Ontem
Elizangela Wroniski
Quem chegava a Curitiba naquela época, não se animava muito com o cenário. Um dos entraves para o desenvolvimento da pequena vila era a falta de estradas. A ligação com Paranaguá pela Serra do Mar era difícil.
Hoje, o metro quadrado no centro da cidade vale uma fortuna; mas na pequena Curitiba de outrora, a realidade era diferente. As terras não valiam nada e a riqueza das pessoas era medida pelas ferramentas que possuíam, como machados e enxadas.
A situação melhorou um pouco com a chegada do ouvidor Raphael Pires Pardinho, em 1721. Ele destacou a necessidade de curitibanos e parnanguaras de cuidarem das estradas e assinalou os caminhos que seguiam para o sul e para São Paulo. Chegar ao Estado vizinho demorava até 40 dias. Pardinho também criou as primeiras posturas urbanas, construiu casa para a Câmara e para a cadeia, limitou o corte de árvores e estabeleceu a limpeza do Rio Ribeiro (hoje Belém), para evitar banhado.
Com a passagem dos tropeiros a cidade ganha fôlego. Eles viajam com as canastras cheias de dinheiro, ouro e prata para as despesas e compra de mulas. No século XVIII, Curitiba se configura como polo irradiador da conquista do sul do país e oeste do Paraná. Daqui partem diversas bandeiras, levam gados, alimentos, e recrutas.
Em 1820 chega a capital o botânico francês Saint Hilaire, que definiu a cidade como hospitaleira, cheia de moças bonitas e de população predominantemente branca. Destacou o ar europeu na cidade. O frio era um fator que contribuía, pois dava ânimo aos trabalhadores. As casas eram de taipa com telhas extraídas do Barigui, os móveis toscos e os trajes rústicos.
Em 1853, o Estado se torna província independente e Curitiba passa a ser a capital. Segundo a professora Maria Cecília Pilla, diretora do curso de história e sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), nesta época a cidade tinha 308 casas, mais 50 casas em construção e 5.819 habitantes. Os primeiros momentos foram difíceis, faltava dinheiro. A iluminação era precária. Para economizar, dos 30 lampiões que existiam nas ruas, apenas dois eram acessos. Em 1853 um mapa já registra as 13 principais ruas da pequena Curitiba Os imigrantes vinham vender as mercadorias e tinham dificuldade de voltar para casa devido aos atoleiros causados pela chuva. Apesar das dificuldades, os imigrantes promoveram várias transformações sociais e econômicas. Em 1880 a cidade recebeu o imperador D. Pedro II, que veio ao Estado para dar início a construção da estrada de ferro, que impulsionou a economia com sua inauguração, em 1885. Um ano depois, a cidade ganha ares de modernidade. É acesa a primeira lâmpada elétrica.
No século XX, uma das transformações mais importantes na cidade foi o Plano Agache. O urbanista e arquiteto francês Alfredo Agache ordenou o espaço urbano. Setorizou a cidade, criando o Centro Cívico e a área industrial, por exemplo. Também criou as largas avenidas, como a Visconde de Guarapuava, e apresentou a idéia de anéis de integração que ligavam os bairros sem passar pelo centro. Mas isso demandava muitos recursos. O arquiteto do IPPUC, Mauro Magnabosco, explica que em 1960 um grupo de urbanistas se reuniu para discutir novas medidas de urbanização. Na década de 1980 foi criado a Rede Integrada de Transporte e na de 1990 se destaca o programa de reciclagem ?Lixo que não é lixo?.
Hoje
Luciana Cristo
Em cada canto da cidade, uma nova obra. Barulho, congestionamento e desvios viraram parte da realidade dos curitibanos num momento em que tudo parece ser culpa das obras da Linha Verde e da Avenida Marechal Deodoro. Obras planejadas que pretendem transformar o cenário urbano da cidade, para resolver problemas mais antigos que geram reclamações.
Para o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), chegou o momento de se começar a pensar em uma nova configuração estrutural para a cidade, visando a integração do sistema viário, do uso do solo e do sistema de transportes. Como característica, essas novas obras levam em conta a legislação para uso e ocupação do solo, para garantir a preservação dos principais mananciais de água potável da região.
Nesse período, os curitibanos devem esperar outra novidade: a promessa do novo ligeirão, ônibus rápido com menos paradas e com possibilidade de ultrapassagem entre os ônibus.
E, de novo, o que já parece rotina: obras na Marechal Deodoro. Em seus quase 40 anos de existência, houve instalações subterrâneas de saneamento, energia elétrica, telefonia, cabos de fibra ótica e outros. Mesmo reconstituído a cada intervenção, o calçamento ficou muito deteriorado, o que fez com que fosse necessário reconstruí-lo integralmente agora. A intenção é também aumentar a segurança e a acessibilidade dos pedestres.
Na avaliação do prefeito de Curitiba, Beto Richa (PSDB), a explosão demográfica enfrentada pela cidade nas últimas décadas aumentou a demanda por mais serviços públicos, incluindo essas obras. ?Temos hoje muitos problemas semelhantes aos municípios da região metropolitana, com a qual é preciso insistir na integração. Serviços como destinação do lixo e segurança pública têm que ser comuns?, acredita.
Como pontos positivos conquistados por Curitiba, o prefeito destaca a preservação ambiental, o sistema viário e a volta da regularização fundiária, reconhecendo que são áreas em que ainda é necessário se investir mais.
A preocupação com o avanço da criminalidade em Curitiba também estará presente hoje, durante as comemorações do aniversário da cidade.
A Prefeitura programou a entrega de um pacote de obras de segurança pública, nas quais investiu R$ 6 milhões em 2008: o Núcleo de Proteção ao Cidadão, no Passeio Público; o Posto Avançado da Defesa Social e o Centro Integrado de Monitoramento Eletrônico de Curitiba, na Praça Osório, onde 22 câmeras serão instaladas. Segundo o prefeito Beto Richa, que acha que segurança é o principal desafio da cidade para os próximos anos, esse é um sistema que tem demonstrado eficiência. ?Embora seja de responsabilidade constitucional do governo do estado e do governo federal, temos que fazer a nossa parte. Hoje temos a maior guarda municipal do Brasil.?
Cultura
Consolidação do Festival de Curitiba, shows de bandas internacionais e reconhecimento de diretores fazem parte da efervescência cultural que surgiu na última década em Curitiba. Boa parte dessa mudança se deve à alteração do perfil econômico da cidade, na opinião do presidente da Fundação Cultural de Curitiba (FCC), Paulino Viapiana. A instalação de indústrias de tecnologia de ponta exigiu uma produção cultural própria mais intensa e que a cidade abrigasse bens culturais. ?Com a vinda da Renault, a diretoria quis saber quantas salas de cinema, teatros e espaços culturais existiam, porque queriam que seus executivos continuassem com o padrão cultural de seu país de origem.? A famosa constatação lembrada em lançamento de disco ou peça, de que ?se faz sucesso em Curitiba, faz sucesso em qualquer lugar?, ficou no passado. Para Viapiana, Curitiba não é mais um mercado teste, mas tem potencial para absorver produções culturais.
Amanhã
Luciana Cristo
Essa prioridade vem dos seguintes números: hoje, o sistema de transporte coletivo da capital transporta cerca de 2,2 milhões de passageiros em dias úteis. Somente nas linhas do eixo Norte/Sul, são mais de 400 mil passageiros. Essas linhas trabalham numa capacidade próxima ao limite, o que obriga a operar em intervalos inferiores a um minuto nos horários de pico.
Pensado como alternativa para ser implantado ao longo da canaleta norte-sul, o metrô ligaria o terminal de Santa Cândida ao terminal CIC Sul, tendo de 22 a 24 estações, com extensão de 22 quilômetros. A demanda inicial prevista pelo Ippuc é de 500 mil passageiros por cada dia útil. ?A área acima da linha do metrô, que hoje sofre com poluição e trânsito, será totalmente revitalizada, com ciclovia e áreas de lazer, proporcionando ganho de qualidade de vida?, planeja a engenheira do Ippuc Susana Andrade.
O projeto do metrô faz parte da continuidade técnica do planejamento de Curitiba que é destacada pela engenheira. ?São mais de 40 anos de um planejamento que é raro ver em uma cidade, com estudos baseados num sistema de informação seguro?, afirma.
Mas, quando se fala em planejamento urbano, a impressão que se tem é que o Ippuc, formado por um grupo técnico, fica distante dos anseios da população. Pensando em diminuir essa percepção, o planejamento de Curitiba em 2008 inaugura uma nova fase, segundo Susana, com a criação do Conselho da Cidade de Curitiba (Consetiba), que agrega representantes da administração, da comunidade, de universidades e associações. A intenção é abrir o diálogo com a sociedade, para avaliar e propor novas medidas. Trabalhando para isso, também foi desenvolvido um diagnóstico das nove regionais, chamado ?Regional Desejada?, que detecta dificuldades e potencialidades de cada uma, levando em conta a demanda da população.
Áreas irregulares
Uma outra meta para o futuro, bastante ousada, é a de tornar Curitiba a primeira cidade com ocupações irregulares totalmente reurbanizadas. Áreas novas estão sendo preparadas para receber quem hoje ocupa áreas de risco. Atualmente, moradores de áreas irregulares ao longo de rios correspondem a 2,8% da população curitibana. Em dois anos, espera-se melhorar a qualidade de vida de pelo menos 4 mil dessas famílias, que são quase um terço do total de pessoas que vivem em áreas de risco.
Clóvis Borges, diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental.
Helena de Paula Wagnitz, estudante da 4.ª série.
Tonio Luna, psicólogo.
Gilberto Piva, engenheiro civil.
Ana Pierina, professora.