Afinal, o que é biotecnologia? Seria esse processo novo e reversível? Por que discutir biossegurança? Esses são pontos que ainda trazem muitos mitos e geram muita confusão na sociedade em geral. No entanto, são também essas questões que cientistas de diversos países – reunidos na Iniciativa Pública de Pesquisa e Regulamentação (PRRI) – tentam desmitificar para o mundo, através de pesquisa e divulgação de resultados.
A pesquisadora brasileira Leila Oda, da Associação Nacional de Biossegurança (AnBio), explica que essa tecnologia não é recente. Desde a década de 80, muitos já usavam produtos originados da biotecnologia, como a penicilina. "Mas o que existe hoje é uma descoberta da sociedade em geral, pela qual formou-se um mito, que é tratado como algo muito distante. Portanto, o importante agora é apresentar para a sociedade essa ciência: a tecnologia da vida", afirma. Ainda de acordo com a pesquisadora, toda pesquisa da área, desenvolvida em laboratório, tem como objetivo uma aplicação concreta na sociedade. Porém, se a sociedade não entende bem esse objetivo, não vai aceitar o produto. "Hoje temos os bloqueios no campo tecnológico, que se dão por conta da má interpretação", alega Oda.
A divulgação e o esclarecimento, para Oda, são fundamentais para que as pesquisas sejam bem recebidas quando aplicadas. "É importante mostrar o que estamos fazendo no mundo. É algo irreversível, que não podemos generalizar, nem demonizar, tampouco achar que vai resolver todos os problemas ambientais e de saúde. Que fique claro que é mais uma ferramenta que podemos buscar para resolver problemas sérios. Pode ter impacto. Por isso a biossegurança é necessária", explica a pesquisadora.
Experiências
No Brasil, o projeto desenvolvido pela AnBio é justamente disseminar a biossegurança como ciência no País. No entanto, em termos de pesquisas em biotecnologia, essas são as mais diversas. "A Embrapa, por exemplo, se preocupa com a questão social dos agricultores, então desenvolve projetos para um feijão resistente a vírus, para evitar a perda na agricultura familiar. Tem também outra pesquisa em instituições públicas do Brasil que desenvolve vacina a partir da alface, que é mais pura e de menor custo. São muitas as pesquisas", comenta Leila.
No mundo todo, inclusive em países mais pobres da África e no vizinho Argentina, os projetos biotecnológicos são os mais diversos e têm as mais diferentes aplicações que vêm resolver problemas sociais, como a fome. No Zimbábue, a pesquisadora Idah Sithole Niang, a partir do gene do vírus, cria na semente a resistência para esse mesmo vírus. O objetivo, segundo ela, é melhorar a agricultura, que é a principal atividade no país. "É algo que se você perguntar, todos os agricultores gostariam de ter. No meu país, há dez anos, eles (governo) já reconheceram que a biotecnologia é boa, por isso no Zimbábue já temos uma política da ciência e, uma lei de biossegurança. A biotecnologia já é ensinada nas universidades", conta Idah.
Argentina
O cientista argentino, Andrés Wigdorovitz, do Instituto de Virologia do governo do país, tem o objetivo de diagnosticar doenças animais e desenvolver vacinas. "Uma das estratégias de pesquisa é verificar se as plantas podem servir para fabricar vacinas", explica Wigdorovitz. Atualmente, uma das pesquisas de Wigdorovitz é para encontrar uma vacina eficaz para o rotavírus e a diarréia em animais e crianças. O gene, retirado do vírus, é aplicado em uma planta simples como a alfafa. Da planta é fabricada a vacina para a doença, que é dada para a mãe e, dessa forma, repassada para o bebê pelas glândulas mamárias. "Sabemos (desde 2004) que isso funciona em ratos. Temos muitos resultados. É importante para os outros saberem o que estamos fazendo. As plantas e a biotecnologia serão uma boa solução para os países em desenvolvimento", afirma o pesquisador.
Decisão da MOP3 causa desapontamento
Joyce Carvalho
Mesmo fugindo um pouco da proposta inicial do Brasil, a decisão de discutir a identificação das cargas com Organismos Vivos Modificados (OVMs) em movimentações transfronteiriças em 2012 foi considerada um avanço pela delegação brasileira na 3.ª Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (MOP3), encerrada na noite de sexta-feira.
Para o gerente de recursos genéticos do Ministério do Meio Ambiente, Rubens Nodari, a decisão já indica um caminho a ser seguido, mostrando a adoção da expressão "Contém OVMs" no futuro. "Estamos na direção de uma identificação clara e precisa. A posição central do Brasil foi mantida", opinou. Ele ressaltou que as negociações foram muito difíceis, mas que isto já era previsto.
A ambientalista e socióloga da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Marijane Lisboa, acredita que a decisão tomada na MOP3 é muito tímida quanto à proteção da biodiversidade. "Foi dado um prazo que sequer garante a obrigatoriedade da identificação. Após seis anos, ainda pesará a dúvida. É quase uma promessa, que vai depender da boa vontade dos países", concluiu.
Marijane espera que o Brasil faça o "trabalho de casa" até 2012 e implante a identificação dos transgênicos.
