Foto: Arquivo/O Estado

 Lunardi Filho está proibido de dar declarações sobre o assunto.

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Caso fique provado no Inquérito Policial Militar (IPM) que houve tortura e agressões em um trote aplicado a sargentos recém-promovidos no 20.º Batalhão de Infantaria Blindado (BIB), em Curitiba, a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Iriny Lopes (PT-ES), vai pedir ao Comando do Exército e ao Ministério da Defesa a expulsão do comandante afastado, Ernani Lunardi Filho. Ela explica que recebeu denúncias de que outras pessoas que teriam sido torturadas na década de 90, dentro do Exército, sob o comando de Lunardi, em Vila Velha, no Espírito Santo.

Segundo a deputada, ontem pela manhã, foi procurada pelo pai de um rapaz que serviu o Exército no começo dos anos 90, no 38.º Batalhão de Infantaria, em Vila Velha. Na época, Ernani era instrutor-chefe do Núcleo de Preparação de Oficiais da Reserva. ?As agressões relatadas eram semelhantes às ocorridos no Paraná, incluía afogamento na lama, entre outras práticas?, declara.

Iriny disse que tentaria entrar com o pedido ainda ontem ou no máximo na segunda-feira. ?Não pode haver pena mais branda do que o desligamento. Faço o pedido com base na reincidência. Esse tipo de ocorrência é uma vergonha. Penso que pessoas que têm essas práticas devem ser desligadas para o bem do serviço público?, justifica.

A deputada também está solicitando à imprensa do Espírito Santo matérias divulgadas ontem e que tratam do assunto. O jornal A Tribuna, por exemplo, traz o relato de dois jovens que serviram no 38.º Batalhão de Infantaria sob o comando de Ernani. O motorista de 32 anos, que não quis se identificar, disse para a reportagem que: ?Faziam escovar os dentes com lama, ficar deitado na areia em cima de formiga braba. Isso acaba com as pessoas. Levavam a gente para tomar banho em lava a jato, que machucava, ficava vermelho. Mas nada comparado com o que vi na TV?.

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Já o supervisor de vendas, Marco Aurélio Silva, 32 anos, relatou fatos mais leves, mas que não deixam de ser agressões. Disse para o jornal que, ao contrário do que divulga o Exército, eram comuns as pressões e trotes nos cabos e soldados novos. No entanto, para ele, nada que se comparasse com tortura. ?Acontecia muito pacote, quando um grupo se junta para dar tapas em uma pessoa, mas você não ficava ferido. É comum ter que pagar flexões ou exercícios físicos a mais. Mas não tenho reclamações ou traumas.?

Ainda na reportagem, o comandante do 38.º Batalhão de Infantaria, José Otávio Gonçalves, aparece dizendo que desconhecia qualquer caso de tortura no período em que Ernani serviu naquele local, e até a última quinta-feira não havia qualquer denúncia sobre o assunto.

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A reportagem de O Estado entrou em contado com o Centro de Comunicação do Exército, em Brasília, mas a instituição não quis se pronunciar sobre o pedido. Apenas informou que as providencias para apurar as agressões já foram tomadas. Além disso, segundo o major oficial de comunicação social do Exército em Curitiba, Carlos Sydrião, o tenente-coronel Ernani está proibido de dar entrevistas.

Depoimentos

Um dos advogados dos sargentos envolvidos no trote violento em Curitiba, Antônio Figueiredo Bastos, disse ontem que já está com a fita original que registra as agressões. O material está sendo periciado e na próxima semana vai ser anexado ao inquérito. Segundo Bastos, a gravação comprova que não houve agressões. Teria sido a edição do material que deu a entender que houve tortura.

Ontem, apenas um dos doze sargentos foi ouvido, totalizando quatro até agora. O processo, que começou na quarta-feira, é lento porque o tenente-coronel Ilton Barbosa, que conduz as investigações, está tomando os depoimentos de forma minuciosa. Os depoimentos vão ser retomados na segunda-feira.

General nega que trotes sejam tradição no Exército

Rosângela Oliveira e AE

O comandante da 5.ª Região Militar, em Curitiba, general Túlio Cherem, rebateu ontem os comentários de que trotes sejam tradição dentro dos quartéis. ?Não concordo em hipótese alguma com essa afirmação?, ressaltou. ?O Exército brasileiro prima pelo respeito humano, pela formação do cidadão e a contribuição à sociedade.?

Ele garantiu, após receber a visita de representantes da seção Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), que as investigações sobre os atos mostrados na televisão serão feitas com a ?maior transparência possível?. Para isso, o Inquérito Policial Militar (IPM) está sendo acompanhada pelo Ministério Público. ?Desvios de conduta, desvios de comportamento serão apurados?, acentuou. ?Os responsáveis serão punidos, respondendo por seus atos.?

OAB

Um problema de educação, cidadania e falta de respeito ao próximo. Foi assim que presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR, Cleverson Marinho Teixeira, definiu as cenas do trote. Para ele, o episódio serviu como reflexão a respeito de desvios de conduta que vem acontecendo em diversos segmentos da sociedade.

De acordo com o presidente da OAB-PR, Manoel Antônio de Oliveira Franco, as informações que obtiveram do general não eram diferentes das que esperavam. ?Eles estão tratando o assunto com transparência. Já existe um inquérito militar em andamento e as vítimas estão sendo atendidas pelos seus advogados. A OAB, através da Comissão de Direitos Humanos, vai acompanhar informalmente as investigações?, afirmou Franco.

Para o presidente da OAB-PR, as imagens mostraram um absurdo, que ele não pensava que poderia acontecer dentro do Exército. Porém destacou que desvios de conduta podem existir em diversas áreas, mas que precisam ser coibidas.

Admitindo que foi oficial do Exército, Teixeira afirmou entender o procedimento adotado pelo comando para apurar o caso. Ele também destacou que o fato dos militares envolvidos serem muito jovens demonstra a necessidade de investir na educação básica de cidadania. ?Só teremos um País onde os diretos humanos e sociais vão ser respeitados quando investirmos na educação desses jovens?, falou.