Boa leitura ainda é hábito de poucos

Os computadores da Biblioteca Pública do Paraná registram um total de 242.631 cadastrados desde 1994, ano em que todo sistema foi informatizado, até hoje, 7 de janeiro, data em que se comemora o Dia do Leitor. Ilusório pensar que essa é a real demanda da instituição. “Nesse número temos gente que não renovou a carteirinha, que nunca mais apareceu, que pegou um livro para a escola e não se interessou em voltar”, explica Sizuko Takemya, chefe da Divisão de Obras Gerais da Biblioteca.

Um dado que pode mensurar de alguma forma o gosto pela leitura dos 1,5 milhão de habitantes de Curitiba é a média diária de empréstimos feito pela entidade. Segundo Sizuko, são emprestados 2 mil obras por dia. Boa parte desses empréstimos, no entanto, é feito por uma clientela tradicional e fiel, que, quase religiosamente, leva dois ou três livros para casa; quando não passa a tarde lendo na biblioteca. É o caso do auxiliar de escritório Andrei Nezik, de 28 anos. Há cerca de um ano e meio ele passa na biblioteca pelo menos duas vezes por semana. Espírita, Andrei dedica-se a leitura de livros que tratem de religiosidade e espiritualidade durante pelo menos uma hora. “Trabalho a tarde, mas sempre encontro um meio de passar aqui”, sussurra ele para não incomodar os colegas.

Misticismo e auto-ajuda

E é na literatura de temas exotéricos e religiosos que, de alguma forma, os jovens estão “aprendendo” a ler. “Religião e misticismo constituem o atual roteiro de leitura dos jovens”, sentencia Élio Antunes, professor de Literatura há mais de 15 anos, que atualmente leciona em um dos principais pré-vestibulares da cidade. Para Élio, no entanto, os adolescentes de hoje lêem mais do que os de dez anos atrás. “Esses temas místicos têm atraído muito a juventude porque de certa forma compensam a lacuna deixada pela obras indicadas pela escola, que na maioria das vezes são considerada chatas”, afirma. Mas, para o professor, é indispensável que a escola e mesmo a família tente incentivar os jovens a buscar os grandes autores. “Um caminho talvez seja apresentar escritores como Rubem Fonseca, Carlos Heitor Cony e Valêncio Xavier, que geralmente trabalham com temas mais urbanos e atuais. Dessa leitura, talvez, eles possam chegar aos clássicos.”

Para Aramis Chain, que há quarenta anos trabalha como livreiro, o grande responsável pelo desenvolvimento do hábito da leitura é a família. “Vejo isso aqui. O avô que lia e trouxe o pai, que trouxe o filho e todos lêem e discutem o que lêem”, conta.

Para ele, mesmo a faculdade não tem cumprido seu papel de formar leitores e cidadãos. “A maioria lê só o que vai ser pedido na prova”, diz.

A Livraria do Chain é ponto de encontro de acadêmicos, intelectuais ou simplesmente de leitores vorazes. Reza a lenda que o vampiro Dalton Trevisan aparece lá quase diariamente. Com clientela tão especial, Chain dispara: “Auto-ajuda aqui é motivo de ojeriza. Aqui encontramos uns poucos, que gostam de literatura de verdade.”

Leitura como fonte de prazer

Aos 75 anos, Margarita Kappout, freqüenta a BPP desde sua fundação. Ela é o exemplo perfeito que ler nada mais é que um imenso prazer. Por volta de seus 9 anos, Margarita passou a emprestar livros da vizinha. “Li A Moreninha, Senhora, esses clássicos da Literatura Brasileira”, conta. Não demorou muito e a menina estava lendo ícones como Dostoiévski e Victor Hugo. A aposentada atualmente tem especial atração por temas policiais e amorosos. Ela, que interrompeu os estudos no ensino médio, diz que passou a hábito para a filha, sua principal companheira. “Sempre indicamos bons autores uma para a outra.”

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