A Comissão da Criança e do Adolescente da seção Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR) está reivindicando junto ao Tribunal de Justiça a criação de uma vara especializada para atender crimes contra a criança e o adolescente. O pedido é reforçado por uma pesquisa realizada por estudantes do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), que mostrou que os processos se perdem em meio aos demais, ao contrário do que prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que exige prioridade.
Atualmente, 67,41% deles ainda estão em fase de diligência e 2,24% foram arquivados porque os crimes foram prescritos. Esses números ganham uma amplitude maior hoje, pois é o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infantil, um dos principais crimes praticados contra este grupo.
A pesquisa foi feita no segundo semestre de 2005 nas 11 varas criminais de Curitiba. A coordenadora do estudo, a professora Jimena Aranda, disse que a primeira dificuldade dos estudantes foi encontrar os processos, porque eles não estavam destacados dos demais. O dado já revela que a celeridade exigida pelo ECA não está sendo cumprida, pois os documentos nem estavam identificados. Um caso citado por ela ilustra bem o problema. Demorou de 1992 a 2002 até que fosse dada a sentença a um pai que estuprou suas três filhas.
Durante a pesquisa foram encontrados 99 processos: desses, 67% ainda estavam em fase de diligência, ou seja, o Ministério Público mandou de volta para a delegacia porque faltam provas consistentes para fazer a denúncia. ?A situação é preocupante?, comenta a presidente da Comissão da Criança e Adolescente da OAB-PR, Márcia Veloso. Segundo ela, o dado mostra a falta de prioridade em relação aos crimes contra crianças e também que é difícil conseguir provas, porque a situação acontece no seio familiar. ?Algumas vezes o criminoso é quem sustenta a casa. Então a mãe acha melhor esquecer?, diz Márcia. Além disso, 2,24% dos processos foram arquivados porque prescreveram, 2,24% estavam em fase de defesa prévia e 25% em fase de sentença.
Além disso, foi verificado que em 85% dos casos as crianças não foram encaminhadas para atendimento médico ou psicológico. ?O crime não é só físico, existem os danos psicológicos?, comenta Márcia.
A pesquisa também mostrou o tipo de crime e o perfil das crianças e seus agressores. O crime mais comum é o atentado violento ao pudor com 61,11% dos casos, seguido dos estupros com 33,07%. As principais vítimas são meninas, quase 80%, e a maioria tem entre 6 e 10 anos. Já os homens representam 92% dos agressores e cerca de 90% tem mais de 25 anos de idade. O estudo revelou também que a maioria dos agressores, 69,6% estudaram apenas até o primeiro grau. No entanto, a coordenadora da pesquisa diz que isto não quer dizer que a falta de escolaridade é um dos principais fatores para a violência. Ela diz que os crimes praticados pela classe média e alta ficam mais escondidos. ?Além disto, um dos fatos que chamou a atenção é que os crimes mais cruéis foram cometidos por quem tinha curso superior?, comenta Jimena. Para Márcia, a criação de uma vara especializada é um passo importante para ajudar a diminuir a violência contra as crianças e adolescentes.
Conselho Tutelar divulga dados alarmantes na RMC
Nájia Furlan
Foto: Aliocha Maurício/O Estado |
![]() |
Passeata foi realizada ontem, no centro de Curitiba. |
O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infantil é hoje. Porém, ontem, pelas ruas do centro de Curitiba – da Boca Maldita até a Câmara Municipal – uma passeata organizada pelo Conselho Tutelar chamava a atenção para a gravidade do problema em toda a Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Os números divulgados pelos 40 conselheiros que participavam do ato eram alarmantes e mostravam a urgência em se discutir a questão. Segundo eles, em 2005, foram 2.733 notificações de violência contra a criança registradas na RMC. Dessas, 444, mais de 16%, se tratam de abuso e exploração infantil, notificadas somente em Curitiba.
?Como a Câmara só funciona até quarta-feira, resolvemos antecipar essa passeata para podermos entregar um documento aos vereadores, solicitando que uma comissão permanente trabalhe no combate à exploração sexual infantil. Em todo o Estado e também aqui na região de Curitiba, a exploração e o abuso sexual de menores existem e em números alarmantes?, afirma a conselheira tutelar da regional de Santa Felicidade, Maria Bernadete Strapasson.
Segundo ela, são muitos os pontos onde o crime contra a criança e o adolescente acontece. ?Por isso é que precisamos combater e para isso precisamos de ajuda de todos?, afirma. No Boqueirão e ainda no Bairro Novo, principalmente nas proximidades do Ceasa e à beira das rodovias, as regionais do Conselho Tutelar também atendem situações de exploração sexual infantil. A conselheira do Bairro Novo, Silvana de Morais, fala até em tráfico infantil de meninas para se prostituírem na região. Na regional do Pinheirinho igualmente há registros. ?No final da Rua João Bettega com a Juscelino Kubitscheck, em barzinhos, também é ponto de exploração sexual infantil. São meninas de 14, 15 anos, novinhas. Uma vez eu atendi uma menina de 12 anos que fugiu de casa para se prostituir. Como são crianças, na maioria dos casos não são elas que buscam, sempre tem alguém agenciando e iludindo que vale a pena?, conta a conselheira Terezinha Maia.
![]() |
Faixas e cartazes tomaram conta da Rua XV de Novembro. |
De acordo com o conselheiro Rechier Alex Sudário, recentemente, além de ruas, também boates, bares e muitos imóveis particulares ou alugados estão sendo abordados no combate à exploração sexual infantil. Segundo ele, os casos na Região Metropolitana de Curitiba certamente são mais numerosos, porque muitos não chegam a ser notificados. ?A dificuldade do combate ao abuso e exploração sexual infantil é que geralmente começa dentro de casa, na família, onde as pessoas sabem e não denunciam?, diz ele.
O conselheiro ainda comenta que são poucos os militantes que lutam pela causa e faltam diretrizes para melhorar as políticas públicas de combate. ?O que fazemos é um alerta em todos os sentidos. É preciso se conscientizar do problema e denunciar, ou pelo 181, do Estado, ou pelo 156, de Curitiba. Temos que mudar essa realidade?, alerta Rechier.
