Curitiba tem duas feras “sem-teto”. Quem quiser levar, de graça, duas leoas adultas para casa, pode se candidatar. É preciso ter espaço suficiente para construir duas jaulas grandes e fôlego financeiro para alimentar as “meninas” – que consomem, cada uma, cinco quilos de carne por dia. Além, é claro, de gostar de ter no quintal duas belas felinas.
Leandra e Leonarda são duas leoas irmãs que moram no jardim de uma ampla residência no Boa Vista. O dono delas é um advogado que se mudou há alguns meses para um condomínio fechado na Região Metropolitana. Infelizmente, embora ele oferecesse toda segurança, os demais moradores não aceitaram a companhia das duas feras no condomínio.
Desde então, Leandra e Leonarda vêm sendo cuidadas por um caseiro e sua família. O dono das leoas vem tentando, sem sucesso, doá-las para algum zoológico ou circo. Mas, por incrível que pareça, em todo o Brasil ninguém quis aceitar o presente.
Registradas
As leoas são saudáveis, têm cerca de onze anos e estão com a documentação em ordem – são registradas no Ibama. De acordo com o advogado – que prefere não se expor, cansado de muita polêmica em torno dos bichos – o próprio Ibama vem tentando achar um local que possa acolher as felinas. “Temos pesquisado em todo o País. Uma bióloga do Ibama tem me ajudado com isso. Mas ninguém as aceita”, lamenta o proprietário.
O advogado entrou em contato também com a administração do Beto Carrero World, que mantém um mini-zôo dentro do parque, no litoral de Santa Catarina. Mas o parque já possui um leão e três leoas e também não aceitou receber Leandra e Leonarda. Além disso, seguindo as tendências mundiais dos profissionais circenses, que cada vez menos utilizam animais, o circo Beto Carrero não tem levado bichos em suas viagens pelo País.
Preocupação maior com cães
Policiais da Delegacia do Meio Ambiente já receberam diversas denúncias sobre as duas leoas criadas em uma casa no Boa Vista. “Não há nada a fazer nesse caso. Elas estão bem-cuidadas, são saudáveis, as jaulas estão dentro do padrão e, além disso, são registradas no Ibama”, explica o investigador José César de Bittencourt. Muito mais preocupante que a situação das felinas, afirma Bittencourt, é a dos cachorros alugados para fazer segurança em terrenos. As queixas e denúncias sobre maus-tratos e abandono desses cães são inúmeras e recorrentes.
Os policiais já constataram diversas irregularidades. Há casos em que os cães passam o dia confinados em locais exíguos, sem nenhuma ventilação; outros, passam até três dias sem receber água nem alimento. Vizinhos, compadecidos com a gravidade da situação, é que muitas vezes “adotam” os animais e passam a alimentá-los e tratar deles.
Dossiê
A delegacia tem um dossiê com todos os casos registrados e a listagem das empresas que alugam cães para segurança. Atualmente, cerca de vinte empresas prestam esse tipo de serviço em Curitiba e Região Metropolitana. Ocorre, porém, que muitas delas pertencem ao mesmo proprietário. Funcionários ou parentes abrem outras firmas, com nomes diferentes, mas no fundo o negócio é o mesmo.
Somente uma dessas empresas já foi autuada onze vezes. Outra recebeu oito autuações. Mas, pela lei, os proprietários ou responsáveis não ficam detidos, explica o superintendente Peter Otávio Costa. Eles assinam o Termo Circunstanciado na delegacia e depois precisam comparecer à audiência marcada com um juiz. Nessa ocasião, muitas vezes apenas apresentam notas fiscais de compra de ração e de serviços veterinários, mostrando que os cães estão sendo cuidados, e não recebem multa.
Sem fiscalização
De acordo com Peter e Bittencourt, a única forma de reverter essa situação é fazer com que haja fiscalização constante sobre essas empresas. “Os proprietários apenas tiram alvará na Prefeitura para abrir a firma e pronto. Depois, não há nenhum acompanhamento especializado”, observa Bittencourt. Ele defende fiscalização rígida, inclusive com apresentação de registro adequado do plantel de animais, condições de tratamento e acompanhamento veterinário constante. (BM)
Animais dóceis e sossegados
Leandra e Leonarda chamam a atenção de quem passa pela rua da casa onde moram. Da calçada, pelas grades do jardim, é possível observar as felinas, tranqüilas, se espreguiçando em suas jaulas. Geraldo, o caseiro encarregado de tomar conta da residência e das leoas, diz que não se assusta com a presença delas. “Jogo a comida pelas grades. Uma vez por dia, pego a mangueira e lavo tudo lá dentro. Mas não chego muito perto não”, conta.
O dono das leoas conta que adquiriu os bichos por acaso. Ele viu anúncio em jornal oferecendo dois filhotes de leão para vender. Foi com a esposa até o local – uma casa simples, no Campo Comprido – e, mesmo sem saber a origem dos bichos, ficou com as leoazinhas, que na época ainda eram filhotes.
Leandra e Leonarda foram criadas pela família e, segundo o advogado, são dóceis com as pessoas de casa. Entenda-se por “dóceis” que ninguém nunca experimentou entrar na jaula para constatar se elas mordem ou não. “Elas ficam agitadas quando vêem gente estranha. Devem sentir o cheiro diferente”, comenta.
Compromisso com ecologia
A Delegacia do Meio Ambiente passou por reformulação há pouco tempo. Ganhou emblema diferenciado, para marcar seu compromisso com a ecologia, e vem realizando ações educativas além das blitze ambientais. A Operação Verão Ambiental, deflagrada em 20 de dezembro, já deu bons resultados. A fiscalização em todo o litoral do Paraná – de Adrianópolis até Coroados, abrangendo a região da Mata Atlântica – resultou na apreensão de quase duzentas aves silvestres mantidas em cativeiro.
Além disso, foram apreendidos balões, equipamentos de envasamento de palmito clandestino, uma moto-serra e diversos outros equipamentos e artefatos irregulares. Cinco pessoas foram detidas por corte e extração ilegal de palmito.
As aves apreendidas são encaminhadas para o Centro de Triagem de Animais Silvestres da PUC-PR, em Tijucas do Sul. A universidade mantém parceria com a Delegacia do Meio Ambiente para recolher, tratar e reintegrar as aves ao seu habitat natural. A Operação Verão Ambiental segue até o final de março.