Foto: Lucimar do Carmo/O Estado

 Segundo o IAP, no cemitério Santa Cândida existem cadáveres que estão enterrados em área de várzea.

continua após a publicidade

A informação é da engenheira agrônoma do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), Elma Nery de Lima Romanó, que alerta para o fato de muitos cemitérios de Curitiba estarem funcionando de maneira inadequada.

Segundo ela, dos 24 cemitérios existentes na cidade, a maioria – entre eles os municipais (São Francisco de Paula, Água Verde, Santa Cândida e Boqueirão) – está em situação irregular, não tendo licença ambiental. "Em muitos cemitérios faltam redes de drenagem pluvial e existem túmulos construídos em áreas inadequadas. Exemplo disso é o Cemitério Santa Cândida, onde existem cadáveres enterrados em área de várzea", comenta.

A engenheira afirma que as irregularidades acabam resultando na contaminação do solo e conseqüentemente dos lençóis freáticos, que são fonte de água para a população. Os principais agentes poluentes seriam substâncias desprendidas dos corpos em decomposição e dos caixões. "Os corpos liberam um líquido acinzentado denominado necrochorume. Ele é composto por 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substâncias orgânicas. Dessas, duas são tóxicas: a cadaverina e a putrescina", explica. "Quando não existe rede de drenagem, o necrochorume – que começa a ser liberado cerca de um mês após o sepultamento – acaba indo todo para o solo."

Junto com o líquido, estaria indo o verniz proveniente dos caixões e a maquiagem geralmente utilizada nos cadáveres (através de técnicas de tanatopraxia) com o objetivo de deixá-los menos pálidos no momento do velório. Tanto o verniz quanto a maquiagem podem conter metais pesados. A engenheira agrônoma acredita que, se uma pessoa morre de doença infecto-contagiosa, vírus e bactérias se misturam ao necrochorume e podem ser levadas ao lençol freático. "Também é um agente contaminante a radioatividade proveniente de cadáveres de pessoas que morreram de câncer e, em vida, foram submetidas ao tratamento com radioterapia", explica.

Adaptação

continua após a publicidade

Com o objetivo de combater as irregularidades, o IAP vem exigindo que, até o final do ano, os administradores de cemitérios comecem a se adaptar a uma resolução da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), para conseguir obter licenciamento ambiental. O documento, cujo texto está passando por algumas alterações, normatiza a instalação de poços de monitoramento da água subterrânea, exumações, distância entre corpos sepultados e o lençol freático, entre outros fatores.

Como forma de minimizar as contaminações e se adaptar às regras ambientais, Elma sugere que os cemitérios adotem técnicas de impermeabilização, como construção de estações de tratamento do necrochorume nas quais o líquido é drenado e passa por um processo de neutralização.

continua após a publicidade

Integrantes da secretaria fazem trabalhos de adaptação

Nos últimos meses, integrantes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Curitiba (Sema) vêm trabalhando para adaptar os cemitérios da capital, para obter o licenciamento ambiental.

Segundo o engenheiro civil e o geólogo da secretaria, respectivamente Giancarlo Lupatini e Luciano José de Lara, estão sendo realizadas pesquisas envolvendo monitoramento ambiental. Numa primeira fase, estão sendo recolhidas amostras periódicas de água dos poços de monitoramento instalados nos cemitérios.

"O objetivo é monitorar a qualidade da água do lençol freático. Para tornar o trabalho mais eficiente, tivemos que ampliar a quantidade de poços de acordo com o tamanho e o contexto hidrogeológico dos cemitérios, sendo que foram instalados poços complementares", explica Lupatini.

Durante o monitoramento, foram coletadas amostras abaixo do limite de potabilidade. Porém, o engenheiro e o geólogo acreditam que a água já estava com a qualidade degradada antes de atravessar as áreas dos cemitérios. Para confirmar a suspeita, em uma segunda fase, a água coletada nos poços será comparada com água retirada do entorno dos cemitérios. "Vamos cruzar as informações, saber se existem riscos e quais são eles", revela Lara.

Os profissionais também afirmam que já foram estabelecidos critérios construtivos para a instalação de túmulos, e que o coeficiente de permeabilidade verificado nos cemitérios municipais está dentro dos padrões exigidos pela Sema. Em paralelo às pesquisas, a secretaria vem desenvolvendo trabalhos de orientação aos administradores de cemitérios particulares, também com a intenção de que eles consigam o licenciamento ambiental.

Santa Cândida

Em relação ao Cemitério Santa Cândida – onde foi apontada a presença de cadáveres enterrados em área de várzea – Giancarlo e Luciano esclarecem que também é realizado monitoramento no local e que, até agora, não foram encontrados problemas. De acordo com eles, corpos deixaram de ser enterrados na área há cerca de seis anos. "No local eram sepultados corpos de indigentes e pessoas carentes, mas isso já não acontece mais." (CV)

Em Ponta Grossa, São Sebastião foi embargado

Em 28 de julho deste ano, a ausência de licenciamento ambiental e de sistemas de tratamento para efluentes resultou no embargo do Cemitério Municipal São Sebastião, em Ponta Grossa, na região dos Campos Gerais. Por cerca de duas semanas, o IAP proibiu que fossem realizados novos sepultamentos no local.

"Na época, fizemos uma análise da água de poços artesianos localizados no entorno do cemitério e descobrimos que estava tudo contaminado. Foi encontrada grande quantidade de coliformes. A situação estava muito preocupante", lembra Elma Romanó. "A água abastecia cerca de dez residências. Não podíamos permitir que a situação continuasse daquele jeito."

Em vistoria, técnicos do IAP também encontraram túmulos abertos, com cadáveres e ossos expostos. Hoje, segundo a engenheira agrônoma, grande parte dos problemas foram resolvidos. Foi construída uma rede de drenagem, foram dadas soluções a problemas ligados à erosão e os proprietários de túmulos encontrados abertos foram notificados a corrigir o problema. As obras permitiram que os sepultamentos voltassem a ser realizados. "No próximo mês, também devemos iniciar no São Sebastião a construção de poços de monitoramento da água subterrânea", informa o diretor de Meio Ambiente da Prefeitura de Ponta Grossa, Paulo Eduardo Barros. A estimativa é de que a instalação dos poços custe entre R$ 5 e R$ 6 mil. (CV)