"Buscamos harmonia com o mundo. Nada ganharemos com a guerra. Queremos a pureza das pessoas, pois só assim, alcançaremos a vitória." Esse é um trecho da música Em busca da Paz, que fará parte do CD "Louco de Bom", que está sendo gravado por pacientes que freqüentam o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) II Afetiva, no bairro Boqueirão, em Curitiba. Amanhã o grupo fará a gravação das duas últimas músicas do CD, que deve ser lançado no mês de março.
O trabalho teve a participação de 100 pacientes que utilizam a musicoterapia no tratamento de saúde mental. A musicoterapeuta Veridiana de Cássia Barreto Cesarin destaca que a idéia da gravação do CD surgiu em 2003, quando alguns grupos da terapia mostraram interesse em compor. A partir daí, ela começou a trabalhar com os pacientes diversas questões ligadas ao processo de criação, além de ritmo e harmonia. Também conseguiu o apoio do Stúdio Soft Cine Vídeo, que acreditou na idéia e resolveu patrocinar o CD.
Além do resultado musical, Veridiana destaca o resultado social desse trabalho. "Os benefícios da música para a saúde mental são interessantes, e nesse processo pudemos verificar uma transformação na vida de muitos pacientes", falou. A musicoterapeuta destaca que a música abre canal de comunicação além do racional, e com isso trouxe como resultados uma integração entre os pacientes, despertou a criatividade e sensibilidade, "além de mostrar um outro lado que para eles estava esquecido, que foi sair da doença e promover uma socialização entre eles e as outras pessoas".
Preconceito
Um dos exemplos dessa transformação, comenta Veridiana, foi um paciente psicótico que tinha uma postura corporal difícil de trabalhar. "Ele ficava sentado sempre com os braços cruzados e não falava com ninguém. Hoje ele está no curso de música. Foi como sair do casulo", comentou.
Para a maioria dos pacientes que participam desse trabalho, a gravação do CD será uma forma de diminuir o preconceito que muitas pessoas com transtornos mentais sofrem na sociedade e na própria família. João Maria Garbos comenta que a música resgatou sua auto-estima e o fez sentir uma pessoa igual as outras. "Lá fora nós não somos considerados normais, mas aqui aprendi que sou igual a todo mundo", falou. Ele espera que o fim da discriminação também atinja a sua família. "Quando contei para eles sobre o CD eles deram risada e disseram que seria engraçado ver um monte de louquinhos cantando."
Eva Ferreira Gonçalves também espera que a música mostre para as pessoas que não existem diferenças entre elas. "Eu nem sabia que tinha esse dom, e hoje eu encontrei algo que nunca tive lá fora. A música faz a gente se encontrar", disse. O processo de criação coletiva foi um dos pontos importantes do trabalho, comenta Waldenor Batista dos Santos, que tem o apoio do colega Silas Abner Zanardine. Para eles, a história dessa transformação na vida dos pacientes poderia acabar em um livro. "Seria uma educação melhor para as pessoas", disse Silas. Já Maria Helena Araújo entende que musica é uma forma de resgate de valores pessoais que ela mesma já tinha esquecido.