria 27 anos para resolver a questão. É um prazo muito longo. Tudo bem que avançamos, não tínhamos nada. Mas ainda falta muito. Há necessidade de investimento contínuo”, avalia.

Pinho lembra que a pesquisa do Instituto Trata Brasil ainda mostrou que a população enxerga no prefeito a responsabilidade em resolver o problema. “Os prefeitos podem pressionar e cobrar do operador a eficiência e a cobertura do saneamento”, comenta.

Para o professor Carlos Mello Garcias, do curso de Engenharia Ambiental da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental no Paraná (Abes-PR), será difícil chegar a 100% da população atendida.

Mas ele acredita que o índice deverá ficar entre 70% e 80% nos próximos cinco a dez anos. “Dos 80% para os 100% haverá barreiras políticas e a falta de conhecimento da população”, aponta. (JC)

Cobertura e previsão de expansão da rede de esgoto na RMC

Almirante Tamandaré
Hoje – 13,03%
2012 – 50%

Araucária
Hoje – 38%
2010 – 40%

Bocaiúva do Sul
Hoje – 0%
2010 – 30%

Campo Largo
Hoje – 39%
2010 – 50%

Campo Magro
Hoje – 0%
2010 – 16%

Contenda
Hoje – 0%
2010 – 20%

Mandirituba
Hoje – 5%
2010 – 20%

Fazenda Rio Grande
Hoje – 33%
2010 – 40%

Curitiba
Hoje – 90%
2010 – 94%

Fonte: Sanepar