No período de Carnaval, o trabalho
de carrinheiro rende menos.

Milhares de carrinheiros cruzam as ruas de Curitiba diariamente, catando lixo e ajudando de maneira direta na limpeza da cidade. Agora, na época de Carnaval, com a redução do movimento de carros e pessoas, o trabalho desses catadores diminui drasticamente, com pouco lixo para ser coletado. Mas, mesmo assim, eles não param, pois dependem do lixo para sobreviver. Por menor que seja a coleta, os carrinheiros estão dispostos a trabalhar para garantir o sustento diário da família.

De acordo com a Associação de Moradores da Vila Parolin, região que concentra grande parte dos carrinheiros de Curitiba, cerca de 60% do lixo coletado na cidade é trabalho feito pelos catadores. Apesar da presença dos caminhões de lixo da Prefeitura, Edson Rodrigues, presidente da associação, acredita que os carrinheiros são os maiores responsáveis pela limpeza. Como não são registrados, não existe um número correto de carrinheiros em toda a cidade. Mas segundo Edson, que mantém contato com outras associações, esse número pode estar perto de 12 mil. “Esses trabalhadores desenvolvem essa atividade há bastante tempo. Por causa deles, a cidade fica cada vez mais limpa. Qualquer tipo de lixo, em qualquer rua, é coletado por eles”, diz.

Sem opção

Edson ainda afirma que cerca de 80% dos habitantes da Vila Parolin são carrinheiros. “Eles não têm opção. Se não catam lixo, não fazem nada ou viram bandidos. São poucos aqueles que conseguem um emprego em melhores condições. “E, como apresenta certa facilidade, a criminalidade acaba comandando toda a região, tendo inclusive influência sobre os catadores de lixo mais novos”, diz.

Luciane Aparecida Alves, de 27 anos, trabalha há quatro anos como catadora de lixo. Ela participa da cooperativa da Vila Parolin. Afirma que não tem descanso durante o tempo que passa pelas ruas da cidade. “Por dia, fico cinco horas catando lixo. E, sempre que posso volto até a cooperativa deixar o que já foi coletado para voltar ao trabalho”, diz. Além da coleta, Luciane ajuda na reciclagem da cooperativa. “É bom participar de todo o processo. Mas, apesar de tudo isso, o que conseguimos para nos manter é pouco. Preciso de dinheiro não só para mim, mas para minha família”, explica.

É o mesmo caso de Francisco Alexandre, de 47 anos. Desempregado há sete anos, a coleta de lixo foi a alternativa encontrada por ele, para conseguir uma nova renda. “Ficar parado não dá. Precisamos do dinheiro e, por menor que ele seja, já é alguma coisa”, admite.

Filhos de catadores ganham creche

A Prefeitura de Curitiba, através da regional do Portão, realiza um trabalho constante com os moradores da Vila Parolin, uma das maiores de Curitiba. As vilas Lindóia, Fanny e Torres também estão começando a receber apoio no trabalho relacionado aos carrinheiros.

Entre outras ações estão a implantação de uma creche noturna, para abrigar as crianças dos carrinheiros que trabalham à noite; centros de educação infantil, para receber as crianças durante a parte da tarde; erradicação do trabalho infantil, para acabar com a presença de crianças nos carrinhos dos catadores; e atendimento emergencial à população de rua e vítima de violência, para os problemas que ocorrem diariamente nessas áreas devido à falta de segurança.

Os trabalhos procuram atender o máximo de pessoas possível, mas segundo o coordenador da regional do Portão, José Dirceu de Matos, grande parte acaba ficando sem atendimento. Toda uma estrutura foi montada para atender os moradores, em diversos aspectos: educação, saúde, abastecimento em conjunto com o FAS (Fundação de Ação Social), que há dez anos trabalha com o pessoal da vila.

Outros órgãos que trabalham junto com a administração da regional Portão são as secretarias municipais de Educação, Saúde e Abastecimento. Cada uma delas colaborando para o desenvolvimento das vilas. “Os trabalhos já são realizados há bastante tempo, mas não dependem somente de nossos esforços. As pessoas atendidas têm que estar dispostas a colaborar, senão não tem como se ver uma evolução. Queríamos atender a todos, mas encontramos certos obstáculos que dificultam as nossas ações”, explica José.

Esse discurso também é usado pelos representantes das secretarias. Silvana Silva Borri, da coordenação de assistência da Secretaria Municipal da Saúde, afirma que os agentes, médicos e enfermeiros que se deslocam até a vila passam por algumas dificuldades. “É complicado porque sempre queremos ajudar, mas nem todos estão dispostos a aceitar o trabalho. Antes era realmente pior, mas, ainda hoje, temos dificuldades. Alguns têm medo de ser atendidos. Outros, por ignorância, deixam de entender que aquilo é o melhor para eles”, diz. A prevenção e orientação contra a gravidez na adolescência, contra a aids, vacinação das crianças e cuidados com os idosos são algumas das campanhas realizadas nas vilas. (RCJ)

Grupo cria cooperativa e pede apoio

A Cooperativa dos Carrinheiros da Vila Parolin conta com a participação de doze catadores. É coordenada por Felipe Silveira. O trabalho vem sendo realizado há cinco anos e, mesmo assim, ainda apresenta algumas deficiências. De acordo com Felipe, falta incentivo de pessoas interessadas para que o negócio tenha um crescimento ordenado. Os carrinheiros passam o dia nas ruas recolhendo os materiais, encaminham até a cooperativa e participam do processo de reciclagem. Depois, o dinheiro das vendas é dividido entre todos e também é utilizado para a melhoria das máquinas de reciclagem.

Cerca de trinta pessoas seria o número ideal de trabalhadores para que a cooperativa caminhasse com desenvoltura, diz Felipe. “Estamos fazendo o que é possível. Temos muito produto bruto, mas pouco pessoal para trabalhar. Se conseguíssemos alguém que nos ajudasse com patrocínio para comprar alguns aparelhos que facilitem a reciclagem, tudo seria diferente”, explica. Segundo o coordenador, se cada um dos carrinheiros colaborasse com R$ 1, melhorias já poderiam ser realizadas, mas esse valor já faz diferença no bolso deles.

Felipe ainda afirma que existe muita polêmica envolvendo os carrinheiros. Como são poucos que procuram a cooperativa, a grande maioria acaba participando das “máfias do papel”, que reciclam os lixos na própria rua, não respeitando o processo correto, e até mesmo desperdiçando todo o material que é recolhido.

Edson Rodrigues, da Associação dos Moradores do Parolin, reforça a afirmação de Felipe. “Na verdade, a grande maioria acaba vendendo o lixo por um preço menor. E, pior, o material não é reciclado da maneira correta, porque eles não usam a técnica certa. Realmente é uma verdadeira máfia”, diz.

O aluguel do barracão utilizado como cooperativa é de R$ 900, o que torna o trabalho dos carrinheiros mais difícil. Felipe acredita que, se houvesse apoio do poder público, que incentivasse o processo de reciclagem de todo o material recolhido pelos catadores na cooperativa, tudo seria mais fácil. “Como é um trabalho que beneficia a todos, pois estamos cuidando do lixo da cidade, deveria haver uma maior participação do governo municipal e estadual. Os aterros sanitários já começaram a ficar aglomerados e, em pouco tempo, vai surgir outro problema. Precisamos muito de apoio e acredito que essa seja a melhor saída para o lixo de Curitiba”, completa Felipe.

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