Crimes ameaçam Área de Proteção Ambiental de Guaraqueçaba

Relatórios técnicos descrevem a Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraqueçaba como um dos mais importantes ?ambientes estuarinos? do mundo, ?com características únicas?. Os 313.400 hectares de mata atlântica, entre Guaraqueçaba, Antonina, Paranaguá e Campina Grande do Sul, possuem 312 espécies florestais, 254 espécies de aves, 118 espécies de mamíferos, 50 de répteis e 18 famílias da fauna aquática. Porém, a atuação de palmiteiros, caçadores, pescadores irresponsáveis e outros vilões está desfalcando esse rico patrimônio público paranaense.

De acordo com o Batalhão de Polícia Florestal, nos três últimos meses foram atendidas 32 ocorrências contra a fauna, 102 contra a flora, 19 de pesca predatória, oito registros de poluição, quatro de mineração e 184 outras ocorrências. Foram feitos 26 termos circunstanciados e 20 prisões em flagrante e aplicados R$ 170 mil em multas. Entre os materiais apreendidos em julho estão: duas armas, sete cartuchos, 30 metros de rede impróprias para pesca e três tarrafas, além de 516 vidros de palmito, 141 unidades de palmito, dois animais, sete gaiolas e 56 pássaros silvestres.

?Crime ambiental é muito amplo. São várias ocorrências que se enquadram: desde desmate em área de floresta atlântica ou mangue, pesca predatória, poluição. O litoral é um laboratório de ocorrências ambientais?, afirma Lício Domit, chefe do escritório regional do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de Paranaguá.

No entanto, são três os crimes mais freqüentes que ameaçam o litoral norte do Estado: a retirada agressiva e irregular do palmito jussara, a pesca predatória e a caça de animais silvestres. ?Temos muitas ações de palmiteiros e caçadores, principalmente no tráfico de aves. Freqüentes também são os destruimentos dos cercos que pescadores montam na baía e nunca temos como achar a pessoa. Isso é constante, não pára?, afirma o tenente Anor Vicente Júnior.

Ainda segundo o tenente, são várias as artimanhas utilizadas para esconder a prova do crime: os pescadores não aparecem, os palmitos são colocados em um segundo tanque de combustível estratégico ou nos pneus do carro. Alguns caçadores transportam até em ônibus de linha. ?Na última semana, encontramos um tatu no bagageiro de cima da poltrona do passageiro, em uma linha que faz o litoral?, conta.

A maioria desses criminosos é bastante abusada e chega a invadir, dentro da APA, até as reservas mantidas pela Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) (Morro da Mina, Serra do Itaqui – em Taqueçaba – e Cachoeira). ?Os palmitos são retirados da floresta em qualquer época do ano e a caça é mais no inverno e próximo às festas?, afirma a bióloga da SPVS Vívian Mra Uhlig.

Faltam pessoal e viaturas para fiscalizar região

Os educadores ambientais da SPVS reclamam que falta, na região, uma fiscalização mais efetiva dos órgãos competentes. ?A gente precisa de um efetivo maior da Polícia Florestal. Falta apoio das autoridades. O Ibama não está presente em fiscalização intensa, porque falta pessoal. Para algumas ações específicas, a gente até empresta veículos para as operações da Florestal?, revela Marcos Andrioli, da SPVS. ?Tanto o Ibama quanto o IAP (Instituto Ambiental do Paraná) e a Polícia Florestal têm competência para fiscalizar tudo. Mas aqui em Paranaguá, nós estamos com um problema. A carência é muito grande: no último concurso não veio ninguém para o Paraná. Temos quatro funcionários atuando?, aponta Lício Domit, chefe do escritório de Paranaguá.

Segundo o presidente do IAP, Rasca Rodrigues, a fiscalização do órgão é freqüente. ?No litoral temos instaladas seis bases operacionais e outras oito estão em construção. Atuam 179 fiscais da Polícia Florestal e 32 do IAP. O Estado tem a Força Verde, uma associação estratégica de atuação entre Polícia Florestal, Ibama e IAP. As abordagens (terrestres e em alto-mar) são constantes.?

Já a Polícia Florestal admite a dificuldade. ?Esse último mês reduziu a fiscalização devido a alguns problemas?, diz o tenente Anor. Entre os problemas apontados por ele e verificados pela equipe de O Estado, estão a falta de efetivo e veículos. Há apenas uma viatura para os três postos policiais da região. ?Há mais de 50 policiais, em Morretes, Cacatue Guaraqueçaba. O ideal seria que cada unidade tivesse uma viatura, mas três estão em conserto.? (NF)

Caçadores, palmiteiros e pescadores

Na reserva da Serra do Itaqui, o problema são os caçadores. ?A partir de meados de junho até setembro é o período de maior pressão de caça. É o período de entresafra, quando a população do entorno fica sem renda e apela para caça. É freqüente. Todo ano temos uma pressão grande de caça na reserva. Paca, cateto e tatu são caças mais comuns, mas o que eles acharem vão abatendo. O tráfico de animais vivos também é problema na região. Agora voltou com certa freqüência na Ilha Rasa?, relata o administrador da reserva, Marcos Andrioli.

Segundo ele, a maioria dos casos é de caça para o comércio. O caçador entrega para um intermediário e este leva para o mercado de Paranaguá. ?Isso é clandestino, mas tinha um comércio na região das praias que vendia a fregueses confiáveis?, conta Marcos, ressaltando que a pessoa que entra e se arrisca no mato é a que menos lucra: vende um tatu a R$ 30 e uma paca a R$ 50. Em um açougue autorizado a comercializar esse tipo de carne, os preços sobem bastante: o quilo da paca é vendido a R$ 99 e o cateto a R$ 56. Já um filhote de papagaio-de-cararoxa, o mais procurado, é vendido, em primeira instância, a R$ 50, mas como é vendido até para o exterior, quem quer ter esse ?luxo? chega a pagar mais de R$ 1 mil.

O palmito

Já a reserva do Cachoeira é um prato cheio para os palmiteiros. ?Quando as pessoas não têm emprego fixo, elas entram, principalmente em dia de chuva. Alguns pegam para comer, mas a maioria é para comercializar. Os moradores da região sabem quem são, mas é difícil eles denunciarem porque são, geralmente, conhecidos, se não parentes?, afirma Paulo Pereira, funcionário da SPVS e morador da região. O capataz da reserva, Antônio Gonçalves, confirma: ?Sempre acontece o corte do palmito. A gente chega perto, mas nunca conseguimos pegar. Eles correm e se escondem?.

Segundo a bióloga Vívian Uhlig, o problema é que o palmito ilegal, sem rótulo ou identificação, é vendido a restaurantes e outros estabelecimento comerciais, o que dificulta para o consumidor identificar a procedência e as condições do que come. ?Em várias fábricas de fundo de quintal, onde eles embalam o palmito, a higiene é zero. A gente já encontrou até cachorro dormindo na panela onde eles ferviam a água para colocar no vidro?, afirma o tenente da Polícia Florestal.

Búfalos

Outro problema que contribui para que a paisagem do litoral norte do Paraná seja alterada é a presença dos búfalos, que, em busca de espaço, acabam pisoteando e devastando ainda mais a floresta, além de cavarem crateras para se livrarem do carrapato e do calor. São animais exóticos, não acostumados ao clima local. (NF)

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