Combate ao desperdício evita problemas com lixo

Em grandes e pequenas cidades brasileiras a destinação correta do lixo vem sendo considerada um dos principais problemas administrativos, sanitários, econômicos e ambientais. Cada pessoa produz, em média, um quilo de lixo por dia e já não há onde armazenar tantos resíduos.

Em Curitiba, por exemplo, o Aterro da Caximba, na área de mesmo nome, está com sua vida útil quase esgotada e em breve deve ser fechado. Municípios da Região Metropolitana, como Mandirituba e Fazenda Rio Grande, já foram cotados para receber o novo aterro, mas suas populações já se posicionaram contra a instalação do depósito.

A geração de lixo é inerente à atividade humana e não há como eliminá-la totalmente. Entretanto, especialistas acreditam que, com boa vontade e conscientização da população, é possível reduzir consideravelmente essa produção. Na opinião do engenheiro florestal e professor de engenharia ambiental da PUCPR Arnaldo Carlos Müller, tudo começa pelo mercado produtor de resíduos.

Atualmente, muitos fabricantes de produtos, principalmente no setor alimentício, produzem uma quantidade imensa e desnecessária de embalagens. Em alguns países da Europa, isso é condenado pela população consumidora, que muitas vezes leva o produto para casa deixando a embalagem nos carrinhos do supermercado. “Em muitos locais, as empresas deixam de desperdiçar embalagens e associam isso à imagem publicitária de empresa que se preocupa com o meio ambiente”, afirma. “Em alguns países do exterior, os supermercados não fornecem saquinhos plásticos, considerados bastante poluentes. Os próprios compradores levam suas sacolas. Infelizmente, no Brasil isso ainda não ocorre.”

Reciclagem

Apesar da grande produção de embalagens, dados presentes no livro Os Bilhões Perdidos no Lixo, de Sabetai Calderoni, revelam que apenas 135 cidades brasileiras realizam coleta seletiva.

“A coleta seletiva contribui para o aumento da vida útil dos aterros sanitários, evita o desperdício, gera lucros, preserva os recursos naturais e, conseqüentemente, aumenta a qualidade de vida das pessoas”, comenta Arnaldo. “É hora de começarmos a pensar seriamente sobre o assunto. Caso contrário, em breve “morreremos afogados” no nosso próprio lixo.”

Crianças perdem a infância nos lixões

Para a maioria dos governos estaduais e municipais, extinguir os lixões a céu aberto parece ser bastante difícil. Em diversas regiões do País, os lixões poluem o solo e a água, geram mau cheiro, dão um aspecto ruim à paisagem e, principalmente, incentivam um dos mais graves problemas brasileiros: o trabalho infantil.

Enquanto milhares de crianças vão à escola regularmente, passeiam e brincam com carrinhos e bonecas, outras tantas passam grande parte do dia em meio ao lixo. No Paraná, segundo dados do Unicef e do Fórum Nacional do Lixo, 190 municípios convivem com o trabalho infantil. Em grande parte desses, os lixões são os grandes responsáveis pelo afastamento das crianças da escola e das atividades normais da infância.

Em geral, meninos e meninas procuram materiais recicláveis, como papel, papelão, latinhas de alumínio, plásticos e vidros, para serem vendidos. Diariamente, elas arrecadam, em média, entre R$ 1,00 e R$ 6,00. O dinheiro, na grande maioria das vezes, é utilizado no sustento da própria família.

Em reunião recente realizada na capital paranaense com os integrantes do Fórum Nacional do Lixo e Cidadania, criado no ano de 2001, a procuradora do trabalho de Curitiba, Margaret Matos de Carvalho, diz que muitas crianças tiram o próprio alimento do lixo. “Para muitas, a única refeição do dia são restos de alimentos encontrados no lixo”, afirmou. “Expostas a materiais cortantes, insetos e outros animais que vivem nos resíduos, a maioria das crianças que trabalham em lixões estão doentes e, diariamente, arriscam a própria vida.”

Uma das soluções apontadas para resolver o problema das crianças que trabalham, em lixões ou outra qualquer atividade, é a bolsa-escola atrelada ao comparecimento das crianças em período integral à escola. Assim, os pais que tiram os filhos do trabalho e os mandam para a sala de aula recebem um determinado valor mensal. O objetivo é que o dinheiro substitua o arrecadado pelas crianças no trabalho.

Dos cerca de 3.500 municípios brasileiros que têm crianças em lixões, cerca de 12% estão na região Sul.

Anualmente, cerca de 5 milhões de pessoas morrem no mundo em conseqüência de doenças resultantes do lixo. Destas, cerca de 4 milhões são crianças.  (CV)

Cinco mil carrinheiros atuam nas ruas da capital

O que é lixo para a maioria das pessoas se transforma em fonte de renda nas mãos de muitos brasileiros. Milhares de pessoas sobrevivem exclusivamente da coleta de materiais recicláveis, os chamados carrinheiros ou catadores. São pelo menos 5 mil carrinheiros, a maioria acompanhada de familiares. Segundo o Movimento Pró-Federação dos Coletores de Materiais Recicláveis de Curitiba e Região Metropolitana, eles são responsáveis pela coleta diária de cerca de 360 toneladas de materiais recicláveis só na capital. O número é superior ao coletado pelos caminhões do Lixo que não é lixo, da Prefeitura Municipal.

O carrinheiro José Batista dos Santos, de 56 anos de idade, está há dezesseis anos na profissão. Ele vive sozinho e se sustenta com o que ganha juntando produtos recicláveis: cerca de R$ 200,00 mensais. “Se tivesse família eu não conseguiria sustentar. Além do que vendo, muitas das coisas que encontro jogadas no lixo utilizo em benefício próprio, como roupas e móveis velhos”, afirma.

José se orgulha da atividade, pois sabe que faz um trabalho importante para a cidade. Porém, se queixa dos motoristas que acreditam que ele atrapalha o trânsito com seu carrinho e de pessoas que o tratam de forma preconceituosa. “Algumas pessoas acham que os catadores são vagabundos. Não entendem que eles dependem da coleta de materiais recicláveis para sobreviver.”

Há apenas algumas semanas na função de carrinheiro, Severiano José da Silva, de 38 anos, já sente as dificuldades do trabalho. Acompanhado da esposa, Rosa Maria da Silva, de 24, ele anda mais de vinte quilômetros por dia e, devido ao peso do carrinho, sente dores constantes nas costas, nos braços e nas pernas. “Eu trabalhava como servente de pedreiro, mas a empresa para a qual eu prestava serviço não me pagava dinheiro. Então, resolvi pegar um carrinho”, conta.

Da coleta de recicláveis também depende o sustento da família de Marta de Oliveira, 40 anos, mãe de cinco filhos com idades entre dois e dezesseis anos. Há 8 meses na profissão, ela também arrecada cerca de R$ 200,00 ao mês. Para ela, o principal problema do trabalho são os ferimentos gerados na pele por latinhas de alumínio, cacos de vidro e outros materiais cortantes. “Não sei ler, nem escrever. Por isso, não tenho condições de conseguir um trabalho melhor”, diz. (CV)

Gestão do lixo no Paraná é modelo

Um dos grandes problemas dos municípios brasileiros é a destinação final do lixo. Números da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, realizada em 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, revelam que apenas 36% do lixo produzido no País é depositado corretamente em aterros sanitários. A maior parte dele tem como destino final os chamados lixões ou aterros controlados.

No Paraná, ainda de acordo com o IBGE, são produzidas 7,5 mil toneladas de lixo por dia, das quais apenas 2,7 mil vão para os aterros sanitários. Fora os lixões e aterros controlados, uma pequena parcela do lixo segue para estações de compostagem e de triagem ou é incinerada.

A cidade de Cianorte produz cerca de 800 toneladas de lixo por mês e está entre as poucas localidades brasileiras que atuam de forma correta na destinação dos seus resíduos sólidos. Há pouco mais de um ano, a Sanepar assumiu os serviços de coleta de lixo e operação do aterro sanitário da cidade e conseguiu reverter uma situação bastante crítica.

O prefeito do município, Flávio Vieira, que vem conversando há algum tempo com Stênio Jacob, diretor comercial da Sanepar, avalia a gestão do aterro sanitário como um exemplo para o Paraná. “Prefeitos de várias regiões do Brasil nos visitam para conhecer a tecnologia que aplicamos e o nosso modelo de gestão do aterro. Recomendamos o trabalho da Sanepar aos demais prefeitos porque a empresa detém conhecimento, tecnologia e pessoal preparado para dar resposta eficiente às exigências legais”, explica Stênio. Para o prefeito, o mais importante foi restituir a cidadania aos catadores.

O projeto implantado em Cianorte vai ser o paradigma para outros municípios do Paraná. “Tanto é que as prefeituras de Maringá, Londrina e Francisco Beltrão já manifestaram interesse”, afirma Stênio. Ele lembra que esse projeto está inserido na política de saneamento dos governos Requião e Lula.

A Sanepar desenvolve, também, a coleta dos resíduos de saúde e de materiais recicláveis. De acordo com o gerente de receita da Sanepar, Evaldo Carneiro Borges, a empresa deverá investir, num período de três anos, perto de um milhão de reais no sistema de lixo da cidade.

Coleta seletiva

A coleta seletiva é outra atividade implantada pela Sanepar em Cianorte. Esta modalidade de coleta traz vários benefícios, entre eles a melhoria da qualidade de vida dos catadores que viviam no antigo sistema.

Os catadores, que antes viviam no aterro, foram encaminhados à associação, onde é feita a separação do lixo reciclável. Eles passaram a ter uma renda mensal que gira em torno de trezentos reais. Antes, além de viver em um ambiente insalubre e desumano, não obtinham nem um salário mínimo. O ex-catador de papel Ademilson Deizepi, que hoje trabalha na central de triagem de lixo reciclável, diz que com a vinda da Sanepar sua vida mudou para melhor. “No lixão eu corria risco de pegar uma doença. Lá, eu tinha contato com seringas, restos de comida e insetos. Hoje, eu me sinto mais feliz trabalhando aqui na central, pois ganho mais e tenho mais saúde”, avalia.

Outro antigo “garimpeiro do lixo”, José Neves, também tem a mesma opinião de Deizepi. Para ele, trabalhar no barracão da associação é bem melhor do que trabalhar no aterro. “Para mim, aqui está ótimo. Sou mais valorizado, ganho mais. Está sendo bom para mim e para minha família”, comemora Neves.

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