Entidades médicas reprovam o pacote anunciado por Dilma

Entidades médicas do Paraná reprovam o pacote anunciado pela presidente Dilma Rousseff para ampliar atendimento na rede pública e preencher vagas em locais carentes. A ampliação do curso de medicina de 6 para 8 anos, a partir de 2015, obrigando estudantes a trabalhar dois anos no Sistema Único de Saúde (SUS) para obter diploma, foi muito criticada. Dirigentes entendem que providências não resolvem os maiores problemas do setor: falta de infraestrutura e plano de carreira.

Claudia Paola Carrasco Aguilar, diretora do Sindicato dos Médicos do Paraná (Simepar), classifica a medida como discriminatória. “Por que somente os médicos serão obrigados a trabalhar para o governo? Como fica a formação dos alunos? É inaceitável”, afirma. Segundo a sindicalista, o governo precisa de políticas eficazes para atrair médicos à rede pública. “Não adianta impor. Tem que dar condições. Tem concursos públicos que pagam pouco e há contratos em prefeituras que não dão a menor garantia ao médico. Se mudar a administração, o médico pode ser demitido sem mais nem menos”, explica.

Riscos

Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR), Alexandre Gustavo Bley, o governo mostrou que não quer resolver o problema do setor. “O governo se portou de forma midiática, eleitoreira e irresponsável e só vai agravar a situação da saúde”, avalia. “Precisamos de bons profissionais para trabalhar no SUS e o governo não quer isso”. Ele opina que a população e os pacientes da rede pública serão colocados em risco já que não haverá gente suficiente para fiscalizar os “quase” formados.

Bley aponta ainda que a principal reivindicação das entidades, o plano de carreira, não foi atendida. “É só contratação emergencial pela metade do valor que se pensa para a carreira, que seria aos moldes do Judiciário”. Segundo o médico, o governo não vai conseguir preencher as vagas e trará os profissionais estrangeiros, “que é o que ele quer”.

Greve geral

Hoje tem reunião na Federação Nacional dos Médicos, em Brasília, para decidir que posições a classe tomará em relação às medidas do governo federal. O presidente da entidade já declarou que pode haver greve geral da categoria contra as novas normas e a classe precisa dar uma resposta forte ao governo. Já o Conselho Federal de Medicina (CFM) deve entrar com ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). Sindicatos e conselhos também farão trabalho com os deputados para tentar barrar a aprovação da medida provisória que fixa as novidades para o setor.

Realidade sem atrativos

De acordo com a AMP, no Paraná há 1,1 médico para cada mil habitantes, enquanto em Curitiba a relação é de 5,7 profissionais por mil moradores. João Carlos Baracho cita que há 76 municípios do Estado sem médico domiciliado e 59 com apenas um profissional. “Existe excesso de médicos, que poderiam estar no interior se houvesse realidade mais atrativa. Propostas de R$ 20 mil a R$ 25 mil, oferecidas por algumas prefeituras, são precárias, com poucos meses de duração. Assim, o médico não pode estabelecer vínculo com o SUS”.

O Brasil tem 202 escolas médicas, um dos maiores números do mundo, ao lado da Índia. Dilma anunciou criação de mais 400 vagas para estudantes de medicina no Paraná. “Formamos 1.057 médicos por ano no Estado; 506 só em Curitiba”, aponta o presidente da AMP. Para ele, “não adianta produzir mais e mais médicos com falta de estrutura que impossibilite a redistribuição dos médicos”. “Aí vão chamar os médicos do exterior sem prova de revalidação, apenas com três semanas de estág,io em universidade pública e avaliação sumária para dizer se estão aptos ou não a atuar como médicos no Brasil e então receberão registro provisório no Conselho Federal de Medicina, que sequer foi ouvido. Isso deixa as entidades médicas perplexas”, protesta.

Arquivo
Baracho: preocupação.

Decisão sem negociações

“As entidades médicas nacionais não foram ouvidas e as medidas não foram discutidas em sua essência”, pondera o presidente da Associação Médica do Paraná (AMP), João Carlos Baracho. Ele analisa que as novas regras não foram estruturantes. “Consideramos as medidas bastante paliativas, pois não vão no cerne do problema, que é o desfinanciamento da saúde como um todo”, declara.

Baracho também acha preocupante o aumento do curso de medicina de 6 para 8 anos. “Alunos serão usados como mão de obra para suprir possíveis dificuldades por falta de estrutura para atrair 18 mil médicos formados por ano no Brasil. É um serviço civil obrigatório, só que com outro nome”, define.

Investimento

“Defendemos plano de cargos e salários com vínculo formal através de concurso público, além da definição clara de piso salarial. Mais do que isso, achamos que o que vai redistribuir os médicos é uma carreira de Estado, assim como juízes e promotores”, afirma. O presidente da AMP cobra ainda a aprovação da emenda constitucional popular que destina 10% do orçamento da União para o setor, o que injetaria R$ 31 bilhões por ano. “Com esse recurso a mais, com certeza teríamos investimento maior principalmente nas áreas de clarão assistencial, onde não existem nem postos de saúde”.