Poucas vagas pra “cabeça”

Curitiba não tem leitos para tratamento da saúde mental

A estrutura de tratamento da saúde mental na rede pública de Curitiba é deficitária. Para piorar, a ala psiquiátrica do Sistema Único de Saúde (SUS) de uma das instituições mais tradicionais – o Hospital Nossa Senhora da Luz – deve funcionar somente até novembro.

Quem sofre ou tem familiar com transtornos psiquiátricos sabe como, em muitas situações, existe a necessidade de internação, pois o caso pode oferecer riscos à família e ao próprio paciente. É o caso de dois irmãos, que preferem não se identificar, que internaram a mãe na segunda-feira no Nossa Senhora da Luz. É a segunda vez que ela, com depressão severa que leva a surtos psicóticos, é hospitalizada. “Quando está assim não dá para cuidar em casa”, desabafa um deles. Na primeira internação, foram três meses até poder voltar para casa. O outro irmão diz que menos tempo teria sido insuficiente para o tratamento. “Uma semana não ia adiantar nada”, afirma.

Critérios

Com a reforma na área psiquiátrica, transformada em lei em 2001, o Ministério da Saúde passou a orientar a substituição dos hospitais psiquiátricos por outros serviços, como o Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e os leitos psiquiátricos em hospitais gerais. Pelo critério do governo federal, Curitiba deveria ter 76 leitos para atendimento de saúde mental em hospitais gerais, mas até agora não existem.

O Hospital Nossa Senhora da Luz atende, por enquanto, 70 pacientes por mês. Outra instituição tradicional da cidade, o Hospital Bom Retiro, também teve diminuição do número de vagas. Para o médico Marco Antônio Teixeira, clínico do Hospital Nossa Senhora da Luz, o movimento antimanicomial atinge apenas pessoas com menor condição financeira, pois “quem tem convênio ou dinheiro leva para hospital particular”.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 10% da população tem algum tipo de doença mental ou neurológica, o que representaria 200 mil pessoas em Curitiba. Atualmente, os Caps para transtornos mentais fazem cerca de 1.340 atendimentos por mês.

Menor número de internamentos

O Hospital Nossa Senhora da Luz tem 110 anos de história. Foi criado em 1903 pela necessidade de tratamento especializado aos doentes mentais internados na Santa Casa de Misericórdia. Segundo Marco Antônio Teixeira, há cerca de 15 anos eram atendidos 700 pacientes. A redução foi progressiva, e “há um mês eram 70 pacientes homens e 70 mulheres; agora são 70 ao todo”, conta o médico.

Na opinião de Teixeira, existem casos em que há necessidade de internação. “Os Caps foram avanços para pacientes com problemas leves e moderados. Doenças de gravidade maior exigem hospitalização e têm pacientes que necessitam de maior tempo de internamento”, afirma. Ele aponta ainda outra dificuldade dos Caps: “os pacientes não têm condições de irem sozinhos aos centros e os familiares trabalham e não podem levá-los e buscá-los todos os dias.”

Desassistência

O médico acredita também que os leitos em hospitais gerais não são uma boa solução. “Pacientes com transtornos mentais são diferentes de pacientes clínicos, que ficam deitados, em repouso. Por isso, os hospitais psiquiátricos são caracterizados por amplos espaços. Faz parte da terapia que eles tenham liberdade de andar e se locomover”, considera.

“Já existem pessoas dizendo que está havendo genocídio dos pacientes psiquiátricos, por causa da desassistência”, afirma Teixeira. O que, segundo ele, aumenta até o número de moradores de rua. “A família se não tem onde colocar e afasta a pessoa com transtornos mentais; e eles acabam vivendo nas ruas””, lamenta.

Pacientes ,perto da família

O diretor do Hospital Nossa Senhora da Luz, Álvaro Quintas, diz que a ala psiquiátrica não está sendo fechada: “estão sendo transferidos os atendimentos desses leitos integrais para os Caps”. Segundo ele, “a reforma psiquiátrica prevê isso desde o início de 2000 e a nova gestão da Secretaria Municipal de Saúde tem interesse que isso aconteça, para deixar o paciente mais próximo das famílias, amigos e toda a rede social. Dessa forma ele tem recuperação muito mais rápida”. Ele garante que os outros serviços do hospital, como os ambulatórios da Santa Casa e do Cajuru, vão continuar funcionando. “Existe a previsão de melhoria da infraestrutura”, promete.

De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, a previsão é abrir 48 leitos em Caps 24 horas. Dos 70 pacientes internados hoje no Nossa Senhora da Luz, oito têm moradia fixa e devem ser encaminhados para residências terapêuticas. Os outros 62 irão para os Caps, onde o tempo médio de internação é de 10 dias.

A secretaria informou ainda, em relação aos leitos psiquiátricos em hospitais gerais, que está em negociação com alguns hospitais e que existem avanços neste sentido que devem ser verificados até o final deste ano.

Gerson Klaina
Instituições psiquiátricas caracterizadas por espaços amplos.
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